Publicado em 28 de março de 2022 às 08:47
Era para ser um tapete vermelho essencialmente político, mas a ideia de retornar ao mundinho cor-de-rosa pareceu mais sedutora.>
Um batalhão de atrizes, atores e cantores cruzou o Dolby Theater, em Los Angeles, devidamente trajado com o arquétipo de glamour que a organização do Oscar deste ano precisava para movimentar o público cada vez mais ausente.>
Ainda que as cores da bandeira ucraniana aparecessem vez ou outra nos laços pregados na lapela -e até nos dedos, como se estivessem ali para não prejudicar a montação- o estardalhaço de grifes, brilhos, volumes, nervuras, joias poderosas e plissados permeou o show que antecede a festa do cinema.>
Como extensão do ofício de vender sonhos embalados em grifes, os tons calmos, rosáceos, o dourado-estatueta e as variações de lavanda tingiram o desfile de celebridades que, pela TV, pareciam felizes em exibir seus Prada, Armani Privé, Atelier Versace e Fendi, para citar, respectivamente, as escolhas de Lupita Niong'o, Nicole Kidman, Lily James e Naomi Scott.>
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Essas cores foram destaques das últimas temporadas de desfiles de alta-costura e prêt-à-porter. Provam que, embora despedaçada, a bolha hollywoodiana não entrega o jogo tão facilmente e está disposta a manter as aparências da máquina que paga a conta.>
O "vestido de milhões" da cerimônia, o de Jessica Chastain, foi desenhado por Alessandro Michele, da Gucci. Ela, que, conforme se especulou, ameaçou até não desfilar em protesto contra o corte de oito prêmios tidos como "menores" na transmissão ao vivo, deu um recado com a escolha.>
A coleção do estilista foi uma homenagem à Hollywood do passado, ao glamour hoje algo decadente que se equilibra para manter a relevância. Amor e união também inspiraram Michele, o que serviu como subtexto político para Chastain tratar da beligerância sobre a qual ninguém quis falar com todas as letras.>
Este foi, em resumo, um tapete vermelho da moda pós-pandêmica. O corpo à mostra, tendência absoluta na saída da clausura, foi abraçada pelos dois queridinhos da nova constelação cinematográfica.>
Thimothée Chalamet, ator principal de "Duna", não usou nada por baixo de costume preto forrado de brilhos assinado pela Louis Vuitton. Sua companheira de cena no filme, Zendaya, "reagiu" e pôs o cropped, no look Valentino composto por blusa de alfaiataria curta e saia longa prateada.>
Nos minutos finais, outro golpe de imagem. Kristen Stewart, de "Spencer", aderiu à tendência dos terninhos onipresentes nas últimas passarelas e usou um conjunto de blazer e shorts da Chanel que era todo aberto no tronco.>
Boa parte dos looks tinha a ver com algo de que a Academia e quem ainda acompanha sua festa maior sentia falta, que é o toque, o contato físico. Não foi coincidência, portanto, que as roupas trouxeram as texturas que dão tridimensionalidade ao tecido, com aplicações de pedras e o detalhismo de grifes cujas etiquetas ostentam nomes de grandes costureiros, a exemplo do Christian Lacroix vermelho usado por Kirsten Dunst e o Jean Paul Gaultier verde-esmeralda de Jada Pinkett-Smith.>
Mesmo outros homens aumentaram o volume dos trajes para chamar as luzes para si. O Moschino rosa do cantor Sebastián Yatra e o Bottega Venetta azul de Kodi Smit-McPhee foram socos na ala mais tradicionalista da costura.>
Soa quase cínico que, após tantas manifestações públicas de repúdio às mudanças na premiação e mensagens indignadas com a invasão russa proferidas no último SAG Awards tenham tomado as atenções da indústria, agora tudo pareça apagado em nome da cara rebocada em pancake.>
Mesmo que, no dia seguinte, o rosto apareça todo borrado e derretido em críticas, Hollywood quis mostrar estar viva. E está, mas provou também não estar nem aí para nada que esteja de fora de seus domínios.>
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