• Aquiles Reis

    Aquiles Reis é músico e vocalista do MPB4. Nascido em Niterói, em 1948, viu a música correr em suas veias em 1965, quando o grupo se profissionalizou. Há quinze anos Aquiles passou a escrever sobre música em jornais. Neste mesmo período, lançou o livro "O Gogó de Aquiles" (Editora A Girafa)

De Aquiles para Funmilayo Anikulapo Kuti (1900-1978)

Publicado em 17/01/2023 às 14h31

Perdoe-me dirigir-te a palavra sem sequer tê-la conhecido, muito menos ouvido falar de ti até então – mas soube que também és mãe do compositor Fela Kuti, o rei do afrobeat.

Veja, acabei de ouvir o disco de estreia da Funmilayo Afrobeat Orquestra, grupo de onze musicistas que escolheu teu nome para identificar o trabalho que fazem, como esse atual tributo às mulheres pretas brasileiras.

Ah, o álbum foi contemplado e lançado pelo Rumos Itaú Cultural.

Disco de estreia da Funmilayo Afrobeat Orquestra

Álbum de estreia da Funmilayo Afrobeat Orquestra . Crédito: FAO/Divulgação

Para que tenha ideia da banda de afrobeat que traz teu nome, digo que ela é a única formada apenas por mulheres pretas e uma pessoa não binária. São elas: Bruna Duarte (baixo), Stela Nesrine (sax alto e voz/compositora), Tamires Silveira (piano, teclado e voz), Ana Góes (sax tenor e voz/compositora), AfroJu Rodrigues (percussão e voz), Rosa Couto (flauta e voz/compositora), Vanessa Soares (dançarina), Sthe Araújo (percussão e voz), Priscila Hilário (bateria, percussão e voz), Larissa Oliveira (trompete e voz/compositora) e Jasper Okan (guitarra e voz/compositor).

Sensuais em sua beleza, em sua graça plena de negritude e no engajamento na luta pelos direitos das mulheres, elas são onze músicas que vieram ao mundo para serem o que bem entenderem ser, o que bem quiserem viver e o que bem desejarem amar, tocar e cantar: enfim, músicas.

Sim, músicas, porque têm o ofício identificado pelo sexo: sendo mulheres, músicas são, ora bolas. E assim a Funmilayo firma o ponto no axé de sua ancestralidade.

O naipe de sopros é o ponto alto dos arranjos da FAO e de Allan Abbadia, ele que é o diretor musical da orquestra.

Mas o que seria dos sopros se não fosse a força da percussão, somada ao baixo, ao teclado e à guitarra? E os cabíveis e belos vocais abertos? E os solistas instrumentistas pulsando suas virtuosidades? E os solos vocais empunhando a força do sal das águas de Iemanjá? Meus Deuses!

Vibrantes as músicas interpretadas com a consciência do poder que têm – levadas com emoção e fé na vida, enquanto a luta pela liberdade é assumida pelo entusiasmo de vozes e acordes num suingue daqueles. 

Amplitude vista desde o ritual que inicia o CD. 

Trata-se de um texto de Rosa Couto, declamado por Vanessa Soares e acompanhado pelas percussões de Afroju Rodrigues e Sthe Araújo: “Separe, num corte, os dois lados do cérebro eurocentrado e, então, permita-se ouvir as ondas do mar quebrando ao som da fala de Beatriz. (...) Tudo cabe, tudo explode no big bang tremendo que deu origem ao Orí. Alimente o Orí faminto. Explore sua cabeça. A cabeça é o ventre, o início do mundo. Antepassada do tempo (...)”. Epa Heyi Oyá!

Espero que esse contato intergaláctico não tenha incomodado teu descanso, Funmilayo Anikulapo Kuti – a ti o meu respeito e a minha admiração. À Funmilayo Afrobeat Orquestra, o meu amor pela arte com que aguilhoa a mesmice.

Abraço.

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Este texto não traduz, necessariamente, a opinião de HZ.

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