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Publicado em 21 de novembro de 2025 às 08:00
Maura Helena Miranda nasceu em Cachoeiro de Itapemirim, no bairro dos Ferroviários, onde o barulho dos trens se misturava ao cheirinho bom dos bolos e doces que a mãe, dona Gicelia, fazia para vender. O pai, Valentim, era ferroviário, homem de passos firmes e rotina disciplinada. A casa era simples, mas cheia de afeto, e foi nela que Maura aprendeu o valor da palavra, da curiosidade e da dedicação. >
Irmã mais nova de quatro irmãos, desde menina chamava atenção pela fala solta e o olhar curioso. “Sempre foi muito comunicativa”, recorda a irmã Ana. Era ótima aluna no colégio Liceu Muniz Freire e passava horas lendo, encantada com o poder das histórias.>
Ao terminar o ensino médio, deixou o interior rumo a Vitória. A capital parecia grande demais, mas ela nunca teve medo. Trabalhou como atendente de farmácia, começou a graduação em Serviço Social, mas logo sua veia comunicativa falou mais alto. Tinha algo em sua forma de observar o mundo que pedia uma câmera por perto, e ela entendeu cedo que contar histórias era seu destino. Mesmo sem concluir a primeira graduação, Maura entrou no curso de Jornalismo.>
Em meados da década de 1970, Maura Miranda estreava na TV Gazeta. Era 1977 e, ao surgir no vídeo, algo novo acontecia: pela primeira vez, uma mulher negra ocupava a bancada de um telejornal no Espírito Santo. Ela foi a primeira mulher negra do Estado a ser âncora de um telejornal e uma das primeiras do Brasil. >
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A presença de Maura rompeu o que parecia impossível. Ela falava com naturalidade, com leveza. Lia as notícias como quem conversa com o público. “Ela apresentava de uma forma mais conversada, o que era raro na época”, lembra o diretor de Jornalismo da Rede Gazeta, Abdo Chequer.>
Nos anos 70 e 80, ela se tornou um rosto conhecido em todo o estado. De acordo com Abdo, ela tinha elegância, serenidade e uma presença que inspirava confiança. “Era moderna e muito querida pelos colegas da redação”>
Trabalhou na TV Gazeta até 1983, onde fez história, e, logo depois, passou para a TV Vitória, então afiliada à Rede Manchete, onde permaneceu por uma década. Cada reportagem, cada entrada ao vivo, trazia o mesmo rigor e o mesmo brilho nos olhos de quem entendia o jornalismo como missão. >
“Maura era alegria. Ela alegrava os espaços. Era muito bonita e andava sempre elegante”, relembra a jornalista Helena de Almeida, amiga e parceira de redação.>
Em 2003, Maura chegou à Assembleia Legislativa, onde trabalhou na Secretaria de Comunicação. Lá, produziu reportagens e documentários que marcaram o jornalismo capixaba, entre eles Os Pomeranos, Lugar de Toda Pobreza e o premiado Amar Caparaó. >
O olhar humano e sensível que sempre a guiou fez dessas obras muito mais que registros: eram retratos do Espírito Santo real, diverso e belo. Este foi o último emprego de Maura, no qual saiu em 2011 e depois se aposentou. >
Nos últimos anos, Maura viveu um tempo de fé. Tornou-se evangélica, dedicou-se à espiritualidade e encontrou na calma da rotina de Jardim da Penha um novo sentido para a vida. Lia bastante, cuidava dos cachorros e mantinha perto os irmãos, especialmente Ana Maria, Nina e Cliveraldo, seu confidente. >
A sobrinha, Gicelia Miranda, reforça: “Era centrada, compenetrada, vaidosa e apaixonada por Vitória. Amava cachorro, teve vários! Também adorava moda e tinha uma relação muito boa com a família”.>
Maura Miranda morreu aos 72 anos, no Hospital Estadual Dr. Jayme Santos Neves, na Serra, após complicações de uma cirurgia para retirada da vesícula. O procedimento parecia simples, mas evoluiu com aderências e infecção. “Ela internou na sexta-feira e no dia seguinte teve complicações, voltando para o centro cirúrgico. Depois, foi direto para a UTI”, contou a sobrinha Gicelia Miranda. >
O corpo foi levado para Cachoeiro de Itapemirim, sua cidade natal, e velado na Capela do Cemitério de Coronel Borges, onde foi sepultado no fim da tarde. >
Mas sua voz permanece. Permanece no jeito natural de tantos apresentadores que hoje olham para a câmera como quem conversa com um amigo. Permanece no gesto de cada mulher negra que, ao ligar a TV, sabe que ali também é seu lugar.>
Em uma entrevista de 2016 para a TV Gazeta, Maura resumiu a transformação que ajudou a construir:>
Décadas antes, ela já havia feito exatamente isso, com coragem, pioneirismo, competência e verdade.>
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