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É mestre e doutoranda em Ciências Jurídicas

Em países que buscam saídas para diferença de gênero, a violência tende a cair

Somente em 1997 foi revogado o artigo 35 do Código de Processo Penal que previa que “mulheres casadas não podiam prestar queixa criminal sem o consentimento do marido”

  • Lúcia Maria Roriz Veríssimo Portela É mestre e doutoranda em Ciências Jurídicas
Publicado em 18/05/2022 às 02h00

A violência contra mulheres é uma das principais formas de violação dos seus direitos fundamentais, atingindo-as em seus direitos à vida, à saúde e à integridade física. Lamentavelmente, um ilícito que assola o Brasil. Vale salientar que, em países que buscam soluções igualitárias para as diferenças de gênero, a violência tende a cair.

No Brasil, compilações de normas editadas pela Coroa Portuguesa, de 1603 a 1830, sob o pretexto do adultério, permitia-se que o marido matasse ambos. O Código Criminal de 1830 atenuava o homicídio praticado pelo marido quando houvesse adultério. O Código Civil (1916) alterou essas disposições considerando o adultério de ambos os cônjuges razão para o “desquite”. No campo legal, as mulheres foram ganhando força, mas a situação é insuficiente. Ainda se matava e se mata a mulher por qualquer motivo ignóbil.

Lei Maria da Penha (Lei nº 11.340/2006) é um importante legado, considerado um divisor de águas na abordagem jurídica brasileira. O processo de criação da Lei Maria da Penha foi marcado por movimentos sociais de luta das mulheres. Até a década de 80, não havia instrumentos jurídicos de proteção a elas. Destaque-se na década de 70 o movimento “quem ama não mata”, quando se iniciaram as alterações legais.

Em 1985, o Estado criou a primeira delegacia especializada no atendimento às mulheres. Em 1990, os movimentos de mulheres voltaram a se intensificar exigindo medidas mais contundentes. São desse período, a Lei 8.930/1994 que considerou o estupro e o atentado violento ao pudor como crimes hediondos; e a Lei 9.318/1996 que agravou a pena de crimes cometidos contra mulheres grávidas, crianças, idosos ou enfermos.

Somente em 1997 foi revogado o artigo 35 do Código de Processo Penal que previa que “mulheres casadas não podiam prestar queixa criminal sem o consentimento do marido”. Pasmem, mesmo vigendo a Constituição de 1988 que iguala a todos sem distinções de qualquer natureza.

No dia 9 de março de 2015, a Lei do Feminicídio foi promulgada no Brasil. Os homicídios de mulheres envolvendo violência doméstica e questões de gênero passaram a ser qualificados como crimes hediondos, com penas de até 30 anos.

As introduções e avanços legislativos têm contribuído, mas a realidade ainda é entristecedora e inaceitável. Segundo dados do Ministério da Saúde (Folha de São Paulo, 2019) registra-se um caso de agressão contra as mulheres a cada quatro minutos no país. No Atlas da Violência de 2020, entre 2008 e 2018, enquanto a taxa de homicídios de mulheres não negras caiu 11,7%, a taxa entre as mulheres negras aumentou 12,4%.

A persistente cultura de subordinação da mulher ao homem; as leis penais que propiciam ao agressor responder o processo judicial em liberdade; a falta de eficácia dos boletins unificados e o afrouxamento das políticas públicas resultam na continuidade da violência contra as mulheres.

A melhoria do quadro só será possível através de políticas públicas transversais que modifiquem a discriminação e a incompreensão de que os direitos das mulheres são direitos humanos. Modificar a cultura da subordinação de gênero requer uma ação conjugada, articulando os programas dos Ministérios da Justiça, da Educação, da Saúde e do Planejamento em harmonia com políticas estaduais e municipais.

Este texto não traduz, necessariamente, a opinião de A Gazeta.

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