Publicado em 19 de agosto de 2020 às 14:51
A produtividade da Justiça do Trabalho despencou com a pandemia da Covid-19. O número de julgamentos - fase de solução do processo - caiu 60,1% no segundo trimestre de 2020 em relação ao mesmo período de 2019. >
Ao mesmo tempo, a inconstância na realização de audiências na fase inicial - logo após ajuizada a ação - chama a atenção. A Corregedoria-Geral da Justiça do Trabalho cobra de três TRTs (Tribunais Regionais do Trabalho) mais atividades por vídeo.>
De abril a junho, 237,5 mil processos receberam sentenças de juízes, segundo o TST (Tribunal Superior do Trabalho). Nos mesmos meses do ano passado, foram 595,2 mil.>
O ritmo também desacelerou entre desembargadores. Na segunda instância, a queda foi de 22% de abril a junho de 2020 ante o mesmo período do ano passado. Em 2019, foram 298,2 mil decisões, e, agora, 232,6 mil.>
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A presidente da Anamatra (Associação Nacional dos Magistrados da Justiça do Trabalho), Noemia Porto, diz que os dados pedem cautela.>
"O juiz não pode ser analisado na perspectiva de número nem a Justiça, porque não são máquinas. [O termo produtividade é usado] com muitas críticas nossas, a propósito", diz. O termo produtividade é usado pela própria Justiça.>
Segundo Porto, a pandemia colocou magistrados diante de novos desafios. Ela afirma que neste momento processos coletivos têm prioridade de julgamento.>
"Não são [ações] de simples solução. Uma coisa é produzir uma sentença trivial, do seu dia a dia. Esse tipo de processo da pandemia, com necessidade de resposta rápida, requer envolvimento do juiz de modo diferenciado", diz.>
Em nota, a Corregedoria-Geral da Justiça do Trabalho, comandada pelo ministro Aloysio Corrêa da Veiga, afirma que a produtividade "foi bastante satisfatória no período de pandemia".>
"A Justiça do Trabalho tem se destacado pela pronta atuação em situações de urgência envolvendo demandas relacionadas à Covid-19.">
Os prazos de ações já em andamento - à espera de julgamento, por exemplo - foram suspensos no meio de março e retomados em 4 de maio. As atividades voltaram de modo gradual. O TST preparou um protocolo para as atividades presenciais, sem previsão de início.>
Longe dos fóruns, magistrados discutem as demandas pela tela do computador, no conhecido home office.>
Segundo a corregedoria, as audiências de instrução, para produção de provas que se dão no início da ação, foram retomadas em 25 de maio, "situação que tem direta relação com a prolação de sentença [quando a decisão é tomada]".>
A pandemia fez outro indicador subir: o de ações pendentes de julgamento. O estoque de processos, que já chegou a 1,8 milhão em 2017, estava em queda.>
Desde julho de 2019, o montante estava abaixo de 1 milhão. Agora, superou a marca. Um processo, do ajuizamento até a sentença, leva em média 240 dias, segundo o TST.>
Mas, enquanto julgam menos, os magistrados também receberam menor volume de processos. No segundo trimestre, a redução foi de 30,6%.>
De abril a junho deste ano, chegaram aos juízes de primeira instância 337,1 mil ações. No ano passado, no mesmo período, foram 485,8 mil.>
"A queda se deu em virtude do próprio isolamento e restrições impostas pela pandemia", afirma a corregedoria do TST. "A conclusão de que a produtividade foi baixa no período é equivocada se não considerarmos essas circunstâncias.">
Na contramão das instâncias inferiores, o TST apresentou maior produtividade. A corte julgou 3,4% mais processos no segundo trimestre deste ano em relação ao mesmo período de 2019. Foram 103,4 mil ante 100 mil.>
Apesar de elogiar o desempenho dos colegas, Veiga já cobra resultados de juízes e desembargadores em teletrabalho. Até o momento, magistrados dos TRTs de Sergipe, Bahia e Rio de Janeiro entraram na mira do corregedor-geral.>
As cortes são questionadas por haver registro da não realização de audiências por vídeo. Segundo a Corregedoria-Geral, Veiga encaminhou ofícios para que realizem "imediatamente audiências telepresenciais em fase de conhecimento, iniciais e instrução".>
Quando uma reclamação é apresentada, essas audiências são a primeira etapa do processo. Na inicial, pode-se, por exemplo, fechar um acordo. Na instrução, são colhidas provas, como as testemunhais.>
"Não há notícia de nenhum tribunal que não esteja realizando audiências telepresenciais. O que se apurou, tomando por exemplo o TRT-20 [Sergipe], o TRT-1 [Rio de Janeiro] e o TRT-5 [Bahia], foi que alguns juízes não estariam realizando audiências", diz o órgão.>
A Corregedoria-Geral não informa o número de magistrados que não promovem as audiências. O órgão diz atuar com o apoio das corregedorias regionais.>
No caso de Sergipe, Veiga deu prazo de 20 dias para que um plano seja apresentado. O descumprimento pode implicar advertência, censura e até aposentadoria compulsória.>
Porto, da Anamatra, critica as medidas. "As pautas de audiência são de organização dos magistrados", afirma.>
Segundo ela, as audiências de instrução, principalmente por envolver provas, enfrentam resistência de advogados. "Não existe resistência em audiência de conciliação, por exemplo", diz.>
Fabio Gaspar, presidente do Sasp (Sindicato dos Advogados do Estado de São Paulo), discorda. "Não há resistência, mas posicionamento. Somos contra a audiência de instrução, de oitiva das partes e das testemunhas, por vídeo", diz.>
A Corregedoria-Geral, por sua vez, afirma que a audiência telepresencial é regra. As exceções devem ser analisadas pontualmente, e o juiz pode, com decisão fundamentada, suspender a videoconferência.>
Procurado, o TRT de Sergipe não quis se manifestar.>
O TRT do Rio de Janeiro, em nota, afirma que tomou conhecimento do ofício do TST. A corte diz que "serão tomadas as providências necessárias" para garantir a continuidade das atividades.>
"A corregedoria esclarece que, desde o início da suspensão das atividades presenciais em decorrência da pandemia, vem atuando para assegurar que a prestação jurisdicional ocorra de forma ininterrupta.">
A Presidência do TRT da Bahia, também em nota, afirma que ainda não foi informada das medidas do TST. O tribunal diz adotar "todos os esforços para munir magistrados e servidores de equipamentos e capacitação necessários".>
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