Publicado em 16 de novembro de 2020 às 18:04
Os casos de coronavírus na Suécia dispararam nas últimas semanas, e o país anunciou nesta segunda (16) uma redução drástica no número de pessoas permitidas em eventos públicos de 300 para 8. >
As novas regras, que começam a valer no próximo dia 24, representam também uma mudança na abordagem pouco ortodoxa que deixou a Suécia na contramão do resto do mundo.>
Desde o início da pandemia, o governo evitava medidas mais restritivas, como bloqueios e obrigatoriedade do uso de máscaras. A resposta à Covid-19 era pautada mais por medidas voluntárias e recomendações à população.>
Nesta segunda, o discurso do premiê Stefan Lofven, acompanhado pelas falas de outros altos membros do governo, deu amostras do novo tom diante dos números de infecções que não param de crescer.>
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"Esta é a nova norma para toda a sociedade, para toda a Suécia. Não vá a academias, não vá a bibliotecas, não organize jantares, não faça festas. Cancele", disse Lofven.>
O limite de pessoas em reuniões havia sido reduzido para 50 em março, mas, em outubro, o governo abriu exceções para eventos com pessoas sentadas, nos quais seriam permitidos até 300 indivíduos.>
As novas restrições se aplicam a shows, apresentações artísticas e partidas esportivas, mas não a lugares como escolas, locais de trabalho e reuniões privadas. A restrição tem peso de lei e deve viger por ao menos quatro semanas, podendo ser prorrogada até as festas de Natal e Ano Novo. Quem descumpri-la pode enfrentar multas e penas de prisão de até seis meses.>
O premiê disse que o governo não tem como regulamentar todas as reuniões sociais, mas pediu que as pessoas sigam o novo limite mesmo em situações que não sejam formalmente afetadas pela lei.>
"Vai piorar. Cumpra o seu dever e assuma a responsabilidade de impedir a propagação da infecção. Vou dizer de novo. Vai piorar. Cumpra o seu dever e assuma a responsabilidade de impedir a propagação da infecção", afirmou Lofven.>
Até esta segunda, o país com 10,2 milhões de habitantes registrou 177.355 casos e 6.164 mortes. Os números colocam a Suécia com taxas per capita de infecção e de óbitos por Covid-19 muito maiores que as de outros países escandinavos, como Noruega e Dinamarca.>
A média semanal de novos casos confirmados era de 753 registros há um mês cifra que, hoje, chegou a 4.053 (aumento de mais de 438% em 30 dias), segundo os dados da Agência de Saúde Pública da Suécia.>
"Essas são medidas muito intrusivas, sem paralelo nos tempos modernos", disse o ministro do Interior, Mikael Damberg. "Não consideramos limitar levianamente os direitos das pessoas, mas vemos [a restrição de público] como necessária.">
Per Bolund, ministro da Habitação e do Mercado Financeiro, admitiu que as novas restrições terão um impacto negativo na economia, mas disse que sua gestão está pronta para introduzir medidas para apoiar os setores mais atingidos.>
"Quanto tempo temos para viver com essas medidas depende de quão bem você assume sua própria responsabilidade e mostra solidariedade com os outros", disse Bolund, recorrendo à responsabilidade individual dos suecos.>
A ministra da Saúde, Lena Hallengren, pediu que as pessoas não procurem brechas nas regras e façam tudo o que estiver ao alcance para conter a propagação do vírus. "Nas últimas semanas, as recomendações foram aprimoradas, e medidas fortes, tomadas. Apesar disso, o comportamento ainda não mudou o suficiente. As curvas estão indo na direção errada", disse Hallengren.>
O país se destacou no noticiário desde o começo da pandemia por não ter imposto um confinamento geral, embora recomendasse distanciamento físico, uso de máscaras e higiene das mãos.>
Entre os argumentos da Suécia para evitar as restrições mais severas até este momento estavam a legislação do país (que impede esse tipo de medida), a baixa densidade populacional (que reduz o número de encontros entre as pessoas), o fato de que metade dos suecos mora sozinha (evitando a transmissão doméstica) e o alto grau de adesão da população às recomendações do governo.>
Em maio, o presidente brasileiro, Jair Bolsonaro, citou a Suécia como modelo a ser seguido, embora os números contrariassem seus argumentos. Mesmo assim, o país se tornou referência para grupos políticos que se posicionam contra medidas restritivas de combate à pandemia.>
Anders Tegnell, epidemiologista-chefe e face pública da controversa resposta sueca à Covid-19, é um defensor de medidas baseadas na responsabilidade individual da população uma combinação de um alto nível de obediência às regras e confiança nas autoridades.>
Tegnell também apostava na "imunidade de rebanho", um conceito segundo o qual uma população ficaria naturalmente imune a um determinado vírus depois que uma grande porcentagem de pessoas fossem expostas à infecção.>
Na Suécia, a expectativa era de que os casos confirmados durante os meses referentes à primavera e ao verão do Hemisfério Norte deixassem a população mais próxima da imunidade já nos meses de outono e inverno (de setembro a março). A hipótese, entretanto, não se confirmou.>
"Esperava que ele estivesse certo. Teria sido ótimo. Mas não estava. Agora temos uma alta taxa de letalidade e não escapamos de uma segunda onda. A imunidade talvez faça uma pequena diferença, mas não muita", disse Annika Linde, epidemiologista que ocupou o cargo que hoje é de Tegnell de 2005 a 2013.>
Em entrevista ao jornal britânico The Telegraph publicada neste domingo (15), Linde disse que a resposta da Suécia à pandemia foi contaminada pelo excesso de pensamento positivo.>
"O pensamento positivo quando você não acredita no pior cenário tem orientado demais as decisões suecas", disse ela. "As autoridades suecas têm sido lentas o tempo todo. Em vez de serem proativas, elas correram atrás do vírus, e o vírus foi capaz de se espalhar muito antes de agirem".>
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