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Denunciar para mudar: "É difícil retratar o horror, mas é preciso", diz repórter do Fantástico

Denunciar para mudar: "É difícil retratar o horror, mas é preciso", diz repórter do Fantástico

Palestra de Estevan Muniz marcou o lançamento do programa da Rede Gazeta em 2023. Inscrições já estão abertas

Publicado em 1 de agosto de 2023 às 15:02

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Estevan Muniz,  Repórter do Fantástico, Palestrante do lançamento Curso Residência em Jornalismo, Vitória
Estevan Muniz, repórter do "Fantástico", destacou o processo de narrativas. (Ricardo Medeiros)
Andréia Pegoretti
Repórter convidada

“É difícil retratar o horror, mas é preciso. Não se cobre violação de Direitos Humanos com os olhos fechados. Isso dói. Dói muito, mas é preciso.”

Apontando a necessidade de denunciar com sensibilidade, técnica e critério as mazelas e crimes contra pessoas, sem explorá-las sob o viés sensacionalista, o jornalista Estevan Muniz falou na manhã desta terça-feira (1º) sobre o seu trabalho como repórter do “Fantástico”, em especial os que relatam os casos de violência e transgressão à dignidade humana.

A uma plateia atenta que lotou o auditório da Rede Gazeta, o profissional ressaltou a importância de se entregar um conteúdo transformador para a sociedade, movido, também, por responsabilidade e até por indignação e inconformismo contra injustiças.

A apresentação de Estevan marcou o lançamento da 26ª edição do Curso de Residência em Jornalismo da Rede Gazeta e a abertura das inscrições para se candidatar às 10 vagas do programa (acesse aqui para se inscrever).

Na abertura da conversa, o repórter especial mostrou trechos iniciais de algumas de suas matérias veiculadas no “Fantástico”, com temáticas relacionadas a trabalho análogo a escravidão e crimes sexuais contra menores praticados por um grupo religioso, ocupação dos sem-teto em prédios abandonados de São Paulo e guerra na Síria.

A exibição desses recortes tinha o propósito: mostrar a relevância, sobretudo para os profissionais e estudantes de jornalismo presentes no auditório, de um bom e atraente começo de reportagem.

“O começo de uma matéria é tudo. O mais importante. Reproduz o que se quer mostrar. Sou obcecado por inícios”, destacou.

Como dicas para estabelecer uma boa introdução que leve o público a mergulhar junto na história, ele cita a conduta diferencial de se apostar em uma rica viagem sonora que esteja alinhada às imagens. O som ambiente (o barulho de passos e das ruas, por exemplo) , alias, é um recurso que o profissional sempre lança mão, principalmente nas aberturas, lição aprendida com seu “mestre” Caco Barcellos.

“Imagens sem áudio são circuito de seguranças. Áudios sem imagens são podcasts. Quando a matéria tem áudio [som de coisas acontecendo], as pessoas param para prestar atenção.”

Estevan Muniz,  Repórter do Fantástico, Palestrante do lançamento Curso Residência em Jornalismo, Vitória
Auditório da Rede Gazeta ficou lotado para assistir à apresentação do repórter. (Ricardo Medeiros)

Temas sensíveis

Ainda sobre começos, o jornalista detalhou seu processo para apresentar ao público temas sensíveis, estabelecendo uma escalada nessa carga. Como exemplo, mencionou a reportagem feita por ele sobre o Discord, um aplicativo popular entre adolescentes que havia se tornado ferramenta para envolver jovens em crimes como tortura e estupro.

Aspas de citação

Fizemos duas grandes coberturas sobre  o Discord, que foram impactantes. Eram muitos crimes brutais. Então, mostramos de forma gradativa: destacamos primeiro o crime menos brutal, até chegarmos ao mais brutal. Era como se eu dissesse para o público: ‘Fica aí comigo que a gente vai gradativamente. Vou te preparando'. Sempre falo: na cobertura de Direitos Humanos, não dá para você violar direitos, você tem que respeitá-los e protegê-los.

Estevan Muniz
Repórter especial do Fantástico
Aspas de citação

Com o conteúdo produzido para a guerra na Síria, ocorreu algo similar. “Havia muitas crianças com queimaduras de pele. A gente decidiu começar a matéria com a criança com máscara. Depois, mostramos imagens de arquivo, aviões e bombardeios. Em seguida, voltamos para a história da criança, e ela tira a máscara. Isso foi feito conscientemente por nós. Foi uma decisão de preparar o público. Era como se falássimos: ‘Olha, você, vai ver um negócio difícil de ver. Fica comigo até o final da matéria’. (...) Ouvi uma vez de um grande comentarista americano: é responsabilidade do comentarista levar o público até o inferno, mas é preciso tirá-lo de lá. Então, pega na minha mão, nós vamos ver alguns horrores, mas a gente vai sair dessa, tenha esperança. Venha comigo, fica aí assistindo a essa jornada difícil.”

Na parte final do bate-papo, mediado pelo chefe da Redação da Rede Gazeta, Geraldo Nascimento, Estevan Muniz respondeu a perguntas enviadas pela plateia. Uma delas era sobre como lidar com as emoções em pautas tão delicadas.

Estevan Muniz,  Repórter do Fantástico, Palestrante do lançamento Curso Residência em Jornalismo, Vitória
Estevan Muniz, repórter do Fantástico: "Podem me chamar de idealista, mas não sou ingênuo". (Ricardo Medeiros)

“Não tenho como lidar. Eu tenha uma contraofensiva nas minhas emoções. A indignação que sinto, tento trazer para os textos”, respondeu o jornalista, citando a cobertura recente sobre o caso Marielle Franco e a entrevista com um dos acusados pelo crime contra a vereadora do Rio de Janeiro, assassinada no Centro da cidade em março de 2018.

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Estevan deixou como uma mensagem final sobre o poder transformador da informação. “O problema (denunciado) pode não acabar, mas agora sabemos que o problema existe. Podem me chamar de idealista, mas não sou ingênuo. Eu tenho razões, motivos, evidências, para continuar acreditando nesta transformação.”

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