Publicado em 4 de julho de 2023 às 08:30
BRASÍLIA - O presidente da Câmara dos Deputados, Arthur Lira (PP-AL), começou a medir o apoio das bancadas partidárias à reforma tributária num momento em que governadores e prefeitos de capitais elevam a pressão na tentativa de obter mudanças no texto ou adiar a votação.>
Segundo aliados, Lira pediu às lideranças que sinalizem quantos votos cada bancada é capaz de entregar, considerando o texto atual do relator, deputado Aguinaldo Ribeiro (PP-PB), e quais são os principais entraves a uma adesão maior, se questões federativas ou setoriais.>
O PT, partido do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), já sinalizou que entregará 100% de seus votos na Casa — a sigla tem 68 deputados. Já o PP de Lira, segundo aliados do presidente da Câmara, pode entregar cerca de 90% dos 49 apoios possíveis.>
Por se tratar de uma PEC (proposta de emenda à Constituição), o texto precisa do apoio de 308 deputados em dois turnos de votação.>
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"Precisamos primeiro ter um resultado do placar dos partidos, de como as bancadas estão", disse Lira nesta segunda-feira (3). Segundo ele, o texto será colocado em votação "na hora que vislumbrarmos um quórum adequado".>
Arthur Lira
Presidente da Câmara dos DeputadosO governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas (PL), tem capitaneado um dos polos de resistência à reforma tributária. No último domingo, ele tentou mobilizar a bancada de parlamentares do estado (que tem 70 deputados) em defesa de mudanças na proposta.>
No entanto, o próprio coordenador da bancada estadual, deputado Antonio Carlos Rodrigues (PL), disse que não arrisca um posicionamento conjunto. "Imagine eu pedir para o PT para votar contra? Não posso te afirmar antes, mas presumo que não será homogêneo", afirmou. Há ainda casos como o do deputado Baleia Rossi (MDB-SP), autor da PEC que hoje serve de base para a discussão e defensor ferrenho da medida.>
Há entre os apoiadores da reforma uma desconfiança de que Tarcísio está usando a pauta para se fortalecer como expoente da oposição.>
Independentemente de possíveis interesses políticos, o relator está dialogando com as bancadas e negociando ajustes no texto para tentar desarmar resistências levantadas pelos Estados, pelos municípios e por parte do setor de serviços.>
Representantes desses grupos desembarcam em Brasília nesta semana para tentar ampliar a pressão. Na tarde desta terça-feira (4), a FNP (Frente Nacional dos Prefeitos), que reúne capitais e grandes cidades, organiza um ato no Salão Verde da Câmara, por onde circulam parlamentares, membros da imprensa e representantes da sociedade.>
"É uma coincidência [o ato ser no mesmo dia dos governadores], mas se tivermos pontos de convergência vamos nos unir", afirma o presidente da FNP, Edvaldo Nogueira.>
Segundo ele, as capitais e as grandes prefeituras se opõem à extinção do ISS, imposto municipal arrecadado sobre serviços. A avaliação da FNP é que a medida fere a autonomia federativa e ainda provocará perda de arrecadação.>
"O setor serviços vai ganhar protagonismo na economia, a tendência do ISS é crescer. Querem abocanhar essa parte, e não sabemos quanto fica para nós", critica Nogueira. Segundo ele, a entidade não possui cálculos das possíveis perdas porque o governo federal ainda não calculou quais seriam as alíquotas do novo imposto.>
Na noite de terça, integrantes do chamado Codesul (Conselho de Desenvolvimento e Integração Sul (Codesul) e do Cosud (Consórcio de Integração do Sul e do Sudeste) participam de uma reunião em um hotel em Brasília para discutir os detalhes da proposta.>
Estão previstas as presenças dos governadores Cláudio Castro (RJ), Eduardo Leite (RS), Eduardo Riedel (MS), Jorginho Mello (SC), Ratinho Júnior (PR), Renato Casagrande (ES), Romeu Zema (MG), além de Tarcísio e de parlamentares desses Estados.>
Um dos temas deve ser o chamado Conselho Federativo, ao qual São Paulo se opõe de maneira ferrenha. A figura é prevista na PEC e ficaria responsável pela arrecadação do IBS (Imposto sobre Bens e Serviços), que substitui o ICMS estadual e o ISS municipal.>
O Conselho, formado por representantes de Estados e municípios, faria o recolhimento no novo imposto e o repasse das receitas devidas a cada ente da federação, já considerando a migração da cobrança para o destino — isto é, para onde ocorre o consumo de bens e serviços.>
Hoje, parte do recolhimento é feito na origem, onde ocorre a produção de bens e serviços. Estados produtores são alguns dos que mais resistem à instituição do Conselho Federativo.>
A proposta de São Paulo, encampada por outros Estados resistentes à reforma, é manter o desenho atual de cobrança descentralizada. Assim, o IBS seria recolhido no Estado produtor, com posterior repasse aos locais de consumo por meio de uma câmara de compensação.>
O governo paulista argumenta que a medida assegura maior autonomia e "controle direto do estado sobre sua fonte de receita, com operacionalização mais simples do que o processo de centralização e partilha integral da receita", conforme apresentação feita por Tarcísio a parlamentares em jantar na noite de domingo (2).>
Outros Estados e também alguns especialistas rejeitam a ideia da câmara de compensação por avaliar que ela cria problemas para os contribuintes, uma vez que haverá dúvida sobre como cobrar os créditos tributários obtidos com o pagamento do novo imposto em fases anteriores da produção.>
Além disso, Estados consumidores, beneficiados pelo princípio do destino, ficariam na mão dos locais produtores à espera do repasse dos recursos que são seus por direito.>
Em países como Canadá e Índia, que adotam o modelo de IVA (Imposto sobre Valor Agregado) dual proposto para o Brasil (com um imposto para o governo federal e outro para Estados e municípios), a cobrança é feita de forma centralizada na esfera federal. Como maior parte dos governadores e prefeitos rejeita participação da União nessa tarefa, o Conselho cumpriria esse papel.>
Segundo interlocutores, o relator da reforma ainda trabalha em um possível meio–termo para diminuir as resistências de São Paulo e evitar que o Estado, que já travou outras tentativas de mudar o sistema tributário nacional, acabe emperrando de vez as negociações.>
A aliados, o presidente da Câmara tem dito que não há "ciúme" do texto divulgado agora e que há espaço para mudanças, desde que as alternativas apresentadas "parem de pé" e não signifiquem o desembarque dos demais Estados.>
O governo de São Paulo também quer uma definição, desde já, sobre como vai ser distribuído o FDR (Fundo de Desenvolvimento Regional), cujo objetivo é garantir aos Estados instrumentos de incentivo regional. As ferramentas atuais, como redução de alíquota, base de cálculo ou concessão de créditos presumidos, não serão mais viáveis após a unificação do ICMS no IBS.>
A União já acenou com um aporte anual de R$ 40 bilhões, mas o critério de partilha desse dinheiro é alvo de controvérsia entre os estados. Governadores de regiões como Norte e Nordeste querem adotar o critério do PIB (Produto Interno Bruto) invertido, que beneficiaria locais mais pobres, mas há também outras propostas na mesa.>
Nos cálculos de São Paulo, uma média ponderada das propostas discutidas no Comsefaz (Comitê Nacional de Secretários de Fazenda) resultaria em uma fatia de apenas 3,28% para o estado — um repasse que começaria em R$ 262 milhões em 2029 e chegaria a R$ 1,3 bilhão a partir de 2033, considerando a implementação gradual do fundo.>
Um critério que leve em conta a população de cada Estado, por sua vez, elevaria os valores a R$ 1,76 bilhão em 2029 e R$ 8,8 bilhões de 2033 em diante, equivalente a 22% do fundo. Essa alternativa seria defendida pelo Rio Grande do Sul.>
Um formato intermediário, preferido por São Paulo, seria fazer a distribuição conforme o número de beneficiários de programas sociais inscritos no CadÚnico. Nesse desenho, o governo paulista receberia 14,62% do FDR, equivalentes a R$ 1,17 bilhão em 2029 e R$ 5,85 bilhões a partir de 2033.>
Em meio à investida dos setores contrários, a Fiesp (Federação das Indústrias do Estado de São Paulo) prepara uma articulação com outros setores para lançar um manifesto a favor da reforma. A avaliação da entidade é de que é importante se posicionar em defesa da proposta à medida que crescem as críticas.>
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