
Conforme a norma técnica da Associação Brasileira de Normas Técnicas (ABNT NBR 13.752/96 - Perícias de Engenharia na Construção Civil, item 3.75), vícios são:
"Anomalias que afetam o desempenho de produtos ou serviços, ou os tornam inadequados aos fins a que se destinam, causando transtornos ou prejuízos materiais ao consumidor. Podem decorrer de falha de projeto ou de execução, ou ainda da informação defeituosa sobre sua utilização ou manutenção".
Por sua vez, esses vícios são divididos em categorias:
Quanto à obra
- Estruturais: oriundos da organização da execução da obra, com estrutura errada, como questão de cálculo e coluna;
- Funcional: relacionados a questões complementares à construção, sendo problemas de organização da obra afetam a moradia, como os aspectos elétrico e hidráulico;
- Estéticos: são problemas estruturais que impactam tanto as áreas comuns quanto as unidades autônomas, como a pintura malfeita, o revestimento descascando, o piso quebrado e os vazamentos em piscinas.
Quanto à percepção
- Aparentes: a visualização deles é fácil, a exemplo de vidros quebrados e pintura malfeita.
- Ocultos: eles são invisíveis no primeiro momento, mas ao longo do tempo são identificados, a exemplo de infiltrações, problemas em tubulações e questões elétricas.
A depender do vínculo jurídico travado, esses vícios serão diferenciados somente quanto ao prazo para ser requerida, judicialmente ou extrajudicialmente, a reparação do dano ou a compensação indenizatória.
Por isso, é fundamental que na compra e aluguel de imóvel novo ou usado haja a vistoria por profissional especializado da engenharia ou arquitetura para analisar os detalhes de projeto, estrutura e acabamento do imóvel. Essa vistoria vai permitir detectar problemas e ajustar de forma antecipada e até mesmo ser critério de negociação ou fechamento de negócio imobiliário.
O conceito de vícios se relaciona com o art. 12 do Código de Defesa do Consumidor (CDC), segundo o qual os profissionais envolvidos com a obra devem responder pelos defeitos dela independentemente de culpa
Art. 12. "O fabricante, o produtor, o construtor, nacional ou estrangeiro, e o importador respondem, independentemente da existência de culpa, pela reparação dos danos causados aos consumidores por defeitos decorrentes de projeto, fabricação, construção, montagem, fórmulas, manipulação, apresentação ou acondicionamento de seus produtos, bem como por informações insuficientes ou inadequadas sobre sua utilização e riscos".
Considerar o CDC como base normativa para resolver o conflito da construção civil decorre do fato de que o dono da obra é tido como consumidor e os profissionais como fornecedores.
Art. 2°. "Consumidor é toda pessoa física ou jurídica que adquire ou utiliza produto ou serviço como destinatário final".
"Parágrafo único. Equipara-se a consumidor a coletividade de pessoas, ainda que indetermináveis, que haja intervindo nas relações de consumo".
Art. 3°. "Fornecedor é toda pessoa física ou jurídica, pública ou privada, nacional ou estrangeira, bem como os entes despersonalizados, que desenvolvem atividade de produção, montagem, criação, construção, transformação, importação, exportação, distribuição ou comercialização de produtos ou prestação de serviços".
§1° "Produto é qualquer bem, móvel ou imóvel, material ou imaterial".
§2° "Serviço é qualquer atividade fornecida no mercado de consumo, mediante remuneração, inclusive as de natureza bancária, financeira, de crédito e securitária, salvo as decorrentes das relações de caráter trabalhista".
Com isso, admite-se presunção de culpa do construtor, incorporador e profissional técnico ou prestador de serviço, a partir do reconhecimento da vulnerabilidade do consumidor.
Deste modo, a empresa que fez a construção ou a incorporação, em razão da garantia e da execução da obra, e o arquiteto ou o engenheiro, por causa da elaboração do projeto e acompanhamento da execução da obra para efetivá-la, podem ser afetados por implicações legais e financeiras decorrentes dos vícios construtivos, como exposto no Código Civil:
Art. 618. "Nos contratos de empreitada de edifícios ou outras construções consideráveis, o empreiteiro de materiais e execução responderá, durante o prazo irredutível de cinco anos, pela solidez e segurança do trabalho, assim em razão dos materiais, como do solo".
Logo, há um prazo de cinco anos para que os envolvidos com a obra respondam pelos defeitos procedentes dela. Este período, destaca-se, se refere ao prazo de garantia da obra, então, se o defeito surgir durante esse intervalo de tempo, a culpa dos fornecedores será presumida por lei.
Uma vez instaurado o conflito, é preciso resolvê-lo para garantir a segurança e a qualidade das obras, o que pode ocorrer por meio de alguns caminhos:
- Notificação extrajudicial: envio de uma carta a todos os envolvidos com a obra e especialmente se relacionam com o vício para negociação ou perícia técnica.
- Mediação extrajudicial ou pré-processual: tentativa de que as partes envolvidas com os defeitos consigam solucionar o conflito sozinhas fora do judiciário ou antes do início da ação judicial.
- Ação judicial: deve ser pensada em último lugar também por causa da morosidade do Judiciário.
Na via judicial, o responsável pelo defeito da obra pode ser condenado a indenizar os consumidores pelos prejuízos causados, incluindo-se os custos de eventual reparação, a possível substituição de materiais e as compensações por danos morais quando configurados.
Um ponto de atenção é que o surgimento de vícios construtivos no período de cinco anos (art. 618 do CC) implica na possibilidade de o responsável por eles ser demandado judicialmente no prazo prescricional de 20 anos, conforme o Enunciado n° 194 do Superior Tribunal de Justiça (STJ): “Prescreve em vinte anos a ação para obter, do construtor, indenização por defeitos na obra”.
Contribui com o entendimento jurisprudencial acima o Enunciado n° 181 da III Jornada de Direito Civil, que determina que “o prazo referido no art. 618, parágrafo único, do Código Civil refere-se unicamente à garantia prevista no caput, sem prejuízo de poder o dono da obra, com base no mau cumprimento do contrato de empreitada, demandar perdas e danos”.
Nas relações de consumo, em se tratando de vícios aparentes, o prazo decadencial para reclamá-los é de noventa dias, contados a partir da entrega do imóvel, nos termos do art. 26, II, do CDC:
Art. 26. "O direito de reclamar pelos vícios aparentes ou de fácil constatação caduca em: (...)
II - "Noventa dias, tratando-se de fornecimento de serviço e de produtos duráveis".
Ao realizar a reclamação dentro do prazo, o consumidor pode exigir, à sua escolha, uma das alternativas previstas no art. 20 do CDC: (I) a reexecução dos serviços, (II) a restituição imediata da quantia paga ou (III) o abatimento proporcional do preço.
No que diz respeito aos vícios ocultos, deve-se aplicar o art. 618 do CC, acerca da garantia legal e o prazo de cinco anos para análise da existência de defeitos que demoraram a ser perceptíveis ao fim da construção.
Diante disso, o consumidor tem o prazo de noventa dias para reclamar do defeito do imóvel a partir de quando percebê-lo, dada a previsão do art. 26, §3º, do CDC, que assegura aos adquirentes a opção pela redibição (anulação de compra e venda de imóvel com defeitos ocultos) contratual (art. 445 do CC) ou pela pretensão indenizatória (obrigação de fazer ou condenação em pagar: art. 389 do CC).
Ainda que a resolução do conflito seja uma etapa de máxima importância, não existir conflito ou preveni-lo é ainda mais eficiente. Para se proteger contra defeitos na construção civil, algumas medidas devem ser adotadas:
- Contrato bem elaborado: definir de quem é a responsabilidade de cada um dos profissionais envolvidos na obra, caso ocorra algum problema.
- Seguros: algumas construções têm seguros específicos, especialmente os de questões estruturais com incorporadoras e construtoras, de financiamento.
- Inspeção e vistoria organizada: imóveis na planta de imóveis na planta e usados sendo vistoriados periodicamente por engenheiros e arquitetos para identificar possíveis vícios e cobrar solução da pessoa responsável pelo reparo dele.
Sendo assim, os fornecedores são responsáveis pela finalização da obra e pelo bom estado para habitação no imóvel, adotando boas práticas para cumprirem integralmente as cláusulas contratuais e legislação vigente sobre construção civil e para que as legítimas expectativas do dono da obra sejam atendidas.
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