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É mestre em Direito Tributário e advogado sócio do Brum Kuster Marques & Fragoso Advogados

O que devemos esperar da reforma tributária que será votada no Senado?

Apesar de não podermos generalizar os anseios da população brasileira em relação à reforma, é possível concordar com a existência de consenso em relação a três objetivos

  • Leonardo Nunes Marques É mestre em Direito Tributário e advogado sócio do Brum Kuster Marques & Fragoso Advogados
Publicado em 04/11/2023 às 10h00

A previsão é a de que o Senado Federal inicie a votação da proposta de reforma tributária no dia 9 de novembro. Apesar de não podermos generalizar os anseios da população brasileira em relação à reforma, haja vista a diversidade das pretensões dos mais variados grupos da sociedade, é possível concordar com a existência de consenso em relação a três objetivos, quais sejam, a diminuição da complexidade do sistema tributário, a redução da carga fiscal e o decréscimo da litigiosidade.

Partindo dessa premissa e da análise do texto da proposta de emenda constitucional aprovada na Câmara dos Deputados e encaminhada ao Senado Federal – a PEC 45 –, é possível chegar a algumas conclusões.

Em relação ao primeiro ponto, merece destaque a previsão de unificação do PIS e da COFINS na chamada CBS e do ICMS e do ISS no chamado IBS. Trata-se de medida que repercutirá na redução do número de normas para interpretar, de tributos para apurar e de obrigações acessórias para cumprir.

E o IBS terá legislação única aplicável em todo o território nacional, o que significará um decréscimo relevante no número de normas sobre o tema. Serão eliminados 27 microssistemas legislativos estaduais e mais de 5.500 microssistemas legislativos municipais.

A diminuição dos regimes especiais e dos benefícios fiscais também promoverá uma simplificação do Sistema Tributário. E a determinação de que o IBS e a CBS não componham as suas próprias bases de cálculo permitirá o conhecimento da carga tributária efetivamente incidente sobre as operações.

Por outro lado, o cenário de redução da complexidade apenas será atingido em 2033. Antes disso, no curso do período de transição, haverá um significativo aumento da dificuldade na interpretação e na aplicação das normas, uma vez que o novo e o antigo regime conviverão.

O modelo em votação também provocará uma elevação da burocracia para as empresas do lucro presumido, que passarão a se submeter à obrigação de apurar créditos em sua atividade. Num balanço entre pontos positivos e negativos, em relação ao aspecto da complexidade, contudo, o saldo será positivo em favor do contribuinte.

No concernente à variação da carga fiscal, no entanto, o panorama, muito provavelmente, será outro.

Apesar de a certeza quanto ao peso do encargo tributário depender de regulamentação ou da previsão de limites na proposta de emenda constitucional, o cenário deficitário das contas da maioria dos entes da Federação e a necessidade de aumento da arrecadação para fazer frente ao Novo Arcabouço Fiscal dão indícios de que não teremos uma redução nos níveis de cobrança de tributos.

Aliado a isso está a ampliação da base de incidência da CBS, que passará a atingir as pessoas físicas, e do IBS, que passará a abarcar toda e qualquer operação com bens e não apenas as transações habituais, com o intuito mercantil e com bens móveis. Aliás, só é possível falar em diminuição de carga tributária posteriormente a uma reforma administrativa que reduza despesas públicas. E não é esse o cenário atual.

Nos bastidores, fala-se na adoção de uma alíquota total de 25%. Partindo desse dado objetivo e considerando que o IBS e a CBS não incidirão sobre suas próprias bases, chega-se à conclusão de que o setor de serviços sofrerá uma importante oneração, em especial os prestadores que estão no regime do lucro presumido.

No comércio, as vendas interestaduais realizadas pelos optantes pelo lucro presumido serão as mais impactadas negativamente e as vendas internas promovidas pelos optantes pelo lucro real serão as mais desoneradas.

O setor da indústria, por sua vez, será o mais favorecido em razão da extinção do IPI e da promessa de implantação de uma não-cumulatividade plena. As constatações se assemelhariam às aplicáveis ao setor do comércio, porém o impacto positivo poderá ser potencializado pelos dois fatores mencionados.

Em resumo, a atual conjuntura das finanças públicas, assim como as projeções a partir da utilização de uma alíquota total de 25%, levam a crer que a maioria dos contribuintes experimentará um aumento da carga tributária. Quanto à litigiosidade, ou seja, ao número de processos administrativos e judiciais envolvendo discussões tributárias, acredita-se que a redução da complexidade do sistema permitirá uma diminuição dos conflitos.

Os órgãos responsáveis por editar as leis e por promover a interpretação das normas tributárias, todavia, terão um papel fundamental no alcance do objetivo de redução das demandas. Isso porque as leis inválidas e as interpretações equivocadas sempre geram disputas. Será preciso um controle da ânsia arrecadatória no momento de construção da nova ordem tributária.

Por outro lado, se os órgãos de julgamento administrativo e judicial dessem vazão ágil às demandas, inexistiria tanto litígio em curso. O aprimoramento dessas instituições, contudo, não está entre os objetivos da reforma tributária.

O último aspecto a ser abordado, e talvez o mais importante sobre o tema, é o de que a PEC 45 introduzirá novos tributos em nosso ordenamento. Toda novidade gera dúvidas, questionamentos e discussões. E o abandono de décadas de jurisprudência tributária é extremamente temerário. Parece, então, que a redução da litigiosidade dificilmente será alcançada.

O leitor pode, agora, a partir da importância que dá a cada um dos objetivos almejados com a reforma tributária, avaliar os pontos positivos e negativos destacados e formar a sua opinião sobre a alteração legislativa que se avizinha.

Este texto não traduz, necessariamente, a opinião de A Gazeta.

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