Publicado em 4 de novembro de 2024 às 20:25
Duas famílias na Inglaterra receberão indenizações no primeiro caso registrado de troca de bebês no nascimento na história do sistema público de saúde britânico.>
O exame de DNA foi feito apenas por curiosidade, mas o resultado chocante forçou duas mulheres e suas famílias a reavaliar tudo o que sabiam sobre si mesmas.>
Quando os amigos de Tony o presentearam com um kit de teste de DNA caseiro no Natal de 2021, ele guardou o presente no armário da cozinha e deixou lá por dois meses.>
Ele só voltou a pensar no kit em fevereiro. Tony estava em casa e entediado porque sua partida semanal de golfe tinha sido cancelada pela chuva. Ele colocou uma amostra de saliva no tubo do kit, enviou tudo pelo correio para um laboratório e não pensou mais nisso por semanas.>
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Os resultados chegaram em uma noite de domingo. Tony estava falando no telefone com sua mãe, Joan, quando o e-mail chegou.>
A princípio, tudo parecia normal. O teste identificou o lugar na Irlanda de onde sua família materna veio. Um primo estava em sua árvore genealógica. Sua irmã também estava lá.>
Mas quando ele olhou para o nome da irmã, estava errado. Em vez de Jessica, alguém chamada Claire foi listada como sua irmã (Jessica e Claire não são seus nomes verdadeiros — ambos foram alterados para proteger a identidade das mulheres).>
Tony é o mais velho de quatro filhos de Joan. Depois de ter três filhos, ela queria muito ter uma filha. Ela finalmente conseguiu seu desejo quando Jessica nasceu em 1967.>
"Foi uma sensação maravilhosa, finalmente ter uma menina", Joan me conta.>
No entanto, ela ficou imediatamente ansiosa quando soube que havia algo inesperado nos resultados de DNA de Tony. Ele também ficou, mas tentou não demonstrar. Dez anos após a morte de seu pai, a mãe de Tony estava na casa dos 80 anos e morava sozinha. Ele não queria deixá-la preocupada.>
Na manhã seguinte, ele usou o serviço de mensagens privadas da empresa de testes de DNA para entrar em contato com Claire, a mulher que seria sua irmã.>
"Oi", ele escreveu. "Meu nome é Tony. Fiz este teste de DNA. Você apareceu como minha irmã. Estou pensando que deve ser um engano. Você pode me ajudar a esclarecer isso?”>
Claire havia recebido o mesmo kit de teste de DNA dois anos antes, como presente de aniversário do filho.>
Seus resultados também foram estranhos — não havia conexão com o local de nascimento dos pais, e ela tinha uma ligação genética com um primo de primeiro grau que não conhecia e não sabia explicar.>
Então, em 2022, ela recebeu uma notificação — um novo irmão havia se juntado à sua árvore genealógica.>
A notícia foi desconcertante. Mas, de certa forma, fazia todo o sentido. Quando criança, Claire nunca sentia que pertencia à sua família.>
"Eu me sentia uma impostora", diz ela. "Não havia semelhanças, na aparência ou nos traços", ela me conta. "Eu pensava, 'sou adotada.'">
Quando Claire e Tony começaram a trocar mensagens e detalhes de suas vidas, eles descobriram que Claire tinha nascido quase na mesma época e no mesmo hospital que Jessica, a irmã com quem Tony cresceu.>
Uma explicação inevitável começou a surgir — as duas meninas haviam sido trocadas no nascimento, há 55 anos, e criadas em famílias diferentes.>
Casos de bebês trocados em maternidades são praticamente inéditos no Reino Unido. Em resposta a um pedido dentro da lei de Liberdade de Informação, o sistema público de saúde respondeu que seus registros não mostravam bebês enviados para casa de pais errados.>
Desde a década de 1980, os recém-nascidos recebem etiquetas de identificação por radiofrequência (RFID) imediatamente após o nascimento, o que permite que sua localização seja rastreada. Antes disso, as maternidades dependiam de etiquetas e cartões escritos à mão nos berços.>
Enquanto tentavam absorver a notícia, Claire e Tony precisavam decidir o que fazer.>
"As repercussões disso serão enormes", escreveu Tony para Claire. “Se você quiser deixar por isso mesmo, eu aceito completamente, e não vamos mexer mais nisso.”>
Sem hesitação, Claire sabia que queria conhecer Tony e a sua verdadeira mãe.>
“Eu só queria vê-los, conhecê-los, falar com eles e abraçá-los”, ela conta>
Quando Tony finalmente contou a Joan o que o teste de DNA havia revelado, ela ficou desesperada atrás de respostas. Como isso pôde acontecer?>
As memórias de Joan da noite em que sua filha nasceu são claras ainda. Ela deveria dar à luz em casa, mas como estava com pressão alta, seu parto foi induzido em um hospital de West Midlands, na Inglaterra.>
"Eles me levaram para um domingo", ela lembra. "Nevou naquele dia.">
O bebê nasceu por volta das 22h20. Joan segurou sua tão esperada filha por apenas alguns minutos — ela se lembra de olhar para o rosto vermelho e o cabelo emaranhado da recém-nascida.>
O bebê foi levado para o berçário durante a noite para que sua mãe pudesse descansar. Essa era uma prática comum na década de 1960.>
Algumas horas depois, logo após a meia-noite, Jessica nasceu no mesmo hospital.>
Na manhã seguinte, Joan recebeu Jessica em vez de sua filha biológica, Claire.>
O bebê tinha cabelos claros — diferentemente do resto da família mais próxima, que tinha cabelos escuros — mas Joan não pensou sobre o assunto. Ela tinha algumas tias e primas com cabelos parecidos.>
Quando seu marido chegou ao hospital para conhecer a bebê Jessica, eles estavam tão felizes que nem duvidaram de nada.>
Cinquenta e cinco anos depois, Joan estava desesperada para saber que tipo de vida Claire teve. Ela cresceu feliz?>
Mas antes que ela pudesse obter respostas, ela e Tony tiveram que dar a notícia a Jessica, que viveu a vida inteira acreditando que Joan era sua mãe e Tony era seu irmão.>
Tony e Joan viajaram até a casa de Jessica para contar a ela pessoalmente. Joan diz que ela a tranquilizou dizendo que elas sempre seriam mãe e filha, mas desde então, Joan conta que o relacionamento entre as duas não foi mais o mesmo.>
Jessica não quis ser entrevistada para esta reportagem.>
Um dia depois — e apenas cinco dias depois de Tony receber os resultados de DNA — Claire viajou a curta distância entre a sua casa e a de Joan.>
Por anos, ela havia passado de carro por ali ao ir para o trabalho, sem nunca saber que sua mãe biológica vivia no local.>
Tony estava esperando por ela na entrada da garagem. "Oi, mana", ele disse. "Venha conhecer a mamãe.">
Claire diz que, desde o momento em que viu Joan, parecia que elas sempre se conheceram: "Olhei para ela e disse: 'Meu Deus, tenho seus olhos! Temos os mesmos olhos. Meu Deus, pareço alguém!'">
"Tudo parecia certo", diz Joan. "Eu pensei, ela parecia exatamente como eu era quando era mais jovem.">
Eles passaram a tarde olhando fotos de família. Claire contou a Tony e Joan sobre seu parceiro, seus filhos e netos. Eles contaram a ela tudo sobre o pai biológico que ela nunca conheceu.>
Mas quando se tratava de perguntas sobre se ela teve uma infância feliz, Claire era evasiva.>
“Eu não conseguia dizer a verdade naquela época”, ela diz. “Meus pais se separaram quando eu era muito jovem. Não me lembro deles juntos. Fui criada em pobreza absoluta, sem moradia, muitas vezes passava fome e tudo que vem junto. Foi uma infância muito difícil.”>
Claire diz que dar a notícia à mãe que a criou foi a coisa mais difícil que ela já teve que fazer.>
Ela diz que fez o melhor que pôde para tranquilizar os pais com quem cresceu, que nada mudaria em seu relacionamento. Sua mãe morreu no início deste ano.>
Além de aceitar uma nova identidade genética, houve implicações práticas para Claire também. Como ela nasceu antes da meia-noite, ela descobriu que era um dia mais velha do que pensava: “Minha certidão de nascimento está errada, meu passaporte, minha carteira de motorista - tudo está errado.”>
Algumas semanas após fazer a descoberta, Tony escreveu ao departamento do sistema de saúde britânico que supervisiona o hospital onde Claire e Jessica foram trocadas, explicando o que os testes de DNA caseiros revelaram.>
O administrador admitiu a responsabilidade. Mas dois anos e meio depois disso, o valor da indenização ainda não foi acordado. Tony e Joan dizem que foram informados de que o processo seria finalizado no ano passado.>
Entramos em contato com o departamento que lida com reclamações contra o sistema de saúde. Nos informaram que a troca de bebês foi um "erro terrível" e que o sistema aceitava a responsabilidade legal.>
No entanto, os administradores disseram que se trata de um "caso único e complexo" e que eles ainda estavam trabalhando para determinar o valor da indenização.>
Claire e Joan têm descoberto o quanto têm em comum, como seus gostos em roupas e comidas, e mesmo no gosto por chás. Elas passaram férias juntas, explorando suas raízes biológicas na Irlanda, e passaram o último Natal juntas.>
"Somos muito próximas", diz Claire sobre sua família recém-descoberta. “Gostaria de passar o máximo de tempo possível com elas, é claro, mas esse tempo se foi. Foi tirado.”>
Enquanto Claire agora a chama de “mãe”, Joan me diz que Jessica não a chama mais. Mas Joan sente apenas que ganhou uma filha.>
“Não faz diferença para mim que Jessica não seja minha filha biológica”, ela diz. “Ela ainda é minha filha e sempre será.”>
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