Publicado em 6 de fevereiro de 2020 às 10:59
No primeiro caso concreto da atual legislatura de análise de suspeita de corrupção contra um de seus membros, o plenário da Câmara dos Deputados anulou nesta quarta-feira (5) a decisão do STF (Supremo Tribunal Federal) que afastou do mandato o deputado federal Wilson Santiago (PTB-PB).>
O atual Congresso foi eleito, majoritariamente, por uma onda que tinha entre suas principais bandeiras a do combate implacável à corrupção.>
O placar mostrou apenas 170 votos favoráveis à decisão do STF --eram necessários ao menos 257-- e 233 contrários, em consonância com o relatório do deputado Marcelo Ramos (PL-AM). Houve 7 abstenções e 102 ausências, que contaram, na prática, a favor de Santiago.>
A decisão sobre manter ou não o afastamento do petebista foi precedida de uma longa reunião entre o presidente da Casa, Rodrigo Maia (DEM-RJ), parlamentares do centrão e a área técnica.>
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A posição de que eram necessários pelo menos 257 dos 513 votos para a manutenção do afastamento foi anunciada por Maia no plenário, após a reunião. Ele submeteu a voto o seu entendimento, que foi mantido por 407 votos contra 5.>
O presidente da Câmara chegou a ameaçar adiar a votação em razão dos ausentes, mas acabou voltando atrás.>
Na tentativa de amenizar o desgaste da decisão, deputados decidiram apoiar o envio de uma representação contra o petebista ao Conselho de Ética da Câmara.>
Diferentemente da decisão do STF, porém, um processo no Conselho de Ética pode durar meses e, em caso de condenação, não resulta necessariamente na cassação. A palavra final cabe, sempre, ao plenário da Casa.>
"A manutenção do afastamento por uma decisão cautelar representaria uma verdadeira cassação prévia de mandato, algo que contraria a Constituição, que exige prévia condenação criminal transitada em julgado", afirmou Marcelo Ramos. Ele foi escolhido relator após a reunião de Maia e o centrão, em substituição a Fábio Trad (PSD-MS), que era favorável à decisão do STF.>
Ramos sugeriu em seu voto que seja aberto o processo de cassação contra o petebista no Conselho de Ética, o que pode ser feito pela Mesa da Câmara. >
Santiago foi afastado do mandato no final de dezembro de 2019 em decisão do ministro Celso de Mello, decano do STF, sob o argumento de que a sua manutenção no cargo representava ameaça às investigações.>
O parlamentar é acusado pelo Ministério Público de desviar verbas de obras contra a seca no sertão da Paraíba. Contra ele há, entre outros pontos, vídeos gravados pela Polícia Federal indicando a suspeita de que propina foi entregue em seu gabinete e em seu apartamento.>
Durante busca em sua residência em João Pessoa, a Polícia Federal encontrou um aparelho celular escondido em uma caixa de remédio, dentro de um frigobar.>
Apesar do temor do desgaste que a decisão pode provocar na opinião pública, houve um movimento liderado pelos partidos do centrão (PP, PTB, SD, entre outros) para livrar Santiago sob o argumento de que não há amparo legal no afastamento de um parlamentar por uma decisão monocrática de um juiz, feita de forma cautelar, sem que haja condenação.>
A medida foi apoiada inclusive por integrantes da oposição.>
"É uma verdadeira carta branca que está a se dar a todos os juízes, de todas as instâncias, para caçar mandato parlamentar", discursou no plenário o advogado de defesa de Santiago, Luís Henrique Machado, o mesmo que defendeu Renan Calheiros (MDB-AL) na época em que houve uma ameaça de afastamento do então presidente do Senado por parte do STF. >
Mesmo afastado, Santiago estava no plenário da Câmara. Ele não quis discursar durante a sessão. >
Nos bastidores, o temor de vários deputados era o de que a manutenção do afastamento abriria um precedente que colocaria em risco outros parlamentares também com problemas na Justiça.>
Decisões do Supremo Tribunal Federal de afastar parlamentares do mandato são controversas, mas, hoje, há o entendimento na corte de que a palavra final cabe ao plenário da Câmara ou do Senado.>
A polêmica se tornou uma discussão prática em maio de 2016, quando o ministro Teori Zavascki afastou do mandato o então presidente da Câmara, Eduardo Cunha (MDB-RJ).>
A decisão foi referendada no mesmo dia, de forma unânime, pelo plenário do STF.>
O próprio Teori registrou que sua sentença era "excepcionalíssima". Críticos apontaram para o risco de violação ao princípio constitucional da separação dos Poderes. >
A Câmara não se insurgiu, à época, e Cunha foi efetivamente afastado e teve, posteriormente, o mandato cassado pelos colegas. Ele acabou preso em decorrência das investigações da Lava Jato, situação em que se encontra até hoje.>
Já no final de 2016 foi a vez de o ministro Marco Aurélio Mello determinar o afastamento do senador Renan Calheiros (MDB-AL) da presidência do Senado.>
Marco Aurélio argumentou ter tomado a decisão com base no entendimento da maioria dos ministros da corte de que réus em ações penais não podem ocupar cargo na linha sucessória da Presidência --Renan havia se tornado réu uma semana antes.>
O Senado não cumpriu a determinação de Marco Aurélio e recorreu ao plenário do STF, que manteve Renan no cargo por 6 votos a 3.>
No ano seguinte foi a vez de o senador Aécio Neves (PSDB-MG), acusado de receber vantagem indevida da JBS e tentar atrapalhar as investigações, ser afastado do mandato por decisão da Primeira Turma do STF.>
Na ocasião, em meio à ameaça de uma crise institucional, a corte deliberou, porém, que caberia ao Congresso a palavra final sobre a suspensão do mandato de parlamentares pelo Judiciário.>
Com isso, o plenário do Senado derrubou por 44 votos a 26 a decisão do Supremo e restabeleceu o mandato do tucano.>
O deputado federal Wilson Santiago (PTB-PB) é acusado pelo Ministério Público de desviar verbas da construção da Adutora Capivara, em Uiraúna, sertão da Paraíba, no valor de R$ 24,8 milhões. >
Além de Santiago, o prefeito de Uiraúna, João Bosco Nonato Fernandes (PSDB), flagrado escondendo maços de dinheiro na cueca, e mais cinco pessoas.>
A investigação indica que houve acordo para que 10% do total da obra fosse devolvido ao parlamentar e 5% ao prefeito. O deputado teria ficado até o momento com R$ 1,2 milhão em propina. >
Há vídeos feitos pela Polícia Federal mostrando que propina teria sido entregue no gabinete do parlamentar, na Câmara, e em seu apartamento em Brasília.>
Peculato, lavagem de dinheiro, fraude licitatória e formação de organização criminosa, cujas penas, somadas, ultrapassam 20 anos de reclusão.>
Em dezembro, o ministro Celso de Mello decidiu afastar Santiago, argumentando que o congressista havia colocado seu mandato "a serviço de uma agenda criminosa". Ele cita decisão do colega Teori Zavascki, morto janeiro de 2017. No ano anterior, ele havia julgado compatível com a ordem constitucional a possibilidade de o STF decretar a suspensão de mandato de membro do Congresso Nacional.>
Em maio de 2016, o ministro Teori Zavascki afastou do mandato o então presidente da Câmara, Eduardo Cunha (MDB-RJ). A Câmara não se insurgiu, à época, e Cunha teve, posteriormente, o mandato cassado pelos colegas. Ele acabou preso em decorrência das investigações da Lava Jato, situação em que se encontra até hoje.>
Em dezembro de 2016, o ministro Marco Aurélio Mello determina o afastamento do senador Renan Calheiros (MDB-AL) da presidência do Senado sob o argumento de que réus em ações penais não podem ocupar cargo na linha sucessória da Presidência -Renan havia se tornado réu uma semana antes. O Senado não cumpriu a determinação de Marco Aurélio e recorreu ao plenário do STF, que manteve Renan no cargo por 6 votos a 3.>
Em setembro de 2017, o senador Aécio Neves (PSDB-MG), acusado de receber vantagem indevida da JBS, é afastado do mandato por decisão da Primeira Turma do STF. Na ocasião, em meio à ameaça de uma crise institucional, a corte deliberou, porém, que caberia ao Congresso a palavra final sobre a suspensão do mandato de parlamentares pelo Judiciário. Com isso, o plenário do Senado derrubou por 44 votos a 26 a decisão do Supremo e restabeleceu o mandato.>
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