Publicado em 9 de outubro de 2023 às 20:48
Mesmo sem acordo entre todas as entidades e empresas de trabalhadores por aplicativo, o governo Luiz Inácio Lula da Silva (PT) prepara um projeto de lei para regulamentar as atividades das plataformas digitais.>
A proposta a que a Folha teve acesso inclui o pagamento de contribuição ao Instituto Nacional do Seguro Social (INSS), seguro de vida de R$ 40 mil e valor mínimo por hora, entre outros direitos trabalhistas e previdenciários.>
Pela minuta do projeto, prestadores de serviço de empresas como Uber, 99, iFood e Rappi poderão trabalhar como autônomos ou ser contratados por meio da CLT (Consolidação das Leis do Trabalho).>
Há ainda regras como abertura de postos de apoio —com estrutura sanitária e refeitórios, por exemplo—, transparência nas avaliações, com impedimento de as plataformas suspenderem trabalhadores, além de custeio de itens necessários para o trabalho e oferta de equipamentos de proteção.>
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As empresas deverão cadastrar e descontar a contribuição ao INSS dos trabalhadores, conforme o tipo de contrato de trabalho. Haverá ainda contribuição previdenciária dos aplicativos, também dependendo do tipo de contrato.>
A minuta, que ainda poderá ser alterada, proíbe o enquadramento da categoria como MEI (Microempreendedor Individual), que tem alíquota de 5% sobre o salário mínimo.>
O projeto de lei começou a ser elaborado no final de agosto, pela coordenadoria-geral de legislação e normas do RGPS (Regime Geral de Previdência Social), do Ministério da Previdência Social.>
Procurada, a Previdência não comentou o teor da minuta. Afirmou que integrou o grupo de trabalho para a regulamentação das plataformas digitais e confirmou que "a inclusão previdenciária desses profissionais é um dos temas em pauta".>
"Ainda não há um projeto fechado, nem uma data definida de quando será enviado ao Congresso Nacional", disse a pasta, em nota.>
O Ministério do Trabalho e Emprego, por sua vez, enviou o vídeo da sessão da qual o titular da pasta, Luiz Marinho, participou nesta segunda-feira (9), no Senado.>
A minuta traz três opções de contrato de trabalho, uma como prestador de serviços, outra como contribuinte individual e uma terceira com carteira assinada.>
No caso de quem optar por ser contribuinte individual, não há horários e dias de trabalho fixos, e o desconto da contribuição ao INSS será de 11% sobre a remuneração, conforme legislação previdenciária de 1991, que rege as regras das contribuições até hoje. A empresa também pagará sua parte.>
Para quem é CLT, as alíquotas variam de 7,5% a 14%, e são aplicadas sobre cada faixa da remuneração, além da contribuição empresarial de 20%. No entanto, aplicam-se as regras da carteira assinada, com horário de entrada e saída, e dias específicos de trabalho.>
"Se ele for contribuinte individual, ou seja, aquele que tem liberdade, que presta serviço de modo eventual, quando ele quer, como quer, onde quer, enfim, a contribuição vai ser 11%", afirma a advogada especialista em Previdência Adriane Bramante, presidente do IBDP (Instituto Brasileiro de Direito Previdenciário).>
Um grupo de trabalho debateu por 150 dias a regulamentação das atividades, mas foi encerrado no dia 12 de setembro sem um entendimento com os trabalhadores de entrega. Houve, porém, avanços com motoristas de aplicativos de passageiros.>
"Nós estamos praticamente acordados com o setor de aplicativos de transporte de pessoas; as bases estão acordadas", disse o ministro do Trabalho e Emprego, Luiz Marinho, nesta segunda, em audiência na Comissão de Direitos Humanos do Senado.>
"Com relação aos entregadores, ainda não houve acordo, não está sendo fácil, provavelmente nós teremos que remeter ao Congresso Nacional arbitrando o que vai acontecer, pois as empresas estão muito duras com relação a isso", afirmou.>
Na sexta (6), Marinho tratou sobre o impasse com o setor de duas rodas em um evento no SindPD (sindicato de processamento de dados), em São Paulo. "Sobre quatro rodas [caminha para entendimento]. Duas rodas não está dando acordo. Então, o governo vai arbitrar provavelmente.">
Na ocasião, o ministro criticou o que chamou de precarização do trabalho. "A sociedade tem de refletir se deseja um garoto, uma garota, lhe entregando a comida quentinha em minutos, se ele está sendo bem tratado, e se ele está tendo o direito de levar essa comida para sua família. Ou não importa o bem-estar?", disse.>
"Meu bem-estar pode estar sendo servido por trabalho na área da escravidão? Trabalho ultraprecário? É isso que a sociedade brasileira pensa? Não acredito", completou a uma plateia de sindicalistas, que o aplaudiu.>
A ideia da pasta é apresentar a proposta em duas semanas. Antes, o ministério pretende levar o texto para conhecimento de Lula. "Eu pedi primeiro que a gente escreva [o projeto]", disse Marinho na sexta.>
Pelas negociações, o valor mínimo a ser pago pela hora trabalhada poderá ser de R$ 17 para os motoristas de motocicleta ou bicicleta, setor chamado de duas rodas, e R$ 30 para os motoristas que transportam passageiros, o setor de quatro rodas.>
O valor não está expresso na minuta. A Folha, porém, confirmou com três fontes a par das negociações.>
A ideia é que haja uma remuneração mínima de R$ 1.320 no mês, que é o salário mínimo atual. Para isso, a jornada de trabalho seria de 176 horas levando em conta a hora do salário mínimo, de R$ 7,50.>
O problema é que os entregadores que trabalham de moto ou bicicleta exigem o pagamento da chamada hora logada, enquanto empresas defendem a hora trabalhada.>
O presidente da Amabr (Associação dos Motofretistas de Aplicativos e Autônomos do Brasil), Edgar Francisco da Silva, o Gringo, afirmou que, para ele, foram 150 dias de negociação sem resultados. Gringo representa parte dos trabalhadores do setor de duas rodas.>
"Os assuntos que a gente tratou foram remuneração, saúde, segurança, transparência e previdência. Nada avançou", disse Gringo. Segundo ele, o PL ficará a critério do governo. "Estamos esperando o governo pôr este PL para fora para ver o que é bom e o que é ruim para nós. Os R$ 17 são inaceitáveis", disse.>
"Este valor de R$ 17 por hora trabalhada não é aceito pelos trabalhadores, o certo é hora logada. Esses R$ 17 que estão sendo citados é uma proposta ridícula. No iFood, por exemplo, o entregador já ganha mais de R$ 23 a hora", afirmou.>
VEJA AS REGRAS PROPOSTAS PELO GOVERNO>
A lei a ser apresentada ao Congresso "regulamenta as formas de trabalho prestado por meio de aplicativos ou outras plataformas de comunicação em rede, estabelece mecanismos de inclusão previdenciária e outros direitos para a melhoria das condições de exercício das atividades", diz minuta do projeto.>
DEFINIÇÃO DO REGIME JURÍDICO DAS EMPRESAS>
Serão dois tipos: empresa prestadora de serviços que opera por plataforma digital, que administra e disponibiliza a oferta de serviços por aplicativos ou outras plataformas de comunicação em rede; e empresa de anúncio de serviços que opera por plataforma digital.>
COMO DEVE SER O CONTRATO DE TRABALHO>
O contrato de trabalho terá as seguintes cláusulas obrigatórias:>
ESPAÇO DE APOIO>
A empresa deverá disponibilizar acesso a espaços de apoio para os prestadores, com instalações sanitárias e lavatório, ambiente para refeições, água potável, descanso e conexão à internet, em número proporcional ao fluxo de prestadores a serem atendidos. Elas poderão, inclusive, compartilhar o mesmo espaço entre si, ofertando a seus prestadores de serviços.>
SEGURO DE VIDA E INDENIZAÇÕES>
O seguro de vida deverá ser de 30 vezes o piso do INSS, que é o salário mínimo nacional, hoje em R$ 1.320, o que dá R$ 39,6 mil. Além disso, as empresas devem indenizar alguns custos. Os percentuais são de até 60% ou até 40%, dependendo do tipo de custo, mas a minuta não define os tipos. Há ainda cláusula que prevê fornecimento de equipamentos de segurança.>
PAGAMENTO DA CONTRIBUIÇÃO PREVIDENCIÁRIA E DESCONTO DE INSS>
As empresas poderão ter três tipos de contrato com os trabalhadores: como prestador de serviço, contribuinte individual por conta própria e trabalhador contratado por CLT.>
Haverá o desconto da contribuição ao INSS por parte da empresa para o qual o trabalhador presta o serviço e também o pagamento de percentual da contribuição previdenciária do empregadores.>
Para quem for contratado por CLT, é necessário cumprir horário, mas serão garantidos direitos como 13º, férias, FGTS (Fundo de Garantia do Tempo de Serviço) e horário de intervalo, entre outros.>
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