Publicado em 18 de agosto de 2024 às 18:29
À medida que as temperaturas globais aumentam ano após ano, as geleiras do mundo estão recuando. Esses rios de gelo e as camadas de gelo ainda maiores que cobrem a Groenlândia e a Antártida estão derretendo — e o derretimento está acontecendo de forma acelerada.>
As geleiras e as camadas de gelo abrigam apenas algumas espécies que são capazes de sobreviver nelas, como vermes do gelo, pulgas e algas da neve. Quando o gelo derrete, estas espécies são obrigadas a recuar com ele.>
Mas o que acontece com as áreas que as geleiras deixam para trás? Será que a vida se instala nessas áreas?>
Nossa equipe internacional de pesquisadores passou a última década investigando o que acontece com o solo recém-descoberto à medida que as geleiras recuam mais acima nas cadeias de montanhas. >
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Nós monitoramos o que está acontecendo em 46 geleiras que estão retrocedendo: do Himalaia até os Andes, do arquipélago ártico de Svalbard até o sul da Nova Zelândia, e até mesmo geleiras tropicais no México.>
O que nossa nova pesquisa descobriu é que a vida se desloca rapidamente para colonizar esses novos habitats, de micro-organismos a líquens e musgos resistentes, a espécies pioneiras como gramíneas.>
Mais plantas chegam e, na sequência, aparecem os animais. Com o tempo, observamos novos ecossistemas emergindo.>
Quando uma geleira derrete, o que resta é uma paisagem estéril de rocha exposta e sedimentos. Com o tempo, estas áreas se transformam gradualmente em um ecossistema pós-glacial complexo e diverso.>
O que a gente queria saber era como isso acontece, quanto tempo leva e como a vida coloniza os novos habitats.>
Entre os séculos 14 e 19, aproximadamente, o mundo foi atingido pela "Pequena Era do Gelo" — um período de resfriamento moderado que afetou amplamente o hemisfério norte. Durante este período, muitas geleiras neste hemisfério se expandiram.>
Do fim do século 19 em diante, as atividades humanas — especialmente a queima rotineira de combustíveis fósseis — começaram a reter mais calor e aquecer o planeta, lentamente no início, mas agora em um ritmo cada vez mais acelerado. >
Escolhemos nossas paisagens glaciais com cuidado, selecionando apenas as geleiras em que poderíamos datar com precisão o início do recuo do gelo utilizando uma série de fontes de dados, incluindo mapas topográficos, medições e informações de campo, fotografias, pinturas e imagens remotas. >
Nossa equipe cobriu várias partes do mundo, mas coletamos menos amostras nas regiões polares.>
Coletamos amostras de solo de mais de 1,2 mil lotes nas 46 geleiras — e as analisamos em laboratório para rastrear quais espécies chegaram e quando. >
Acompanhamos a formação do ecossistema analisando as propriedades do solo e os nutrientes, além da evidência de captura de carbono por parte das plantas. Também usamos técnicas de amostragem de DNA ambiental para capturar vestígios de DNA deixados por espécies animais e avaliar assim a biodiversidade local.>
Desta forma, conseguimos fazer uma referência cruzada entre a chegada das espécies e o momento em que cada geleira começou a recuar.>
O que encontramos? Um padrão surpreendentemente difundido de formação de ecossistema.>
As primeiras formas de vida a chegar foram as menores. Micro-organismos como bactérias, protistas e algas colonizam o solo. Estas diminutas formas de vida podem formar comunidades surpreendentemente ricas por si só.>
É necessária aproximadamente uma década de colonização por micro-organismos até que espécies maiores possam chegar. Alguns micro-organismos podem tornar os minerais nas rochas disponíveis para outras espécies.>
Em seguida, aparecem espécies pioneiras resistentes, como líquens, musgos e gramíneas, capazes de tolerar condições hostis. Embora o gelo tenha desaparecido, estas áreas ainda são assoladas pelo vento e pelo frio.>
Depois que as espécies pioneiras crescem e morrem, elas deixam para trás matéria orgânica. Isso enriquece gradualmente o solo empobrecido. Quando há matéria orgânica suficiente, plantas mais complexas podem criar raízes. >
Os animais maiores chegam por último, já que os herbívoros precisam de comunidades de plantas prósperas para sobreviver, e os predadores precisam de presas para se alimentar.>
Os ecossistemas podem ser muito simples ou extremamente complexos. Por exemplo, em partes livres de gelo da península Antártida, o ecossistema é dominado por musgos e espécies resistentes de tardígrados e colêmbolos.>
O que torna os ecossistemas mais complexos?>
Como nossa pesquisa mostra, a característica mais importante é o tempo, em vez da interação entre espécies. Com o passar do tempo, é provável que mais espécies novas colonizem estas paisagens pós-glaciais.>
Mas são as interações entre organismos que fazem os ecossistemas funcionarem.>
Os micro-organismos ajudam com frequência as plantas pioneiras acelerando o desenvolvimento de solos férteis. Mas como? Bactérias e fungos decompõem a matéria orgânica das plantas mortas em compostos mais simples.>
Esse processo cria húmus, um componente rico e fértil do solo que melhora sua estrutura e conteúdo de nutrientes.>
As plantas, por sua vez, criam novos habitats e fontes de alimento para os animais. >
Os animais começam a interagir uns com os outros, por meio de relações entre predador e presa, como as raposas-do-ártico e as lebres-do-ártico; ou como "engenheiros de ecossistemas", como as minhocas, que abrem caminho para mais animais ao consumir matéria vegetal morta e melhorar a disponibilidade de nutrientes no solo.>
Mesmo em ambientes aparentemente estéreis, a maneira como os organismos interagem entre si e com seu entorno pode ser extremamente rica e complexa.>
*Levan Tielidze é pesquisador de geomorfologia glacial da Universidade Monash, na Austrália.>
Este artigo foi publicado originalmente no site de notícias acadêmicas The Conversation e republicado aqui sob uma licença Creative Commons. Leia aqui a versão original (em inglês).>
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