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'Mãe, cadê meus amiguinhos?': como ajudar seu filho na quarentena

"Mãe, cadê meus amiguinhos?": como ajudar seu filho na quarentena

Crianças menores, principalmente, reclamam de saudade da escola durante o isolamento por causa do coronavírus. O que fazer? Veja dicas das especialistas

Publicado em 31 de março de 2020 às 14:37

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Sylvia Batista com a filha, Ananda, de 3 anos: confinamento em época de coronavírus
Sylvia Batista com a filha, Ananda, de 3 anos: confinamento em época de coronavírus. (Arquivo pessoal)

“Mãe, por que não posso ir lá fora?”, “Por que não vou mais pra escola?”, “Cadê meus amiguinhos?”. Coronavírus, confinamento… Tudo isso pode ser muito confuso para os pequenos. Mesmo que recebam uma explicação ou outra sobre o que está acontecendo no mundo, fica difícil lidar com tanta mudança.

Como explicar para uma criança que ela não pode brincar com outras da mesma idade? Que ela não pode ver os avós ou que vai ficar um tempo sem ir ao parquinho e à escolinha?

É a barra que a Sylvia Batista tem enfrentado em casa com a Ananda. A menina, de 3 anos, começou a mostrar esses dias que estava com saudade dos coleguinhas da creche.

“A gente está fazendo diversas brincadeiras, está jogando bola, andando de bicicleta na varanda, contando histórias, brincando de caça ao tesouro, pique-esconde… Mas outro dia ela falou: ‘Mamãe, vamos brincar de escolinha?’ Ela colocou livros dentro da mochila, uns bolinhos de slime, que eram os docinhos para o lanche… Depois ela falou o nome de todos os amigos. Vi como ela estava sentindo falta deles”, relatou.

Sylvia, que é professora, diz que conversou com a filha sobre os motivos desse distanciamento. “Ela sabe que é por causa do coronavírus, que pode ficar doente”.

Pedagoga e diretora pedagógica de uma escola de educação infantil em Vitória, Claudia Prados diz que esse período em que a ansiedade toma nossas vidas seja, talvez, mais intenso ainda para as crianças. “Creio que os recursos que elas têm são infinitamente mais limitados que os nossos, até pela questão de verbalização não estar tão aprimorada”, avalia.

Para Claudia, o caminho é este mesmo que Sylvia e outras tantas mães e pais estão adotando em seus lares: carinho e conversa. “Penso que a solidão nas crianças deva ser tratada com muita clareza, e nenhum antídoto é melhor que a atenção familiar. O que a criança mais precisa nesse momento é de acolhimento, é sentir que diante de tantos medos e incertezas - que, sem querer, passamos tudo para nossos filhos - ela amparada pelos pais”, comenta.

A psicóloga e colunista da Revista.ag, Nanda Perim, a Psimama, também acha esse sentimento das crianças bem real. Ela mesma vive isso em casa com os meninos, Théo, de 5 anos, e Gael, de 4. Ela buscou ajuda na contação de histórias.

“Existem alguns livros que as pessoas estão fazendo para ajudar nesse processo”, diz.

Livro

Ela cita o livro “Por que eu não posso ir lá fora?”, que a terapeuta ocupacional Tatyanny F. Araújo fez para explicar, de forma lúdica, a quarentena numa pandemia para sua filha pequena.

Apelar para a tecnologia também funciona, segundo a psicóloga. “Uma coisa que ajudou muito aqui em casa foi fazer ligações de vídeo pros amiguinhos da escola. Pelo WhatsApp, a gente consegue ligar para até três amigos por vez. Eles inventam jogos e fazem a festa!”, sugere Nanda Perim.

Esse recurso, diz ela, ajuda a gastar a saudade.

Claudia também recomenda. “Até para que a criança perceba que é uma situação de isolamento geral, que os amigos também estão em casa com seus pais, como ela. Não deixa de ser um conforto pra criança, sabe?”, destaca a pedagoga.

Alerta para estresse

Preocupada com as consequências do isolamento para a saúde mental de crianças e adolescentes, a Sociedade Brasileira de Pediatria (SBP) divulga nesta semana uma nota de alerta para os pais. O documento adverte que o estresse pode se tornar tóxico, o que leva a um desequilíbrio hormonal que sobrecarrega o sistema cardiovascular e prejudica o desenvolvimento das crianças, com consequências a curto, médio e longo prazos.

Entre as consequências, a SBP lista a piora da imunidade, medos, transtornos do sono, ansiedade, depressão, queda no rendimento escolar e traumas que perduram até a vida adulta.

"Se a criança tem uma rede familiar que lhe dá suporte, se tem uma rotina organizada, brincadeiras no dia a dia e presença qualitativa dos pais, com espaço para abrir seu coração e falar dos seus sentimentos, o estresse se torna tolerável. Do contrário, o estresse se torna tóxico e prejudica a saúde. É preciso cultivar pensamentos positivos", diz a neuropediatra Liubiana Arantes de Araújo, presidente do Departamento Científico de Pediatria do Desenvolvimento e Comportamento, da SBP.

Dicas

A fim de minimizar os riscos para a saúde mental de crianças e jovens, a entidade incluiu no documento 16 dicas, baseadas em pesquisas científicas. Leia a seguir:

  • 01

    Estabeleça rotina

    Os adultos devem realizar momentos de diálogo para discussão das atividades prioritárias do dia a dia, das necessidades básicas da casa, da divisão de tarefas e obrigações. Deve-se organizar os horários do trabalho de cada um dos pais, tentando intercalar os períodos para os demais afazeres da casa e das crianças

  • 02

    Defina papéis

    Discutir em família o papel que cada adulto possui em fornecer o suporte para que o estresse não se torne tóxico para as crianças e adolescentes

  • 03

    Oriente as crianças

    Ensinar como higienizar as mãos e que esse cuidado deve ser um hábito diário, mesmo após a pandemia acabar. Além disso, orientar como espirrar com proteção, como utilizar os seus utensílios, como evitar o contato físico e como se cuidar de forma lúdica, com músicas, leituras e brincadeiras

  • 04

    Abra o diálogo

    Conversar com os seus filhos sobre a situação atual, com linguagem simples e adequada para cada idade da criança. As orientações devem ser transmitidas de forma tranquila a fim de evitar a elevação do estresse, do medo e da ansiedade no nível de chegar a comprometer a imunidade e saúde mental dos pequenos. Explicar que as medidas são de prevenção, mas que podemos esperar bons desfechos. Dar abertura para que eles possam expressar seus sentimentos e suas dúvidas em um ambiente acolhedor e de apoio mútuo

  • 05

    Crie um ócio criativo

    Realizar o planejamento de agenda dos filhos juntamente com eles, incentivando-os a organizar horários equilibrados para manter as atividades de estudo, leitura, música, atividade física, sono e tempo de tela, respeitando os limites da rotina saudável, além dos intervalos de ócio criativo para que a própria criança faça reflexões e brincadeiras que irão ajudá-la a superar esse momento

  • 06

    Mantenha a alimentação da criança adequada

    Manter a dieta e a ingestão de líquidos adequada para cada idade. Os alimentos possuem papel no crescimento, na prevenção de doenças e na formação da arquitetura cerebral. O aleitamento materno exclusivo até o sexto mês e mantido até os dois anos é de grande relevância. Chamar atenção para o sobrepeso e obesidade

  • 07

    Estimule a atividade física

    Intercalar períodos de atividades físicas dentro do lar em mais de um horário do dia nos turnos da manhã e da tarde e, se possível, fazer as atividades em conjunto, pais e filhos. Estimular a criança e o adolescente a ser criativo para realizar essas atividades em casa que podem ser de circuitos feitos com travesseiros e garrafas plásticas, pular corda, dançar, artes marciais dentre outros

  • 08

    Estimule o lazer

    Estimular atividades no quintal, na varanda ou próximo a locais mais arejados da casa ou apartamento

  • 09

    Use a tecnologia com bom senso

    Usar a tecnologia a favor de todos. Definir com as crianças os horários para o uso saudável das telas, segundo as recomendações da Sociedade Brasileira de Pediatria, evitando ultrapassar os limites e o acesso sem supervisão a conteúdos inadequados

  • 10

    Estimule contatos com familiares

    Definir horários para jogos online com os amigos e para videoconferências com os avós (visualizar os avós em boa saúde pode tranquilizar as crianças). Estimular os avós a terem conversas alegres e momentos de descontração durante os contatos à distância

  • 11

    Deixe a criança colaborar em casa

    Inserir as crianças e adolescentes nas tarefas domésticas respeitando a capacidade de acordo com a idade de cada um. Incentivar o ensino colaborativo supervisionado enquanto realizar essas atividades e aproveitar para ensinar afazeres de forma alegre e prazerosa, pois isso pode trazer grande aprendizado para a criança e adolescente

  • 12

    Organize seu horário de trabalho

    Conversar com as crianças e adolescentes para que eles respeitem os momentos que os adultos precisam trabalhar de forma mais concentrada. Tentar sincronizar o horário dessa necessidade com a agenda de um filme ou alguma atividade em que a criança não necessite de tanta supervisão

  • 13

    Filtre as informações

    Reservar de um a dois momentos do dia para que os adultos possam se atualizar em relação às informações, sem expor as crianças a conteúdos inadequados. A maioria das informações repassadas pelas mídias são direcionadas para o público adulto e cabe aos pais limitar o acesso das crianças, repassando o que for necessário com linguagem adequada

  • 14

    Faça refeições em família

    Incluir na agenda pausas durante o dia para que a família possa estar unida de forma alegre e prazerosa. Tentar realizar as refeições junto com as crianças abordando temas construtivos. Praticar as técnicas de atenção plena e de relaxamento

  • 15

    Seja o exemplo

    Ser você o modelo de comportamento que espera de seus filhos. Portanto, os pais devem evitar excesso de tela, manter o lar harmonioso e demonstrar de forma assertiva e genuína como lidar com equilíbrio com essa situação adversa só traz benefícios na construção de um cérebro saudável na infância

  • 16

    Não é férias

     Deixar claro para todos que o momento não é de férias e sim de uma situação emergencial transitória de reorganização do formato em que as atividades cotidianas devem ser cumpridas. 

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Com informações da Folha de São Paulo.

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