Publicado em 16 de outubro de 2020 às 15:25
Mortes e hospitalizações causadas pela Covid-19 na Europa estão muito abaixo dos picos registrados nos piores momentos da pandemia, embora os casos continuem a subir. O resultado é um descolamento agudo entre as curvas de doentes e de óbitos. >
Consolida-se ainda um padrão: dentro de cada país, a maior parte dos óbitos hoje se concentra em regiões inicialmente poupadas. Nos locais que sofreram mais no começo, as mortes agora estão abaixo da média geral.>
Portugal é o único país onde o aumento de hospitalizações e mortes é mais significativo. Mas Portugal foi também mais poupado no início por medidas restritivas à circulação de pessoas, quando chegou a ser apontado como exemplo a seguir.>
Enquanto em seu pico a Covid chegou a matar 22 portugueses por milhão de habitantes, na Espanha os mortos somavam 120 por milhão; na Itália, 91; na França, 53.>
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A dinâmica portuguesa agora -assim como a evolução regional da doença dentro dos países europeus- mostra que, onde o coronavírus fez mais vítimas no início, ele é mais brando hoje. Onde matou menos, parece haver espaço para avançar mais.>
O fato reforça a importância e a centralidade da imunização coletiva -a chamada imunidade de rebanho- na contenção da doença.>
No Brasil, onde a epidemia chegou depois, a tendência europeia sugere o que vem pela frente. Pode ainda apontar como tratar a reabertura da economia e o isolamento nas áreas até agora mais ou menos afetadas.>
Se no início da pandemia o total de testes era restrito e a subnotificação estimada de casos era grande, hoje, com a massificação da testagem, muitos países têm registrado mais casos de infecções do que no auge da doença, ou estão próximos dele, o que tem alarmado as autoridades.>
A OMS (Organização Mundial da Saúde) chegou a afirmar nesta quinta (15) que as mortes na Europa podem superar em cinco vezes as registradas no pico.>
Por ora, a projeção parece infundada. Não só pelo número atual de óbitos, bem menor, como pela aceleração das curvas de hospitalizações e mortes, menos acentuada.>
Na França, os casos positivos para Covid hoje representam mais que o dobro (213%) dos registrados no pico, refletindo a massificação de testes.>
Mas as hospitalizações (incluindo admissões em UTIs) equivalem a 26% do total no pico. Os óbitos, a 13%, segundo dados do Instituto Estáter, que organiza informações sobre a evolução da Covid-19 por países e suas regiões com base em números oficiais.>
A partir deste sábado (17), a França adotará toque de recolher por quatro semanas, de 21h às 6h, em Ile-de-France, onde fica Paris, e oito pontos (Lille, Grenoble, Lyon, Aix-Marseille, Montpellier, Rouen, Toulouse e Saint-Etienne).>
Várias regiões da França ainda podem registrar alta importante de hospitalizações e mortes, já que o país conseguiu conter de forma significativa o número de ocorrências de maio a julho.>
Nas áreas francesas menos afetadas no início, os óbitos equivalem hoje a 24% do pico; nas mais castigadas antes, 10% -ante os 13% da média geral.>
A situação é semelhante na Espanha, embora o país tenha contido as ocorrências apenas de maio a junho. Enquanto as mortes totais hoje são 13% do pico, as regiões menos atingidas no começo têm uma taxa de 22%; as que mais sofreram lá atrás, de 11%. Os novos casos representam hoje 82% do pico; e as internações, 15%.>
As autoridades sanitárias espanholas indicaram recentemente as comunidades autônomas de Aragón, Castilla e León, Madri e La Rioja, além de Ceuta, em nível de "risco máximo", mas delegaram às autoridades locais qualquer decisão sobre confinamento.>
Outros países estão em situação mais confortável, mesmo com o atual número de casos positivos se aproximando ou superando os do pico.>
Na Itália e na Alemanha, as mortes por Covid não passam de 5% do total no pior momento, e as hospitalizações seguem abaixo de 20%.>
Enquanto a Itália debate a necessidade de novas quarentenas, a Alemanha instituiu o fechamento de bares e restaurantes às 23h e limitou as festas familiares.>
No Reino Unido, hoje com muito mais infecções (295%) que as registradas no pico, as mortes por Covid representam 6% do pior momento; as hospitalizações, 24%.>
"É natural que governos tenham postura conservadora, mas os dados de hospitalizações da maioria dos países europeus até o momento não parecem demandar as medidas restritivas impostas", afirma Pércio de Souza, presidente do Instituto Estáter.>
Em sua opinião, a falta de testagem no inicio do ano em muitos países compromete as conclusões a respeito da evolução da pandemia, diferentemente do que mostram as hospitalizações e os óbitos.>
"Medida por hospitalizações, a curva pandêmica europeia tem intensidade ainda muito abaixo do ápice de abril, com cerca de 1/4 do pico, enquanto óbitos estão ao redor de 1/6 do pico", diz Souza.>
Segundo o médico português Rui Moreno, ex-presidente e membro honorário da Sociedade Europeia de Medicina Intensiva, apesar do recente aumento das mortes e hospitalizações na Europa, é possível ser "razoavelmente otimista" com a evolução futura da pandemia na região.>
"O aumento dos casos reflete uma quantidade muito maior de testes. As novas infecções incluem muitos jovens, que adoecem menos. E houve uma melhora muito grande no conhecimento clínico para tratar os doentes, que têm sido atendidos prontamente nos hospitais", afirma.>
Poupado no inicio, Portugal tem hoje quadro mais difícil. Com um número de testes mais de quatro vezes superior aos que eram realizados em março e abril, os casos positivos no país equivalem a 151% dos registrados no pico, segundo dados do Estáter.>
Já as admissões em hospitais representam 73% do pior momento; e os óbitos, 34%.>
As internações em UTIs no país, que somavam 80 há dois dias, agora pairam em 130. Os casos novos casos registrados, de 700 diários há três dias, subiram para a faixa de 2.100 -mais que os 1.700 por dia computados durante o pico anterior.>
Assim como outros países europeus, Portugal vem tentando adotar medidas preventivas para evitar um novo fechamento da economia e o colapso da atividade turística.>
Moreno afirma que o mais provável é que a Europa ainda tenha de conviver com esse novo aumento de casos, hospitalizações e mortes pelas próximas duas semanas; mas a tendência pode ser de estabilização ou queda à frente.>
Segundo ele, entre os países e cidades europeias, a situação de Madri é a mais complexa. "Parece haver uma enorme confusão ali, numa exceção que ninguém compreende ao certo o que ocorre. Paris, por exemplo, tem agora menos mortalidade do que antes."?>
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