Alexandra Richter fala sobre o humor insano de "Gargalhada Selvagem", em cartaz no ES

Montagem, que também conta com Rodrigo Fagundes e Joel Vieira será encenada gratuitamente no Teatro Universitário (Ufes), em Vitória, neste sábado (17) e domingo (18)

Alexandra Richter é um dos destaques da peça

Alexandra Richter é um dos destaques da peça "Gargalhada Selvagem", em cartaz em Vitória. Crédito: Nana Moraes

No final de 2022, "HZ" deu em primeira mão que "Gargalhada Selvagem", sucesso da Broadway que ajudou a consagrar o nome do dramaturgo Christopher Durang nos palcos ianques, ganharia sua versão nacional sob o comando dos produtores capixabas Wesley TellesBruna Dornellas, da WB Produções.

Após uma bem-sucedida estreia em São Paulo, e curtas passagens por Campinas/SP e Belo Horizonte, o espetáculo chega ao Espírito Santo com sessões gratuitas, sábado (17) e domingo (18), no Teatro Universitário (Ufes), em Vitória, inserido no projeto Diversão e Arte ArcelorMittal. 

Ingressos para os dois dias estão sendo distribuídos mediante a doação de 1kg de alimento não perecível, exceto sal e açúcar. Na manhã desta sexta (16), segundo informações da assessoria do espetáculo, restavam poucos convites para sábado (17) e para domingo (18). A distribuição continua nesta sexta, a partir das 14h. Veja como conseguir o seu nesta matéria de "HZ"

Escrita por Durang nos anos 1980, mas extremamente atual devido ao comportamento da sociedade perante ao tão falado "capitalismo selvagem" ao qual somos submetidos diariamente, "Gargalhada" flerta com o Teatro do Absurdo e segue quase à risca as ideias do criador do termo na década de 1960, o húngaro Martin Esslin.

Nada sintetiza melhor o encontro surrealista de um homem (Rodrigo Fagundes) e uma mulher (Alexandra Richter) - e seus embates morais em um supermercado, onde são "despejados" frustrações, solidões, angústias, fracassos e medos - do que uma frase dita por Esslin há mais de meio século: "(O Teatro do Absurdo) Se esforça por expressar o sentido do sem sentido da condição humana".

Visto sob essa ótica, a montagem em cartaz no Espírito Santo - dirigida por Guilherme Weber - também bebe da fonte de outros gênios dos palcos, como Samuel Beckett, Eugène Ionesco e Arthur Adamov, ou seja, tenta extrair o irracional de pessoas perdidas em suas neuroses. Nem Freud explica!

Psicologismos à parte, a talentosa Alexandra Richter (conhecida do grande público pela novela "Cheias de Charme" e do filme "Divã"), em descontraído bate-papo com "HZ", afirmou que é exatamente desse gatilho psicológico que "Gargalhada Selvagem" consegue fugir bravamente.

"Interpreto uma atriz (que não tem nome) desconectada e com algum transtorno que não sei dizer qual. Até porque, tentamos não cair no viés psicológico, pois, atualmente, no mundo complicado em vivemos, os transtornos não precisam ter causas. É uma pessoa sozinha, desesperada por afeto, intolerante, neurótica e violenta. Fiquei dois meses ensaiando uma gargalhada, em que digo a frase de Beckett, 'uma gargalhada selvagem no meio da mais severa aflição'. É essa loucura e esse humor doloroso que causa estranheza, mas identificação, que levamos para o palco", explica Richter, que passa boa parte do espetáculo com o cabelo desgrenhado, entre uma confusão e outra tendo um pote de atum como epicentro!

B.O. NO MERCADO!

"Gargalhada Selvagem" é basicamente dividida em três atos. Um destacando a mulher; outro, o homem (Fagundes, encarnando uma espécie de "ator coach autoajuda neurótico da internet", muito comum atualmente); e um terceiro, mostrando o encontro de ambos com Beto, vivido pelo comediante Joel Vieira. O rapaz é namorado do homem e fica "cabreiro" quando o ator, bissexual mal resolvido, se mostra interessado na mulher que encontra no mercado. É só o início para um show de (deliciosas) insanidades. 

Voltando a Alexandra, a artista afirmou que a peça exige grande interpretação física dos atores, como também uma rígida marcação de palco - é notória a presença da mise-en-scène em cada cena. Para isso, foram dois meses de ensaios exaustivos, no início de 2023. Na época, ela contraiu Covid-19, precisou se afastar um tempo da preparação, mas, garante, ter voltado com força total.

"Tenho visto muita gente caracterizar a personagem como Karen, um termo pejorativo criado nos Estados Unidos para a mulher branca, loira e rica, que vive desconectada da realidade. Acho que ela é bem mais que isso, pois possui várias camadas. Podemos vê-la como um jogo de cena, por exemplo. Como ambos são atores, quem nos garante que eles não estão interpretando esses embates no mercado e fora dele? Vou até mais longe... como aparentemente ambos têm algum transtorno, será que eles não podem estrar vivendo um pesadelo?", indaga, com ar de mistério, evitando responder mais sobre o assunto para não estragar possíveis surpresas da plateia durante a encenação. 

Alexandra Richter, Rodrigo Fagundes e Joel Vieira estão no elenco da elogiada peça

Alexandra Richter, Rodrigo Fagundes e Joel Vieira estão no elenco da elogiada peça "Gargalhada Selvagem". Crédito: Leekyung Kim

Com formação teatral, sendo uma das responsáveis pelo sucesso de montagens como "A História de Nós Dois 2", Richter afirma gostar de fazer o tipo de humor provocativo que "Gargalhada Selvagem" lhe proporciona.

"Esse humor nos dá a possibilidade de nos testar diariamente, até mesmo acompanhando a reação da plateia. Parte do público se identifica com algumas situações mostradas no palco, como a intolerância, a violência e a desconexão com a realidade. Curiosamente, boa parte da montagem se passa em um supermercado, onde as pessoas vão para comprar suas necessidades básicas. Não os ricos, claro, pois esses têm alguém para ir para eles", dispara, com uma deliciosa risada irônica do outro lado do telefone, para logo retornar com a linha de raciocínio.

"O que mais a gente vê são pessoas brigando no mercado, nas filas, discutindo e atacando quem eles não conhecem, como se estivessem em situações-limite. Vivemos uma época que parece incentivar a divisão da sociedade, especialmente por conta da situação política do país. As pessoas estão prontas para te atacar gratuitamente, principalmente nas redes sociais. Parece que sempre tem alguém que acorda diariamente e diz: 'quem vou infernizar hoje?'. É uma loucura isso!", brinca. 

VIDA SIMPLES

Atriz versátil e de vários papéis, tanto no cinema, como no teatro e na TV, Alexandra Richter diz que, mesmo passados 11 anos, muitas pessoas ainda se lembram da esnobe Sônia Sarmento de "Cheias de Charme", indiscutivelmente uma das melhores caracterizações da atriz em sua longeva e bem sucedida carreira.

"Acho isso o máximo (risos), mesmo podendo soar como estereótipo. Tenho essa cara de Leblon (mais risos), mas sou do subúrbio do Rio de Janeiro, do bairro do Riachuelo. Na minha casa tinha roda de samba na calçada, meu pai era da Mangueira. Sempre tivemos uma vida simples, mas acho que sei como herdei essa pose toda", suspira, referindo-se à mãe, que sempre foi exemplo de requinte para toda a família. 

"Uma mulher chique, com quatro idiomas, foi miss, sabe? Ela me ensinou essa coisa de postura, de como sentar à mesa. Acho elegante, mas não me preocupo muito com essas coisas", relata, falando que chegou recentemente aos 56 anos e vive muito bem com isso, obrigado!

"Não tem fórmula. Estou e vivo de bem com o tempo. Sou amiga dele (risos). Procuro exercitar o presente. Nunca fiz cirurgia plástica, até porque morro de medo de anestesia geral. Medo não, pavor! Mas assumo que coloco um Botox aqui e ali, né?", satiriza, com sua reconhecida autocrítica. "Mas não na época em que estou viajando em turnê com alguma peça. Não posso perder as expressões naturais", enfatiza.

"Sei que a minha juventude ficou para trás e não me incomodo com isso. Também sei que a menopausa muda o corpo, mas a beleza fica. A gente vive esse tempo e não podemos mudar. O que podemos é tirar humor disso", aconselha, em tom de serenidade. 

GARGALHADA SELVAGEM

  • QUANDO: Sábado (17), às 20h, e domingo (18), às 17h (com intérprete de libras). Classificação: 14 anos
  • ONDE: Teatro Universitário. Campus da Ufes. Av Fernando Ferrari, 514, Goiabeiras, Vitória
  • INGRESSOS: Convites para os dois dias estão sendo distribuídos mediante à doação de 1kg de alimento não perecível, exceto sal e açúcar. Na manhã desta sexta (16), segundo informações da assessoria do espetáculo, restavam poucos bilhetes para sábado (17) e para domingo (18). A distribuição continua nesta sexta, a partir das 14h. Veja como conseguir o seu nesta matéria de "HZ".

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