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É mestre em Ciência Política pela UFMG

Reforma eleitoral 2021: pior do que está fica!

Representatividade e renovação política devem vir de mudanças racionais, não de bizarrices nascidas da inocência, casuísmo ou má-fé de seus propositores

  • Deivison Souza Cruz É mestre em Ciência Política pela UFMG
Publicado em 24/08/2021 às 02h00
Câmara aprova texto-base da reforma eleitoral; votação continua nesta quinta-feira
Câmara aprova texto-base da reforma eleitoral. Crédito: Cleia Viana/Câmara dos Deputados

A sociedade brasileira clama por maior representatividade e renovação política, necessárias para fortalecer nossa jovem democracia diante da desigualdade econômica e demanda crescente de serviços públicos, entre outros desafios. Porém, isso seria mais fácil se as "propostas” de reforma eleitoral adviessem de evidências científicas em vez de bizarrices nascidas da inocência, casuísmo ou má-fé de seus propositores.

Eis algumas:

i) Voto impresso (reprovado): nos EUA, a iminente derrota de Trump o fez opor-se ao voto via correios (o que é legal por lá). Aqui os "doutores em cloroquina" viraram "especialistas" em segurança de urna eletrônica. Traduzindo, percebendo provável derrota, trapaceiam reivindicando mudanças das regras do jogo. Assim, agitam criminosos e ingênuos para avacalhar as eleições 2022, arrastando o Brasil ao caos após meses de contagem manual de votos;

ii) Fundo Eleitoral de R$ 5.7 bi (votação dos vetos pelo Congresso): foi de R$ 1.7 bi em 2018 e decorreu da Lei 13.487/ 2017, que corretamente proibiu empresas de financiarem campanhas. Todavia, o aumento atual é improcedente, e alguns líderes partidários buscam "carta branca" para gastar enfraquecendo a justiça eleitoral;

iii) Distritão (reprovado): a maioria dos partidos são "sacos de gatos" formados por camarilhas de gerontes, "caciques" e suas famílias, rarefeitos de renovação de quadros e de projetos, funcionam como escritórios de lobby em defesa de interesses privados. Ao invés de democratizar os partidos, o distritão transforma essas geringonças oligárquicas (ver Robert Michels) em algo pior, propriedade neo-feudal dos eleitos;

iv) Coligações e flexibilização da cláusula de desempenho (tramitando): coligações distorcem a representação permitindo que o voto seja direcionado a partidos distintos. Interessa aos partidos pequenos afetados pela EC 97/ 2017, facilitando o acesso ao Fundo Partidário, Fundo Eleitoral e tempo de TV;

v) Voto preferencial (reprovado): exclui-se o 2º turno como agregador de preferências. Em turno único o eleitor escolhe até 5 candidatos. Na apuração, caso nenhum obtenha 50%+1 dos votos, descartar-se o menos votado até emergir um eleito. Entretanto, se as escolhas são inconsistentes, formam-se maiorias artificiais, aumentando o risco de contestação de resultados;

vi) Semipresidencialismo: confunde o eleitor, que perde poder elegendo um presidente que comanda apenas a diplomacia e defesa. O governo de fato é dirigido por um primeiro-ministro escolhido pela maioria do Congresso. Se este perder a maioria, chamam-se novas eleições parlamentares para definir o novo primeiro-ministro. No Brasil, com mais de 30 partidos e maiorias instáveis, esse modelo criará mais crises do que é capaz de evitá-las. Caberia debate nacional e plebiscito tal como o de 1993.

De sorte que o bom senso de parte dos deputados derrubou alguns destes projetos. Outros, ainda tramitando (ou a abrir tramitação), reforçam a certeza do inverso do slogan do Tiririca em 2014: "Pior do que está fica".

Este texto não traduz, necessariamente, a opinião de A Gazeta.

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