• Rachel Martins

    Uma jornalista que ama os animais, assim é Rachel Martins. Não é a toa que ela adotou duas gatinhas, a Frida e a Chloé, que são as verdadeiras donas da casa. Escreve semanalmente sobre os benefícios que uma relação como essa é capaz de proporcionar

Agressão canina: quem é o verdadeiro culpado?

Publicado em 23/04/2024 às 11h00
Agressão canina: quem é o verdadeiro culpado?

Tutores devem ficar atentos ao comportamento agressivo do animal. Crédito: Shutterstock

No Espírito Santo, a Lei Estadual nº 10.967/2019 no art. 24 diz que “todo animal, ao ser conduzido em vias públicas, deve obrigatoriamente usar coleira e guia adequadas ao seu tamanho e porte, sob pena de pagamento de multa no valor de 15 (quinze) VRTEs (Valor de Referência do Tesouro Nacional)”. A focinheira em nível estadual ainda não é obrigatória, mas é em algumas legislações municipais.

A questão é que mesmo tendo leis que exigem o uso de coleira e guia em cães em áreas públicas, vem acontecendo dezenas de fatalidades no Brasil por conta de tutores que ainda insistem em andar com seus animais soltos.

Duas delas ganharam muita repercussão nos últimos dias: da escritora Roseane Murray, de 73 anos, que foi atacada por três pitbulls enquanto caminhava por uma rua de Saquarema (RJ) e teve o braço direito amputado, e a briga entre dois tutores, o empresário Manoel Oliveira Pepino, 73, e o advogado Luis Hormindo França da Costa, 33, por conta do cachorro do empresário que estava sem coleira e sem guia em uma praça do bairro Mata da Praia, em Vitória. A confusão culminou em um tiroteio e a morte do aposentado, além do cão que também foi ferido.

Diante desses e outros episódios, surgem questionamentos. Se existe um culpado, quem é? É o tutor que infringe a lei passeando com o animal sem os equipamentos adequados de contenção de animal, dando margem a fatalidades que poderiam ser evitadas? Quem cria de forma errada o cão, incentivando-o a ser agressivo? Os argumentos, certamente, são muitos.

A médica-veterinária, cinófila e adestradora comportamental, Nathalie Jaeger, explica que em relação à agressividade do animal, não necessariamente a culpa é do proprietário. “O percentual de tutores que instigam agressividade aleatória e sem conceito técnico é muito baixo. Além disso, existe por parte dos tutores uma falta de conhecimento do universo canino e uma resistência, muitas vezes, em buscar ajuda ou auxílio técnico de qualidade para superar algumas questões relacionadas ao animal de estimação”, garante.

Jaeger ressalta um ponto que deve ser levado em conta na hora de escolher o cão: o fator genético, seja na seleção de uma raça ou no contexto histórico para identificação de características do indivíduo. "Somente através do estudo genético podemos garantir os níveis de consanguinidade de forma segura, promover a progênie (ascendência) e, assim, selecionar cães com maior saúde emocional e física. Daí a necessidade de manter na criação de cães de raça o processo cinológico (o estudo e a dedicação constante à criação e desenvolvimento das raças caninas em busca de seu aperfeiçoamento)”, alerta.

Em relação ao ataque de cães, não necessariamente de pitbulls, Jaeger informa que o gatilho de agressão do animal pode surgir por meio de estímulos que acionam o comportamento de “caça” (predatório), de defesa (os mais diversos) e até de insegurança em níveis variados, uma vez que se tratando, por exemplo, de cães de guarda, é interessante que o cão possua um certo nível de insegurança para que gere nele a necessidade de repelir ou se defender, mas que não seja elevado a ponto de entrar em fuga.

Os cães recolhidos após o ataque à escritora podem ser treinados e terem suas emoções e comportamentos controlados. Porém, o fato de estarem controlados não significa que possam ir para qualquer família. Será necessário buscar proprietários que, de forma responsável e técnica, mantenham determinados padrões de comportamento nos animais

Os cães recolhidos após o ataque à escritora podem ser treinados e terem suas emoções e comportamentos controlados. Porém, o fato de estarem controlados não significa que possam ir para qualquer família. Será necessário buscar proprietários que, de forma responsável e técnica, mantenham determinados padrões de comportamento nos animais

Nathalie Jaeger - veterinária

Ela enfatiza, ainda, a atenção dos proprietários ao identificarem comportamentos de agressividade em qualquer nível e raça de cão, nesses casos devem imediatamente buscar ajuda profissional, pois o adestramento é primordial.

O médico-veterinário Fabrício Pagani destaca que o cão sempre será vítima. “Ele não escolheu seus pais (genética) ou seus donos (responsáveis legais). Não escolheu ser criado sem a devida atenção e educação. Não resolveu sair na rua sem coleira/guia/focinheira. Enfim, o cão é um reflexo e consequência de atos irresponsáveis dos humanos. Em ambos os casos apresentados, os problemas foram causados pela irresponsabilidade dos tutores”, conclui.

O que diz a lei

O Secretário de Estado de Meio Ambiente e Recursos Hídricos (Seama), Felipe Rigoni, lembra que o Estado possui uma legislação própria, sancionada em 2019.

O Secretário de Estado de Meio Ambiente e Recursos Hídricos (Seama), Felipe Rigoni

O Secretário de Estado de Meio Ambiente e Recursos Hídricos (Seama), Felipe Rigoni. Crédito: Divulgação

“Ela prevê que todos os cães ao andarem em vias públicas devem estar de coleiras e guias, para sua própria segurança e dos demais. Infelizmente, estamos vivendo em um mundo em que a ausência de diálogo está cada vez mais presente, assim como os discursos de ódio. É importante que as pessoas cumpram a legislação que está vigente e, mais do que isso, façam o exercício da conversa e do respeito ao próximo. Precisamos combater essa violência”, enfatiza.

Quais as implicações civil e criminal

O advogado Elio Casagrande, que atua no Direito Civil, explica que a culpa é sempre do tutor, já que os animais não são dotados de capacidade civil. “De acordo com o Art. 936 do Código Civil, o dono, ou detentor, do animal ressarcirá o dano por este causado, se não provar culpa da vítima ou força maior. No âmbito criminal é a mesma coisa, mas o enquadramento legal dependerá do entendimento da autoridade que tipificar o delito”.

“No caso da escritora, houve lesão corporal gravíssima provocada pelo ataque dos pitbulls. Em relação ao empresário e ao advogado, o primeiro descumpriu a legislação que obriga o uso de coleira ou guia em cães quando em áreas públicas. Embora tenha sido uma discussão entre dois seres humanos, o gatilho mais uma vez foi um cachorro passeando sem coleira ou guia. Uma atitude simples que deveria ser seguida por cada tutor, já que promove a segurança dele, do animal e da população. Provavelmente, se isso tivesse acontecido, existe uma enorme possibilidade da história nos dois casos ter tomado outro rumo”, conclui.

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Este texto não traduz, necessariamente, a opinião de HZ.

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