Publicado em 8 de agosto de 2020 às 09:25
Com um ano de atuação, o grupo suprapartidário de congressistas batizado de Muda Senado enfrenta a primeira crise. O estopim seriam articulações paralelas do presidente da Casa, Davi Alcolumbre (DEM-AP), que busca a reeleição, além da liberação de verbas do governo federal para ações de combate à Covid-19.>
Formado por 16 congressistas de Podemos, Rede, PSDB, PSB, PSL e Cidadania, o Muda Senado sofreu uma baixa por algumas horas nesta quarta-feira (5), com a saída temporária de Marcos do Val (Podemos-ES) do grupo de WhatsApp. Após conversas com os colegas, ele pediu para voltar.>
O senador foi um dos que destinaram recursos para municípios de sua atuação por meio da portaria 1.666/20 do governo federal, que concedeu R$ 13,8 bilhões para ações de saúde.>
Segundo o líder do PSL no Senado, Major Olímpio (SP), nem todos os senadores do grupo foram procurados por articuladores do governo para fazer a destinação da verba.>
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Olímpio disse que foi sondado, mas, ao saber que nem todos seriam beneficiados, recusou. No Muda Senado, apenas Plínio Valério (PSDB-AM) e Marcos do Val receberam os recursos.>
A planilha em que os parlamentares fizeram a destinação da verba foi exposta por Olímpio. Segundo ele, o dinheiro estaria relacionado à eleição da presidência da Casa, mas não apresentou provas. Foi a partir deste documento que a crise no Muda Senado teve início.>
"É a coisa mais horrorosa do mundo. O governo falou que tinha uns R$ 30 milhões para cada um e até ensinou como fazer para pegar o recurso", disse o senador. "Logicamente é verba para a saúde sem licitação e às portas para eleição do Senado", afirmou Olímpio.>
Nos últimos meses, Alcolumbre tem tentado se firmar como a opção do presidente Jair Bolsonaro (sem partido) e se manter à frente da Casa.>
A Constituição veda a reeleição na mesma legislatura. Porém Alcolumbre trabalha com a opção de aprovar uma PEC (proposta de emenda à Constituição) que promova uma mudança para permitir a reeleição numa mesma legislatura. A alteração beneficiaria também o presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ).>
Para conseguir desengavetar a PEC, Alcolumbre precisa de votos além dos governistas. Procurado pela reportagem, o presidente da Casa não respondeu.>
O vice-líder do governo no Senado, Izalci Lucas (PSDB-DF), rechaçou qualquer relação entre os recursos para combate à Covid com o processo eleitoral na Casa. Lucas não integra o grupo Muda Senado e disse que não foi procurado pelo governo para discutir a destinação de verbas.>
Ele não soube explicar qual o critério usado para a liberação dos recursos da portaria. Ainda assim, defendeu a recondução de Alcolumbre à presidência da Casa. "Eu defendo o Davi com o maior prazer. Se ele vencer a questão regimental, tem condições de permanecer como presidente", disse.>
Do Muda Senado, Marcos do Val destinou R$ 24 milhões para atender a portaria do governo federal. Em um documento enviado à Secretaria de Saúde do Espirito Santo, no dia 14 de julho, o senador informou que o recurso já está disponível.>
Sete municípios do estado foram beneficiados. Desse valor, mais de R$ 10 milhões foram direcionados para a compra de ivermectina, azitromicina e hidroxicloroquina, drogas defendidas pelo presidente para tratamento do novo coronavírus. Os medicamentos não têm comprovação científica no combate à Covid.>
Depois, de acordo com a Secretaria, o próprio senador enviou outro ofício, destinando os valores não mais aos medicamentos sem comprovação e sim a hospitais.>
Segundo o senador, seus assessores mapearam o valor junto ao Ministério da Saúde e pediram a destinação da verba.>
Marcos do Val negou que tenha aceitado o dinheiro como garantia de que votaria em Alcolumbre para a reeleição. Ele disse que o tema nem sequer foi tratado.>
Marcos do Val (Podemos)
SenadorPor ser um dinheiro fora de emendas parlamentares, a destinação dos recursos da portaria não é vinculada ao exercício do mandato dos congressistas.>
Por ano, cada senador tem direito a propor R$ 15,9 milhões em emendas individuais. O valor que Marcos do Val direcionou pela portaria foi quase o dobro de suas emendas.>
Plínio Valério (PSDB-AM) preencheu a documentação, exatamente a que seu colega, Olímpio, tornou pública. Por meio da portaria, ele enviou R$ 10,4 milhões para 62 cidades do Acre. Segundo Valério, não houve relação com possível voto à reeleição.>
"Ninguém me procurou para vincular voto a absolutamente nada. Nem Davi nem ninguém, porque sabem que não podem fazer isso. Vou continuar aceitando recursos para os 62 municípios carentes do meu estado", disse.>
Por meio de sua assessoria, o senador disse que o contato para a liberação do recurso foi feito "com a chefia de gabinete e ele não sabia que nem todos os senadores foram procurados". Ele não disse quem do governo fez contato com sua equipe.>
Lasier Martins (Podemos-RS), outro do grupo Muda Senado, não foi procurado. Sem acesso à verba do Ministério da Saúde, ele tentou acalmar os ânimos no grupo.>
"Não há crise no Muda Senado. Houve tentativa de interferência para que alguns integrantes mudassem seu voto recebendo emendas parlamentares extras. Mas o grupo se acertou e está fechado", disse.>
O Muda Senado, que nesta quinta-feira (6) completa um ano, já manifestou que é contrário à tentativa de reeleição de Alcolumbre. Entre os parlamentares, o nome de Álvaro Dias (Podemos-PR) ganha força para a disputa.>
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