Publicado em 27 de novembro de 2020 às 17:15
Nem todos choraram a morte de Diego Armando Maradona na Argentina.>
Muitos viram no relaxamento das regras de combate à pandemia de Covid-19 para o multitudinário evento de despedida ao ex-jogador organizado por um governo que considera reuniões com mais de 10 pessoas imoralidade e contravenção penal uma imensa hipocrisia. Também consideram a politização da cerimônia algo recriminável.>
"Com que cara o governo vai justificar, amanhã, que as escolas não podem abrir, quando vimos crianças amassadas na fila para ver Maradona sem que nenhum policial interviesse? Com que autoridade o governo vai dizer que não podemos nos reunir com nossa família no Natal, enquanto permitiu que um milhão de pessoas se aglomerasse sem distanciamento no meio da pandemia?", questiona o analista político Osvaldo Bazán.>
Segundo as atuais regras da quarentena, reuniões de pessoas em espaços abertos não podem exceder o número de 10 indivíduos.>
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Há menos de uma semana, o país comoveu-se com o caso de Abigail, uma garota de 12 anos que tem câncer nos ossos e não pôde fazer o trajeto entre Tucumán, província onde faz quimioterapia, e Santiago del Estero, onde vive, por conta da demora burocrática na fronteira.>
O pai de Abigail acabou abandonando o carro e cruzando a fronteira a pé, com a menina nos braços, numa imagem que virou ilustração e viralizou nas redes.>
As fronteiras entre províncias na Argentina estão fechadas e vigiadas desde março. Só é possível atravessar de uma a outra com permissão emitida pelo governo. A mesma medida proibiu também que o pai de Solange Musse, que vive em Neuquén, cruzasse a fronteira da província de Córdoba para dar um último beijo em sua filha, que morreu aos 35 anos, vítima de câncer.>
"Não pude ir ao funeral do meu avô, mas os barras bravas (torcedores organizados) podem depredar a cidade porque isso é parte da 'homenagem a Diego'? A Argentina é um país doente por permitir assimetrias assim", desabafou Eugenia Lacunza, 54, funcionária de uma livraria do bairro de Colegiales.>
As cenas de vandalismo na Casa Rosada, na tarde de quarta-feira (26), também causaram preocupação. O busto do ex-presidente Hipolito Yrigoyen (1852-1933) foi um dos que tombaram e acabaram pichados, assim como outras partes do edifício histórico.>
O partido União Cívica Radical, hoje oposição ao atual governo peronista, ao qual pertencia Yrigoyen, pediu, por meio de comunicado, que o monumento fosse restaurado e recolocado em seu lugar esta última parte já ocorreu. Ele é considerado dos principais ex-líderes da nação, derrubado por um golpe militar em 1933.>
A preocupação com o coronavírus pareceu ausente do velório, em que havia um cartaz recomendando uso de máscara. Ao lado dele, uma imensa tela mostrava os gols de Maradona ao longo da carreira.>
Líderes da oposição, como a ex-ministra de Defesa de Mauricio Macri, Patricia Bullrich, alertaram para uma "falta de responsabilidade" na organização do evento.>
O país, após ter visto um aumento da curva de contaminação do coronavírus em setembro e outubro, estava começando a vê-la descer, principalmente na capital federal, a partir de novembro. Em termos de letalidade, porém, a Argentina ainda está entre os países mais afetados do mundo.>
O presidente Alberto Fernández, que compareceu à cerimônia, disse que "se nós não tivéssemos organizado o velório seria muito pior".>
O médico e jornalista Nelson Castro afirmou: "Em um par de semanas, vamos saber qual foi o impacto do velório desorganizado de Maradona na pandemia na Argentina".>
O governo nacional também enfrentou o governo da cidade, comandado pela oposição. Afirmou, por meio do ministro do Interior, Wado de Pedro, que os tiros de bala de borracha e as bombas de gás lacrimogêneo que tentaram dispersar a multidão que pulava as cercas da Casa Rosada haviam sido ordenadas pela administração local.>
O chefe de governo da capital, Horacio Rodríguez Larreta, é do partido de Mauricio Macri.>
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