Publicado em 2 de agosto de 2025 às 15:14
Paulo Leminski adolesceu e decidiu morar no mosteiro de São Bento, em São Paulo. Passou pouco mais de um ano lá, entre 1958 e 1959, como um oblato, que são os camaradas que integram uma comunidade monástica, sem necessariamente portar um título religioso.>
Mas o hábito não fez esse monge. "Ele foi meio que expulso por causa do comportamento. Diziam que tinha até foto da Sophia Loren embaixo da cama", diz o poeta e editor Tarso de Melo, exímio conhecedor do autor homenageado nesta edição da Flip, a Festa Literária Internacional de Paraty.>
Nas décadas seguintes, Leminski voltou muitas vezes a essa fase menos conhecida de sua vida. "Fica uma certa religiosidade desse momento", afirma Melo. "E Jesus vira a grande figura, né?">
Tanto que, aos 40, cinco anos antes de morrer, Leminski lançou uma biografia ensaística sobre o messias do cristianismo, "Jesus a.C." Jesus antes de Cristo.>
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Ali o curitibano fala sobre um homem histórico, "judeu errante e contestador", quase um hippie avant la lettre. Um olhar do Leminski contracultural, claro, que menciona um "Jesus muito namorador", pego "fazendo essa coisa vaga que pode ocorrer, sempre, entre homem e mulher (entre homem e homem, mulher e mulher), que se chama namorar".>
Leminski vê esse homem afeito à paquera, por exemplo, quando ele encontra uma samaritana à beira do poço. O poeta descreve como, na sua interpretação, Jesus "entra num daqueles jogos parabólicos e trocadilhescos" ao dizer à donzela, conforme narrado no Novo Testamento: "Se você me der dessa água, vou te dar a água da vida, água que, uma vez bebida, sacia a sede para sempre".>
Para Tarso de Melo, o Jesus de Leminski é "pura liberdade e puro amor". O homem que inspirou a religião mais popular do mundo é um dos quatro biografados por Leminski na coletânea "Vida", ao lado de Cruz e Sousa, Bashô (um monge budista) e Trotski.>
Jesus, na perspectiva do curitibano, é um "superpoeta" que se embaralha com a luta de classes. Escreve Leminski: "Curioso que, na frondosa bibliografia sobre os socialismos utópicos, nunca apareça a doutrina de Jesus como uma das mais radicais".>
Leminski, como tantos brasileiros do seu tempo, veio de formação católica, mas não professou uma fé específica. Perto do fim de sua breve vida, aproximou-se de personagens importantes da católica e progressista Teologia da Libertação. Frei Betto e Leonardo Boff, por exemplo, ganharam dele o poema "Amar: Armas Debaixo do Altar".>
Tarso de Melo diz que, como tudo para Leminski está a serviço de sua poesia, não haveria por que ser diferente aqui. "Ler Jesus é transformar Jesus em poema.">
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