Publicado em 1 de agosto de 2019 às 20:29
O ex-delegado do Departamento de Ordem Política e Social (Dops), Cláudio Guerra, de 79 anos, foi denunciado pelo Ministério Público Federal (MPF) em Campos dos Goytacazes (RJ) pela ocultação e pela destruição de 12 cadáveres na década de 1970, durante a ditadura militar.>
Guerra atuava no Espírito Santo e ainda vive no Estado. Ele é pastor evangélico e está em prisão domiciliar após ter sido condenado como mandante dos assassinatos da ex-esposa e da ex-cunhada. >
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O próprio ex-delegado narrou como incinerou os corpos em fornos da Usina Cambahyba, no município do Norte Fluminense. Há depoimentos dele no livro "Memórias de uma Guerra Suja" e também à Comissão Nacional da Verdade sobre o caso. Em 2014, ele voltou à usina e, em reconstituição com a utilização de manequins, mostrou como dava fim aos cadáveres.>
Entre as vítimas, Fernando Augusto de Santa Cruz Oliveira, pai do atual presidente da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), Felipe Santa Cruz.>
Entre os pedidos do Ministério Público está "o cancelamento de eventual aposentadoria ou qualquer provento de que disponha o denunciado em razão da sua atuação como agente público, dado que seu comportamento se desviou da legalidade, afastando princípios que devem nortear o exercício da função pública".>
A denúncia é datada do último dia 24 de julho e foi divulgada nesta quinta-feira (1º). O Gazeta Online procurou Cláudio Guerra. O filho dele atendeu o telefone e informou que o ex-delegado prefere não se manifestar quanto ao posicionamento do MPF.>
LEI DA ANISTIA>
O MPF avalia que a Lei da Anistia não se aplica ao caso, "tendo em vista o caráter permanente de crimes que por constituírem crime de lesa-humanidade, não são abrangidos pelo ordenamento doméstico, seja por anistia ou por prescrição".>
Para o órgão, Guerra agiu por motivo torpe (uso do aparato estatal para preservação do poder contra opositores ideológicos), visando assegurar a execução e sua impunidade, com abuso do poder inerente ao cargo público que ocupava.>
"Assim, com o objetivo de assegurar a impunidade de crimes de tortura e de homicídio praticados por terceiros, com abuso de poder e violação do dever inerente do cargo de delegado de polícia que exercia no Estado do Espírito Santo, foi o autor intelectual e participante direto na ocultação e destruição de cadáveres de pelo menos 12 pessoas, nos anos de 1974 e 1975", argumenta o procurador da República Guilherme Garcia Virgílio, autor da denúncia, apresentada à 2ª Vara Federal de Campos. >
SUMIR COM OS CORPOS>
Em seu depoimento, Cláudio Guerra relatou que havia preocupação nos órgãos de informação, por parte dos coronéis Perdigão e Malhães, de que os corpos daqueles que eram eliminados pelo regime acabassem descobertos, movimentando a imprensa nacional e internacional.>
Ele contou que uma das estratégias de sumir com os corpos consistia em arrancar parte do abdômen das vítimas, evitando, com isso, a formação de gases que poderia fazer com que o corpo emergisse. Ainda segundo ele, os rios constituíam a preferência para afundamento dos corpos, dado que no mar "a onda traz de volta".>
Guerra informou que sugeriu o forno da Usina Cambahyba como forma de eliminação sem deixar rastros, dado que já utilizava a usina e seus canaviais para desova de criminosos comuns, do Espírito Santo, em razão de sua amizade com o proprietário da usina.>
CASA DA MORTE>
De 1973 a 1975, ele recolheu no imóvel conhecido como Casa da Morte, em Petrópolis (RJ), e no Destacamento de Operação de Informação e Centro de Operações de Defesa Interna (DOI-CODI), na Tijuca, os corpos de 12 pessoas.>
Para retirar os corpos na Casa da Morte, Guerra relatou que encostava o carro no portão e recebia, em seguida, de dois ou três militares, os corpos ensacados em sacos plásticos. Ao chegar à usina, passavam os corpos para outro veículo, que ia até próximo dos fornos, sendo então colocados na boca do forno e empurrados com um instrumento que lembrava uma pá.>
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