Publicado em 23 de dezembro de 2019 às 09:41
Quatro meses após o registro das primeiras manchas de óleo nas praias da região, o Nordeste enfrenta uma situação de dupla poluição em parte do seu litoral com a presença de microrganismos e substâncias químicas consideradas prejudiciais à saúde humana.>
De um lado, a baixa cobertura de saneamento e o descarte irregular de esgoto faz com que um terço das praias da região sejam consideradas ruins ou péssimas em balneabilidade, análise que leva em conta a presença de bactérias presentes nas fezes humanas e de animais.>
De outro, mesmo após a estabilização da chegada de novas manchas no litoral, praias da região ainda convivem com o óleo que ficou incrustado na areia, nas pedras e nos recifes de coral.>
Um grupo formado pela Marinha, pela ANP (Agência Nacional de Petróleo) e pelo Ibama informa que o cenário é estável, mas ainda há vestígios esparsos de manchas nos estados de Alagoas, Sergipe e Bahia. Ao todo, já foram retiradas de cerca de 5.000 toneladas de óleo dos 11 estados atingidos (todos os nove do Nordeste mais Espírito Santo e Rio de Janeiro). >
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Na Bahia, por exemplo, ainda há óleo em praias de Cumuruxatiba, no extremo sul do estado, e em Subaúma, balneário do litoral norte.>
Na paradisíaca Japaratinga, uma das praias mais visitadas de Alagoas, homens d a Marinha ainda limpam a fina areia branca para retirar fragmentos de petróleo. A praia está localizada na APA (Área de Proteção Ambiental) Costa dos Corais, a maior unidade de conservação federal costeira do Brasil.>
O desastre ambiental do derramamento de óleo não mudou a dinâmica de monitoramento das praias. Em geral, os órgãos ambientais de governos e prefeituras fazem apenas uma análise biológica das águas.>
Órgãos ambientais como os da Bahia e de Pernambuco realizaram análises químicas pontuais para verificar o teor de substâncias derivadas do petróleo como benzeno, tolueno e xileno, consideradas prejudiciais à saúde humana.>
Testes laboratoriais encomendados pelo governo de Pernambuco mostraram que não havia compostos orgânicos do petróleo nas 16 praias que foram atingidas com maior intensidade pelas manchas.>
O Inema, órgão ambiental da Bahia, constatou ausência de substâncias tóxicas na água. Ainda assim, o órgão recomendou aos banhistas que evitem o banho de mar ao observarem presença de óleo nas praias.>
Diretor do Instituto de Biologia da UFBA (Universidade Federal da Bahia), o professor Francisco Kelmo, considera que os resultados das análises são insuficientes para garantir que as praias estejam próprias para banho.>
Ele lembra que, mesmo em menor quantidade, as manchas têm voltado a aparecer em algumas praias. Em outras, pode haver ainda pelotas de óleo enterradas sob a areia ou grudadas nas pedras.>
"Essa novela não acabou. A situação ainda é preocupante e o mais seguro é aguardar alguns meses até que seja feita a remoção completa do óleo nas praias", afirma o professor, lembrando que o contato do óleo com a pele pode gerar dermatites, enjoos e vômitos.>
Em relação à análise biológica das águas, levantamento do jornal Folha de S.Paulo revela que, dos 435 praias em que houve análise de balneabilidade no Nordeste, 35,4% foram consideradas boas por estarem próprias durante todo o ano.>
Outros 28,3% das praias estavam regulares, 12,4% ruins e 23,9% péssimas. A maior parte das praias ruins e péssimas está concentrada em capitais como Salvador, Recife, Fortaleza e São Luís. >
No Ceará, praias turísticas como Jericoacoara e Canoa Quebrada conseguiram manter-se como boas. Do total de 66 praias monitoradas, apenas 13,5% das são enquadradas como péssimas --todas estão em Fortaleza.>
No litoral baiano, as praias consideradas boas estão concentradas no norte e no sul do estado. Cerca de 35% são consideradas péssimas, com destaque para Salvador e Ilhéus.>
Em Alagoas, na badalada praia de Maragogi, a poluição de alguns trechos se junta às consequências do derramamento de óleo, que também atingiu a região.>
Os efeitos do óleo são sentidos no baixo movimento de restaurantes na beira da praia e na reclamação de pescadores e jangadeiros que levam turistas para as piscinas naturais.>
"A praia está limpa, mas o povo ficou com muito medo. Um sol bonito, o mar lindo, com um verde impressionante, e o movimento não é nem a metade para esta época do ano", reclama Renato Maciel, agente de passeios turísticos em Maragogi.>
Dos dez pontos com análise de balneabilidade, há dois locais classificados como péssimos que ficam na foz dos rios Salgado e Persinunga.>
Em Pernambuco, a turística praia de Carneiros, no litoral sul, é classificada como ruim. O mesmo ocorreu com a praia de Porto de Galinhas, uma das mais famosas de Pernambuco.>
"Sempre falam sobre esse problema do esgoto, mas tomo banho aqui faz muito tempo. O sal daqui cura tudo", brinca o ambulante José Farias Santos.>
Das 50 praias monitoradas em Pernambuco, não existe uma sequer que atingiu a classificação boa. Do total, 58% das praias são classificadas como péssimas, o que significa que elas estiveram impróprias em mais da metade do ano.>
O biólogo da UPE (Universidade de Pernambuco) Clemente Coelho Junior diz que o resultado não é surpresa e que o saldo ruim é resultado da falta de tratamento de esgoto por várias décadas.>
Ele afirma que grande parte dos efluentes domésticos é lançada nos rios e, consequentemente, atinge vários canais que os ligam às praias: "Comparado a países europeus, temos saneamento básico do século 19", afirma.>
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