Publicado em 14 de outubro de 2024 às 19:30
O desconforto causado por longas filas de embarque, atrasos de voos, trens lotados e congestionamentos de trânsito pode fazer com que viajar se torne uma provação. E, para algumas pessoas, o estresse das viagens pode ser ainda mais forte.>
Espaços barulhentos e lotados de pessoas, interações sociais complicadas e súbitas mudanças de rotina são fortes desafios para viajantes neurodivergentes, como os do espectro autista.>
O autismo é uma condição complexa, marcada por diferenças nas interações sociais, comunicações e no processamento sensorial. Esta condição afeta cerca de 1% das crianças em todo o mundo, segundo a Organização Mundial da Saúde.>
A variedade e a gravidade dos sintomas variam de pessoa para pessoa. Ou seja, as acomodações específicas para cada viajante também podem variar.>
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Mas viajar também pode ser uma atividade muito gratificante para pessoas autistas, especialmente quando suas necessidades e sensibilidade são levadas em consideração.>
"Acho que um dos maiores benefícios de viajar é a oportunidade de ampliar as noções sobre o que as pessoas autistas são capazes de fazer", afirma o palestrante e escritor best-seller Kerry Magro, que foi diagnosticado com autismo aos quatro anos de idade.>
"[Viajar pode melhorar as] capacidades sociais, comunicação, adaptabilidade e a própria autoconsciência sobre quem eles são como indivíduos e o que eles gostam de fazer.">
Alguns conhecimentos básicos e acomodações simples podem fazer toda a diferença para as experiências de viagem de pessoas autistas – e os destinos turísticos estão trabalhando cada vez mais para fornecer estas condições para seus visitantes.>
Há mais de 20 anos, o Comitê Internacional de Credenciamento e Padrões de Educação Continuada (IBCCES, na sigla em inglês) fornece treinamento para hotéis, profissionais e escritórios de turismo de todo o mundo que se interessem em receber melhor visitantes autistas e com outros tipos de neurodivergência.>
Atualmente, mais de 300 empresas são relacionadas como Centros Certificados de Autismo, além de três destinos totalmente certificados. E existem outros atualmente em processo de certificação, como Dubai, nos Emirados Árabes Unidos, e a área da Grande Palm Springs, nos Estados Unidos.>
"Incorporamos as melhores práticas dos especialistas neste campo, além dos próprios indivíduos autistas e neurodivergentes [nos nossos treinamentos]", explica a presidente do IBCCES, Meredith Tekin. "Por isso, você irá ver indivíduos oferecendo sua experiência de vida e suas recomendações nos treinamentos.">
O IBCCES oferece treinamentos concentrados na consciência sensorial e na sensibilidade geral em relação às pessoas autistas. Eles também realizam ocasionalmente visitas presenciais a hotéis e cidades parceiras, para ajudar a identificar novas oportunidades de receber viajantes autistas.>
O objetivo da organização é ajudar os destinos a receber melhor as pessoas autistas e auxiliar os profissionais do setor de turismo a compreender melhor as necessidades de acessibilidade. >
Após o término do treinamento, a organização oferece certificações e a inclusão das empresas no site Autism Travel (em inglês), que relaciona destinos e atrações que o IBCCES considera "certificados para pessoas autistas".>
O IBCCES oferece certificações para restaurantes, lojas e atrações turísticas – os chamados "Centros Certificados de Autismo" – além de destinos e cidades.>
Os "Destinos Certificados de Autismo" são lugares em que a maior parte das organizações relacionadas ao turismo da região já passaram por treinamento. Já as "Cidades Certificadas de Autismo" são locais em que empresas e organizações de toda a cidade foram certificadas.>
O destino mais recente a receber a certificação é Traverse City, no Estado americano de Michigan. O local foi certificado em agosto de 2024.>
Traverse City é conhecida pelo seu belo cenário natural e pela proximidade da Margem Lacustre Nacional das Dunas de Sleeping Bear.>
Segundo a chefe de operações da organização Traverse City Tourism, Whitney Waara, o motivo que levou o local a obter a certificação foi simplesmente o desejo de fazer com que mais pessoas pudessem desfrutar da cidade.>
"Nós realmente trabalhamos para tentar fazer com que o nosso destino receba a todos", ela conta. "Garantir que estejamos preparados para atender a todos os turistas que chegarem, com todas as suas necessidades, tem sido uma prioridade importante para nós nos últimos anos.">
A iniciativa foi um projeto particularmente empolgante para Craig Hadley, diretor-executivo do Museu Dennos, em Traverse City. O filho de Hadley está no espectro autista e aparece no vídeo promocional da cidade que anuncia sua recente certificação.>
"Parece algo simples, mas, como pai, significa muito saber que a pessoa com quem você está falando entende o contexto e por que aquele recurso é importante para aquela família", declarou Hadley à BBC.>
O museu participou do processo de certificação, treinando funcionários e criando instalações adequadas para pessoas autistas, como espaços silenciosos, mapas sensoriais e fones de ouvido com cancelamento de ruído, que ficam disponíveis para os visitantes particularmente sensíveis aos sons, como é o caso de muitas pessoas autistas.>
O Museu Dennos também planejou eventos para pessoas autistas, como seu Halloween para Todos, em espaços com acessibilidade sensorial.>
Traverse City se inspirou na cidade de Mesa, no Arizona – a primeira cidade amiga das pessoas autistas dos Estados Unidos, certificada pelo IBCCES em 2019.>
O que começou como uma iniciativa do conselho de turismo da cidade, criada com base na experiência do seu CEO (diretor-executivo) como pai de uma criança autista, cresceu rapidamente – e passou a ser um movimento municipal, quando o prefeito tomou conhecimento dos planos.>
"Nós encabeçamos o projeto e, naturalmente, informamos o prefeito e as autoridades municipais. Ele simplesmente cresceu de forma orgânica", diz a vice-presidente de defesa e experiência no destino da organização Visit Mesa, Alison Brooks.>
"Acho que foi uma daquelas coisas que surgiram no momento perfeito. Muitas pessoas [são] afetadas pelo autismo de alguma forma. Por isso, é claro que sabíamos que esta era a coisa certa a fazer.">
Para que toda a cidade fosse certificada, Mesa precisou que pelo menos três empresas e organizações em diferentes setores – especificamente, turismo, educação e assistência médica – passassem pelo processo. Mas muitas outras empresas da cidade se inscreveram – tantas, na verdade, que Mesa agora oferece um passaporte chamado "Viva a Vida Sem Limites", que relaciona todos os centros certificados da cidade, como hotéis, restaurantes e atrações turísticas.>
A página Viagem com Autismo (em inglês) do website da Visit Mesa também oferece guias sensoriais gratuitos para sete dos destinos mais populares da cidade. Eles podem ser baixados e observados online antes da visita.>
"Quase todos os dias, encontro alguém que não sabia que [a cidade] foi certificada", diz Brooks. "Mas, sempre que falo com os moradores... eles ficam com essa sensação de orgulho.">
Para Magro, observar a disposição cada vez maior entre as cidades e destinos de aprender sobre o autismo e melhorar as acomodações para turistas neurodivergentes é um sinal positivo.>
"Espero realmente que não seja uma moda, mas uma [nova] realidade e que mais pessoas da nossa comunidade sejam recebidas de braços abertos.">
Leia a versão original desta reportagem (em inglês) no site BBC Travel.>
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