Estados produtores devem ficar com os royalties do petróleo?

Acordo encabeçado pelo Espírito Santo tenta resolver briga com Estados não produtores, que buscam aumentar participação na partilha dos recursos

Publicado em 13/12/2020 às 08h00
Plataforma de petróleo
Plataforma de petróleo. Crédito: Gabriel Lordello/Mosaico Imagem/ Agência Petrobras

Por justiça fiscal para todos os brasileiros

Eduardo Stranz
Consultor da Confederação Nacional de Municípios (C

No ano de 2010, com a descoberta dos campos de petróleo do pré-sal brasileiro, o governo federal da época encaminhou ao Congresso Nacional um conjunto de projetos chamados de Marco Regulatório do Pré-Sal. As matérias continham inovações e regulamentações que propunham mudanças no regime de exploração da concessão para a partilha e criavam o Fundo Social do Petróleo, além de uma nova empresa estatal. Abriu-se uma ampla discussão sobre como o Brasil deveria tratar essa descoberta que indicava um grande ativo para o país.

Aproveitando a abertura do tema para discussões mais amplas, a Confederação Nacional de Municípios (CNM) demonstrou à sociedade e ao Congresso Nacional que o modelo de distribuição dos royalties e de participações especiais oriundos da exploração pelo regime de concessão era extremamente concentrador. Com isso, privilegia-se pequeno número de Estados e Municípios, gerando grande injustiça fiscal e desigualdade entre os brasileiros, na medida em que há poucos recebendo muito e muitos recebendo pouco.

A aprovação da Lei 13.734/2012 alterou a forma de distribuição desses recursos entre os três Entes, mas preservou o estatuído no art. 20 da Constituição Federal, que garante a Estados e Municípios chamados produtores uma parcela maior de recursos por abrigarem as instalações e sofrerem impactos da indústria do petróleo. Além disso, a lei estabeleceu uma transição em sete anos, prevendo que nenhum Ente perdesse arrecadação de forma abrupta. Essa proposta resultou de amplo acordo com todos os atores envolvidos na época.

No entanto, a concessão de liminar por decisão monocrática no Supremo Tribunal Federal (STF), sobre Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) ainda não julgada, mantém a situação de injustiça fiscal e tratamento desigual entre os brasileiros, fazendo com que os demais Municípios e Estados da Federação tenham deixado de receber, no período compreendido entre 2013 a 2020, mais de R$ 57 bilhões.

Royalties não são, como muitos afirmam, uma compensação ambiental por possível acidente, mas sim uma indenização paga sobre a exploração de uma riqueza finita para o conjunto da sociedade. Destaca-se, ainda que, se houver algum acidente ou derramamento de óleo em uma plataforma continental, as consequências ambientais, sociais e econômicas não repercutirão apenas nas localidades confrontantes, como equivocadamente é argumentado. Além disso, o dano ambiental é punido com multas e obrigações expressivas, não sendo os royalties que cumprem essa obrigação.

Por fim, cabe destacar que a postura da CNM está fundamentada no fato de que a exploração de petróleo em alto-mar não afeta um território específico e sim todo o território nacional. Assim, a riqueza extraída pertence a todos os brasileiros indistintamente.

Acordo é capaz de compatibilizar os interesses

Claudio Madureira
Professor da Ufes e procurador do Estado do Espírito Santo com atuação no Nupetro

O art. 20, p. 1º da Constituição condiciona a exploração do petróleo e do gás natural ao pagamento de royalties às unidades federadas. Interpretando-o, o STF afirmou, em julgamentos anteriores, que a sua finalidade é compensar os impactos da atividade extrativista, e que por isso eles pertencem não apenas à União, mas também aos Estados e Municípios produtores.

O dispositivo também estabelece que os royalties serão distribuídos “na forma da lei”, o que confere ao legislador relativa liberdade para destiná-los à União e aos Estados e Municípios produtores, e lhe possibilitaria, sob certa ótica, inclusive redistribuir parte dos royalties da União aos Estados e Municípios não produtores.  

Muito embora a Lei nº 12.734/2012 tenha sido editada com esse objetivo, o seu propósito inicial acabou não se refletindo no texto final produzido pelo Congresso Nacional. É que, na prática, a lei aprovada possibilita que, após subtraídas as receitas destinadas pelo legislador diretamente à União (que já fica com a maior parte do bolo), os royalties distribuídos aos Estados e Municípios não produtores superem aqueles destinados aos Estados e Municípios produtores.

Os Estados e Municípios produtores entendem que o legislador avançou, ilegitimamente, sobre receitas que a Constituição lhes conferiu, e por isso levaram o problema ao STF. Instaura-se, conflito federativo de enormes proporções, e que vem afetando as decisões de investimento no segmento, com a potencialidade de induzir a retração na produção e no pagamento de royalties e tributos incidentes sobre a exploração do petróleo e do gás natural.

Atento a isso, o Espírito Santo, liderado pelo Governador Renato Casagrande, apresentou ao STF proposta de acordo capaz de compatibilizar os interesses que se contrapõem no litígio, porque assegura a distribuição dos royalties em maior proporção aos dos Estados e Municípios produtores, ao mesmo tempo em que possibilita a ampliação da arrecadação dos Estados e Municípios não produtores em até 1.767%.

Essa iniciativa tem por base a constatação irrefutável de que o petróleo e o gás natural são recursos naturais não renováveis, e de que por isso têm produção finita, da qual resulta, como conclusão inevitável, que a busca por alternativas que possam resolver o conflito enquanto ainda existem royalties e tributos para serem repartidos é atitude mais racional e, sobretudo, mais inteligente do simplesmente aguardar uma decisão do STF para saber quem efetivamente tem razão.

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