Publicado em 14 de novembro de 2020 às 19:01
O reiterado disparo de balas de borracha foi um dos principais instrumentos usados pela PM (Polícia Militar) do Amapá para tentar coibir protestos de moradores de Macapá e Santana, cidade vizinha à capital, contra o apagão de energia. A Folha identificou pelo menos cinco casos de pessoas que podem ter se ferido por disparos dos policiais. >
Depois de ser cobrada para investigar episódios de violência policial, inclusive pelo Ministério Público do estado, a Corregedoria da PM instaurou dois IPMs (inquéritos policiais militares) para apurar a conduta dos militares. Um caso ocorreu em Macapá e o outro, em Santana.>
O IPM referente ao caso da capital investiga o episódio mais grave: um adolescente de 13 anos corre o risco de perder a visão de um dos olhos depois de, conforme a família, ser atingido por uma bala de borracha no globo ocular.>
A Corregedoria da PM, como primeiro passo da investigação, determinou um levantamento de todos os carros oficiais enviados para coibir o protesto onde estava o adolescente, na rua 7 do Bairro de Congós.>
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A manifestação ocorreu no último dia 6, três dias depois do incêndio do transformador na subestação de Macapá. Foi isto que provocou o apagão.>
As áreas de ressaca de Congós são as que mais sofrem com a falta de energia. Nessas áreas, as casas de madeira avançam sobre regiões alagadas, instaladas ao lado de pontes precárias, que são continuações de ruas aterradas.>
A família do adolescente tem comércio na rua onde ocorria o protesto. O pai dá assistência em celulares e a mãe tem um depósito de água. Moradores queimavam pneus e exigiam a volta da energia. Os policiais chegaram disparando balas de borracha.>
"As pessoas saíram correndo e eu o perdi. Depois o encontrei dentro de um carro, com o rosto ensanguentado", diz Edilene dos Santos, mãe do adolescente. "Pedi socorro aos policiais. Eles se negaram, entraram na viatura e foram embora.">
No hospital, Santos afirma ter ouvido dos médicos: "Graças a Deus que foi uma bala de borracha. Se fosse um tiro de verdade, tinham matado ele.">
Manifestantes contaram ter visto pelo menos três carros da Rotam (Companhia de Rondas Ostensivas Táticas Motorizadas). A Corregedoria tenta identificar esses carros.>
No mesmo protesto, pelo menos mais três pessoas se feriram. Todas por bala de borracha, segundo elas.>
Uma delas é o professor Fausto Suzuki, 40. Ele mora num residencial vizinho a Congós e participava do protesto no bairro, segundo ele. Levou dois tiros de bala de borracha no braço direito, conforme o professor. O braço ainda tem os curativos feitos. "Os disparos foram feitos pela polícia", diz.>
Os outros casos de pessoas feridas no protesto em Congós não são investigados pela Corregedoria da PM. Um segundo IPM apura um caso em Santana, cidade fortemente impactada pelo apagão e com diversos protestos desde o dia 3. A Corregedoria, porém, não dá detalhes sobre o caso. Diz apenas que foi provocada pela Polícia Civil.>
A PM registra mais de 80 protestos no Amapá desde o início do apagão, uma média de oito protestos por dia. A maioria desses atos ocorre em Macapá e Santana. São frequentes os relatos de violência policial.>
O MP do estado também abriu um procedimento de investigação para apurar responsabilidades no caso do adolescente de Congós. Não há outros procedimentos em curso, segundo a assessoria de imprensa do MP.>
"A Corregedoria da PM é quem encaminha ao MP as denúncias para abertura de investigação. Além disso, o MP pode instaurar esses procedimentos a partir de denúncias da imprensa", diz a assessoria do órgão.>
À Folha, o corregedor-geral da PM do Amapá, coronel Edilelson Batista, afirmou que, caso outros casos cheguem a seu conhecimento, serão investigados. "Ainda não há ciência oficial para esses outros casos", disse.>
No caso do adolescente, existe a dúvida se o disparo da bala de borracha partiu da PM ou de outro órgão de segurança, segundo Batista. O coronel não disse a que órgão se referia.>
O corregedor-geral não soube dizer quantas balas de borracha foram usadas nos protestos. "Antes de qualquer ação mais dura, mais firme, existe a negociação. Se não resolver, aí sim há a desobstrução.">
O coronel reconheceu que pode ter havido "excessos", mas afirmou que é preciso investigar para averiguar se os ferimentos por bala de borracha foram, na verdade, "fatídicos".>
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