Publicado em 2 de maio de 2023 às 11:21
O fim de semana marcou um acirramento nos conflitos dentro da Terra Indígena Yanomami, em Roraima, três meses após o início da operação do governo federal a fim de acabar com o garimpo ilegal e retirar 20 mil invasores da região.>
No domingo (30), quatro homens foram mortos num suposto confronto com agentes da PRF (Polícia Rodoviária Federal) e do Ibama durante uma ação de repressão ao garimpo ilegal. No dia anterior, um indígena foi assassinado e outros dois baleados em ataque atribuído a invasores que permanecem na região.>
Os tiroteios ocorreram após três meses de operação que resultou, segundo o Ministério do Meio Ambiente, na destruição de 327 acampamentos de garimpeiros, 18 aviões, dois helicópteros, centenas de motores e dezenas de balsas, barcos e tratores. O ataque de domingo foi o quarto desde o início das ações, segundo a pasta.>
A ação de combate ao garimpo ilegal, porém, vem apresentando limitações reconhecidas por integrantes do próprio governo federal. Ao comentar o ataque de sábado, a ministra dos Povos Indígenas, Sônia Guajajara, reconheceu que "ainda faltam muitas ações coordenadas até a retirada de todos os invasores do território".>
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A persistência nas ameaças aos yanomamis foi tema de nota conjunta da Hutukara Associação Yanomami (HAY) e Texoli Associação Ninam Estado de Roraima (Taner), entidades que atuam na região.>
"Mesmo depois de três meses de ações [do governo federal], o povo da Terra Yanomami ainda sofre com surtos de doenças como malária, ataques e mais mortes por parte dos invasores que insistem em continuar explorando e devastando o nosso território sagrado e derramando o sangue dos nossos parentes", afirma a nota, assinada por Dario Kopenawa, vice-presidente da HAY, e Gerson Xiriana, presidente da Taner.>
Guajajara e as ministras Marina Silva (Meio Ambiente) e Nísia Trindade (Saúde) foram a Roraima após o ataque que resultou na morte do agente de saúde Ilson Xirixana, 36, que trabalhava no Distrito Sanitário Indígena Yanomami.>
Marina afirmou que as ações do governo entram numa terceira fase, intensificando as ações de inteligência para rastrear as redes de apoio ao garimpeiros que permanecem no território, bem como a repressão ostensiva, como a que culminou com quatro mortes neste domingo.>
"O governo brasileiro não vai recuar face à criminalidade. As ações vão ser reforçadas. Tem uma parte [dos garimpeiros] que está resistindo violentamente. Obviamente é preciso que haja uma ação cada vez mais intensa para poder dar a resposta", disse a ministra do Meio Ambiente.>
Guajajara afirmou que os garimpeiros que se mantém na terra indígena buscam provocar conflitos. "Nossa preocupação é que tudo aconteça da forma mais pacífica possível. A gente não está de forma alguma incentivando esses conflitos. A gente quer amenizar essa situação. Não queremos derramamento de sangue.">
O secretário nacional de Segurança Pública, Tadeu Alencar, afirmou que o governo não vai "ceder um milímetro no enfrentamento àqueles que desafiam a autoridade".>
Em 20 de janeiro deste ano, o governo de Luiz Inácio Lula da Silva (PT) declarou estado de emergência em saúde pública na terra indígena. A crise sanitária e de saúde na maior terra indígena do Brasil está associada ao avanço do garimpo ilegal de ouro e cassiterita, aceito e estimulado pelo governo do ex-presidente Jair Bolsonaro (2019-2022).>
Parte dos garimpeiros ilegais deixaram espontaneamente a terra indígena após o início das ações do governo. Mais de 20 mil invasores ocupavam o território, inclusive regiões antes intocadas, próximas à fronteira com a Venezuela.>
Em fevereiro, foi iniciada a operação da Polícia Federal e das Forças Armadas para desmobilizar a estrutura ilegal ainda existente na região. No início de abril, houve um endurecimento por parte do governo ao fechar completamente o espaço aéreo sobre a terra indígena -antes, ele estava apenas parcialmente bloqueado, com a criação de um corredor para que os garimpeiros pudessem deixar a área.>
Na terça-feira (25), a Polícia Federal deflagrou uma operação contra um grupo suspeito de intermediar a compra de ouro extraído ilegalmente da área. O inquérito aponta que a suposta organização criminosa movimentou mais de R$ 30 milhões em quatro anos.>
As autoridades federais declararam ver indícios de envolvimento de facções criminosas no suporte aos invasores que continuam na terra indígena após três meses de operação.>
"A insistência em permanecer, mesmo com todos os esforços de convencimento para a saída pacífica, é uma demonstração de que existem forças muito poderosas economicamente por trás dessa ação criminosa. Porque o garimpeiro pobre, não consegue fretar uma aeronave, não tem um barco com motor potente, abastecimento de comida", disse Marina.>
De acordo com o Ministério do Meio Ambiente, os quatro supostos garimpeiros ilegais mortos na ação da PRF e do Ibama atacaram os servidores federais quando desembarcavam para fiscalizar uma área de exploração ilegal dentro da terra indígena.>
"O ataque, ocorrido na região de Uiaiacás, é investigado pela Polícia Federal. Há indícios de que uma facção criminosa controla o garimpo em que houve o confronto", afirmou a pasta, em nota.>
De acordo com a PRF, foram apreendidos um fuzil, três pistolas sete espingardas, entre outros materiais para confronto (munições, carregadores, coldre, por exemplo).>
"O ataque ocorreu durante tentativa de desembarque da aeronave PRF, quando criminosos, munidos de armamento de grosso calibre, atiraram contra os agentes no intuito de repelir a atividade de repressão ao garimpo ilegal. Os policiais revidaram e atingiram quatro atiradores, que não resistiram aos ferimentos", afirmou a corporação, e nota.>
Segundo o ministério, esse é o quarto ataque contra servidores do Ibama desde o início da operação para expulsão dos garimpeiros, em fevereiro. A PRF fez relato semelhante. "Recente histórico aponta para ocorrências em outros acampamentos clandestinos, como nas comunidades Maikohipi e Palimiú, sempre na tentativa de inibir o trabalho de desintrusão das terras demarcadas.">
Um dia antes da operação, três indígenas foram baleados num ataque à comunidade Uxiu, na região do Alto Mucajaí.>
De acordo com a nota conjunta emitida pela HAY e Taner, entidades indígenas da região, o atentado ocorreu durante uma cerimônia fúnebre às margens do rio Mucajaí. Seis garimpeiros num barco dispararam em direção ao grupo que participava do ritual, atingido Ilson Xirixana na cabeça.>
Segundo o relato, os indígenas então iniciaram uma perseguição a barco contra os garimpeiros. Os invasores, afirmam as associações, fizeram novos disparos e atingiram outros dois indígenas, que permanecem internados.>
As entidades afirmam que estavam no barco dois garimpeiros "conhecidos dos agentes públicos da Funai e Ibama". De acordo com as duas organizações, o barco da dupla tinha autorização para acessar a terra indígena para viabilizar a retirada de invasores ilegais.>
"Só que a autorização do barco venceu em 06 abril quando o espaço aéreo também foi fechado para aviões não autorizados na Terra Yanomami e mesmo assim eles continuam transitando dentro do território", afirmam as duas entidades, em nota.>
As associações declaram também que liderança da comunidade Uxiu se organizam para atacar barcos de garimpeiros que passarem próximos às margens do rio Mucajaí. "Isso significa que pode ocorrer a qualquer momento mais uma tragédia naquela região.">
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