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Publicitária que denunciou assédio é atacada nas redes sociais

Publicitária que denunciou assédio é atacada nas redes sociais

Assim que a história se tornou pública, na última segunda-feira, ela foi imediatamente julgada e condenada pelo "tribunal da internet"

Publicado em 8 de março de 2019 às 00:38

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A publicitária Cristine Rubim, de 26 anos, fez o desabafo em sua conta pessoal no Instagram. (Reprodução)

Uma publicitária que relatou ter sofrido assédio de um homem em um ponto de ônibus ao voltar de um bloco de carnaval em Vitória, acabou sofrendo um outro ataque. Assim que a história se tornou pública, na última segunda-feira, ela foi imediatamente julgada e condenada pelo “tribunal da internet”. ”Se não quer que aconteça, fique em casa!”, apontou um dos internautas nas redes sociais. “Andando com tudo de fora e quer que ninguém cobice”, disse outro.

Cristine Rubim, 26, contou que foi tocada nas coxas por um homem enquanto tentava ir embora do evento, um assédio, uma violência. Muitos dos comentários nas redes sociais colocaram a publicitária como “responsável” pela violência sofrida (em destaque estão alguns deles retirados da página do Gazeta Online no Facebook).

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Vocês não falam que Carnaval é festa da carne, tá tudo liberado. Se estivesse dentro de casa não teria acontecido

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Ao mesmo tempo, as reações a respeito do espancamento da comerciante Jane Cherubim, de 36 anos, pelo namorado iam em sentido contrário. “Que tristeza! O que está acontecendo com os homens?”, diziam.

As duas violências, apesar de diferentes, têm como pano de fundo o mesmo problema: o machismo. “Na sociedade a gente acaba hierarquizando as violências, mas não se pode relativizar. No caso da violência de gênero, o fundamento principal é o patriarcado, a ideia de que o homem é superior à mulher, que ele tem poder sobre a mulher”, explica Emilly Tenório, do Fórum de Mulheres do Espírito Santo.

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Passei carnaval em casa. Quem procura acha. A pessoa vai ao carnaval e acha que lá vai encontrar gente ajoelhada orando?

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Ela enfatiza que essa demonstração de poder masculino pode se apresentar de diferentes formas, desde um “fiu-fiu” na rua, um xingamento durante uma briga e até em uma agressão. ”No final, são todas formas de descaracterizar a mulher, seja moralmente, seja fisicamente”, diz.

Na postagem em que relata o assédio, a publicitária conta que se sentiu muito mal após o ocorrido e que acabou jogando no lixo a roupa que tinha usado. “Eu estar com uma roupa curta, de alguma forma, fez as pessoas acharem que poderiam consumir meu corpo. Tocando ou encarando. Eu precisei tomar banho e me trocar porque um cara me apertou como se eu fosse algo público”, escreveu.

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Querem bater o pé atestando o direito de ‘desfilar’ o corpo como bem desejarem e ainda querem frear o que provocaram!

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CRIME

 

A professora de Direito Penal da Universidade Presbiteriana Mackenzie de Campinas, Erika Chioca Furlan, lembra que essas violências, consideradas “menores”, estão previstas no Código Penal e têm punição. “Está tudo previsto na Lei Maria da Penha. A lei prevê cinco tipos de violência: a patrimonial, física, moral, psicológica e sexual”, diz.

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Se tivesse dentro da igreja não tinha acontecido. Anda com tudo de fora e não quer que ninguém cobice

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Para cobrir uma brecha que ainda havia, foi sancionada no ano passado a Lei da Importunação sexual que veio para reforçar esse recado. “Havia na lei previsão de crimes muito graves como estupro. Mas não condutas ‘menores’ não eram consideradas crimes. Para suprir essa lacuna, o tipo penal foi criado e agora essas condutas também são punidas”, diz a professora. A pena para o crime de importunação sexual é de um a cinco anos de prisão.

 JORNALISTAS RELATAM ASSÉDIO

“No caminho para a academia havia um bar de esquina com seus ‘bêbados de estimação’, aqueles que estão sempre lá. Durante muito tempo, sempre que eu passava, eles falavam coisas horríveis, assoviavam e até tentavam entrar na minha frente. Passei a me vestir com roupas largas quando sabia que passaria lá. Um dia, me revoltei e respondi. Falei que eram nojentos, que deveriam ter vergonha e que eu era uma pessoa e não um pedaço de carne, que não existia para o deleite deles. Os homens ficaram agressivos, me xingaram e um ameaçou me seguir. Hoje, desvio meu caminho, mudo de calçada para não ter que encontrá-los.” Natalia Bourguignon, repórter de Cidades

“Eram quase 22h e eu retornava do curso de teatro no Centro de Vitória. Quando entrei no ônibus, vi que só havia homens. Fiquei em pé, com uma péssima sensação por estar sendo observada. Quando um deu sinal de parada, chegou a tocar no meu braço e falar ‘ei...’. Ao descer, ainda ficou parado na frente da porta com uma cara de deboche. Fui durante toda a viagem com medo do que pudesse acontecer e até mesmo pensei ‘por que logo hoje fui usar batom vermelho?’. Senti que por esse fator chamaria mais atenção, como se eles precisassem de um motivo específico para se sentirem no direito de fazer qualquer coisa.” Joyce Patrocínio, estagiária Bom Dia ES e G1

“Aos 12 anos, passei a notar olhares maldosos de homens adultos. Cheguei a andar curvada, tentando não chamar atenção. Aos 14, um homem me falou obscenidades sobre os meus seios. Eu estava ao lado da minha mãe em uma feira lotada. Era a primeira vez que eu vestia aquela blusa. Nunca mais usei. Aos 15, voltando da escola, um motociclista passou e bateu na minha bunda. Lembro da dor física e emocional que senti. O vi sorrir pelo retrovisor. A marca da mão dele ficou em mim e chorei por horas. Aos 25, em um bar, um desconhecido disse que não era racista – sou negra – e propôs que eu fosse a ‘escrava sexual’ dele.” Elis Carvalho, repórter de Polícia

“Eu tinha cerca de 16 anos e estava no ensino médio. Almocei com uns amigos perto da escola e saí, para ir pra casa, de uniforme, com um picolé na mão. Na calçada do colégio, um homem de bicicleta se colocou ao meu lado e foi me acompanhando. Apesar de ser entre 12h e 13h, não tinham outros pedestres passando. Esse homem falou todos os tipos de obscenidades para mim, porque eu estava com um picolé na mão. Fiquei apavorada, joguei o picolé no chão e nem assim ele parou. Ele só se distanciou quando, ao virarmos a esquina, demos de cara com dois policiais. Essa história tem dez anos e eu ainda me lembro do pavor que senti.” Beatriz Marcarini, repórter de Cidades

“Meu caso aconteceu há 10 anos, trabalhava na Assembleia Legislativa. Um procurador, que já era conhecido por situações de assédio, se aproximou de mim e perguntou se eu era modelo. Respondi que não. Então, ele elogiou meu sorriso, disse que devia fotografar bem. Sorri e agradeci, não quis ser antipática. Quando eu voltava para minha sala, ele ‘brotou’ no corredor e me acompanhou no elevador. Fiquei desconfortável. Quando entramos, voltou ao assunto sobre eu ser modelo. Falei que não tinha interesse. Ele disse com uma cara cínica: ‘Pois deveria, tem seios pequenos, cabem na mão. Fica bem na foto’. Tive vontade de sumir.” Mayra Bandeira,repórter de Polícia

“Ainda fazia faculdade e estava indo para o curso de inglês, na Praia da Costa, de ônibus. Sentada no lado da janela, o passageiro que estava no assento do corredor me pressionou contra a lateral do ônibus e começou a se masturbar. Minha reação foi levantar e gritar. Os outros passageiros me olhavam como se eu fosse ‘a louca’, gritando. Desci antes de chegar ao meu ponto e fui correndo para o curso, chorando. Até hoje, quando ando de ônibus, não sento do lado da janela. Também fui assediada por um chefe, assim que comecei a trabalhar em um órgão federal. Falava barbaridades. Saí de lá em uma semana. Aline Nunes, repórter de Cidades

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“Com 5 anos começaram os abusos. O marido da minha tia tocava minhas partes íntimas. Por ser nova, não entendia o que acontecia. Após um ano, ficou cada vez mais recorrente. Contei para minha mãe e percebi que ela não entendeu a gravidade, ficou com medo de falar para o meu pai e ele matar a pessoa. Ela apenas se afastou da casa do abusador. Ainda assim, ele continuou me cercando, principalmente quando meus seios começaram a crescer. Passei anos com uma mágoa silenciosa da família porque dei sinais de que sofria abuso. Após anos, com muita terapia, questionei a todos. Hoje sou acusada pela família dele de ‘não saber o que é perdão’”. X.funcionária do Comercial

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