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Coronavírus: Congresso pode ter votação remota, mas é preciso controle

Plataformas digitais não podem contribuir para que deputados e senadores se isolem convenientemente em seus ambientes virtuais, aumentando mais ainda a crise política

  • Lucas Baruzzi
Publicado em 20/03/2020 às 11h00
Atualizado em 20/03/2020 às 11h00
Congresso Nacional, em Brasília. Crédito: Arquivo/Agência Brasil
Congresso Nacional, em Brasília. Crédito: Arquivo/Agência Brasil

Congresso Nacional desenvolveu plataformas digitais para que os parlamentares votem projetos de lei, acessando por meio de computadores e smartphones. A solução tecnológica é indispensável neste período de coronavírus, em que o convívio social deve ser drasticamente limitado, permitindo que deputados e senadores possam responder às diversas crises em curso (econômica, social, de saúde) por meio do aprimoramento de leis e políticas públicas.

Neste momento em que os poderes Executivo, Legislativo e Judiciário são absolutamente fundamentais para superarmos as crises em curso, a saúde de nossos representantes eleitos e lideranças também deve ser resguardada. Para tanto, a adoção de tecnologia como esta desenvolvida é essencial.

Assim como tem acontecido com diversos setores, a pandemia do Covid-19 trará ao nosso parlamento uma nova rotina de atuação e um hábito de fazer suas tarefas de forma mais flexível e autônoma. Além dos 513 deputados e dos 81 senadores, a rotina da Câmara e do Senado contempla a atuação diária de milhares de assessores parlamentares e servidores públicos de carreira, responsáveis pelo funcionamento de comissões, secretarias, consultorias legislativas e dos diversos meios de comunicação do Parlamento.

Não menos importante, um número grande de cidadãos visitam ambas as Casas para participar do processo legislativo. Portanto, é indispensável garantir a saúde de nossos parlamentares e servidores.

Contudo, preocupa-nos o enfraquecimento dos mecanismos de controle e acompanhamento por parte dos cidadãos e a prestação de contas do trabalho legislativo à sociedade. Além dos partidos políticos, nosso regime político é baseado na participação democrática, sendo os cidadãos atores que participam das decisões políticas não apenas por meio do voto direto, mas como indivíduos ou grupos (associações, conselhos profissionais, sindicatos etc.) que atuam no processo legislativo por meio de audiências públicas, acompanhamento de sessões, reuniões com assessorias, entrega de ofícios e relatórios técnicos.

A título de exemplo do risco em curso e dos impactos já causados à participação democrática, basta ver que os atos administrativos publicados pela Câmara e Senado proíbem a entrada de cidadãos e não mencionam o direito de peticionamento, estando os cidadãos proibidos de entrar no Parlamento para protocolar seu posicionamento e se manifestar legitimamente sobre os diversos projetos de lei em discussão. Tais atos devem ser corridos imediatamente, criando um guichê de protocolo acessível externamente e um protocolo virtual para envio de documentos.

As plataformas digitais da Câmara e do Senado não podem contribuir para que deputados e senadores se isolem convenientemente em seus ambientes virtuais, aumentando mais ainda a crise política que, em boa parte, é reflexo do distanciamento entre eleitos e eleitores. Há muitos aspectos que não podem ser adiados para um momento posterior.

Especificamente com relação ao processo legislativo, como indivíduos e entidades farão para participar, aprimorar e controlar projetos de lei cujos deputados e senadores são autores, relatores ou membros de comissão que residem em qualquer um dos 26 Estados e Distrito Federal? De que forma acompanharemos os debates havidos antes da votação? Haverá transmissão dos debates ou publicação destes nos Diários das Casas?

A votação eletrônica é bem-vinda, porém desde já tem que ser implementada com transparência de forma a não colocar em risco a soberania popular.

*O autor é advogado, mestre em Filosofia do Direito, cientista político e sócio do escritório BFAP Advogados

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