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É advogada e vereadora na cidade de Vitória

Gravidez na adolescência: políticas públicas de prevenção não podem esperar

Uma das ações urgentes que precisam ser tomadas é a educação sexual, é falar em prevenção e em formas de proteção nas escolas, de forma comprometida, com profissionais capacitados. A demagogia não pode servir como política pública

  • Karla Coser É advogada e vereadora na cidade de Vitória
Publicado em 03/02/2022 às 14h33
Gravidez na adolescência
Gravidez na adolescência. Crédito: Divulgação

Teve início em 1º de fevereiro a Semana Nacional de Prevenção da Gravidez na Adolescência, criada em 2019. Essas semanas de campanhas são fundamentais para que seja aumentado o foco da atenção para determinados problemas, com debates na sociedade e com possibilidade de resolução das questões de forma mais célere.

A Semana Nacional foi criada pelo atual governo federal, mas é sabido que não basta criar uma semana de conscientização se a política pública pensada e defendida pela gestão é a de combater a gravidez precoce e as doenças sexualmente transmissíveis unicamente orientando os jovens a não fazerem sexo. O discurso veiculado é único: abstinência como política pública.

De janeiro a abril de 2021, a Secretária Estadual de Saúde recebeu 519 notificações de crianças que sofreram abuso sexual. E dessas, 450 foram só de meninas, o que nos mostra que o alvo das violências sexuais tem um gênero bem definido. Só no ano passado o Espírito Santo registrou 6.149 partos de meninas entre 10 e 19 anos. Ou seja, mais de 6 mil meninas tiveram sua infância e adolescência interrompidas por uma gravidez que poderá gerar consequências psicológicas, sociais e econômicas para elas, para os filhos, para a família e para toda a sociedade.

Porém, é uma pena que a gente esteja presenciando retrocessos maquiados de cuidado e proteção por parte de pequena – mas sempre barulhenta – parcela da sociedade que se julga a única capaz de defender “a moral e os bons costumes”. E nesse contexto é que vemos surgir como política pública na cidade de Vitória  um projeto nitidamente privado denominado “Eu Escolhi Esperar”.

Se temos elevados dados de gravidez na adolescência, não adianta falar "basta você escolher esperar que não vai engravidar". Isso é uma utopia. São muitos fatores que levam à gravidez na adolescência. Algumas meninas – por razões diversas - desejam engravidar, outras são engravidadas ao serem estupradas, outras não têm informações básicas porque não podem discutir abertamente sobre as descobertas, os seus direitos e as consequências das relações e de uma possível gravidez na adolescência.

É importante destacar também que projetos como esse do “Eu Escolhi Esperar” que pregam a abstinência sexual como forma de prevenção da gravidez na adolescência, quando tratados como políticas públicas, reverberam negativamente no objetivo de reduzir os índices, porque os adolescentes param de procurar ajuda quando têm alguma dúvida ou mesmo se sentem culpados e deixam, muitas vezes, de se prevenir. Não falar não faz com o que o problema pare de existir; pelo contrário!

Gravidez na infância e adolescência é um problema de saúde pública. Gravidez decorrente de abuso sexual é um problema de toda a sociedade, devendo ser resguardada a integridade física e psicológica dessas crianças e adolescentes. A atenção do poder público deve ser em várias áreas: saúde, educação, assistência social. E quando a gente fala de questões públicas, falamos de necessidade de construção e reforço de políticas públicas efetivas para que os direitos dessas adolescentes sejam resguardados.

Uma das ações urgentes que precisam ser tomadas é a educação sexual, é falar em prevenção e em formas de proteção nas escolas, de forma comprometida, com profissionais capacitados, para que todas essas vidas que são violentadas diariamente possam buscar ajuda. Não há possibilidade de deixarmos somente no âmbito da família a busca por ajuda, pois, repito, 85% dos agressores sexuais são conhecidos da vítima, ou seja, vizinhos, parentes, amigos da família. E muitos deles vão se tornar os pais dessas crianças geradas por outras crianças.

A demagogia não pode servir como política pública. Sejamos responsáveis ao tratar de temas tão sérios. Precisamos defender, de verdade, as nossas meninas!

Este texto não traduz, necessariamente, a opinião de A Gazeta.

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