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Dondoni: todos os juízes de Viana se negam a julgar caso

Dondoni: todos os juízes de Viana se negam a julgar caso

O despacho do último deles foi publicado na tarde desta quarta-feira (15), já encaminhando o processo para o TJES

Publicado em 15 de agosto de 2018 às 20:36

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Chegada à Delegacia de Delitos de Trânsito do motorista Wagner José Dondoni de Oliveira. (Gabriel Lordêllo/Arquivo A Gazeta)

Todos os juízes de Viana, criminais e cíveis, se declaram como impedidos ou suspeitos para o empresário Wagner José Dondoni de Oliveira, que matou uma família em um acidente de trânsito há dez anos. O caso agora segue para análise do Tribunal de Justiça do Espírito Santo (TJES), que terá que designar um magistrado para realizar o Júri Popular.

O despacho do último magistrado foi publicado na tarde desta quarta-feira (15), já encaminhando o caso para o TJES. "Oficie-se ao Excelentíssimo Desembargador Presidente do Egrégio Tribunal de Justiça para as providências cabíveis, tendo em vista o disposto no art. 5º da Resolução 22/2018", informou a decisão.

Na última semana, os oito juízes da comarca de Viana, quatro cíveis e quatro criminais, foram declarando, dia após dia, as suas suspeições. A alegação era de "suspeição por motivo de foro íntimo", conforme consta em suas decisões, o que os impedem de julgar o caso. Somente o primeiro juiz, chamado de natural da Primeira Vara Criminal de Viana, se declarou por impedido em função de um parente dele, de primeiro grau já ter atuado no processo, o que o impede de realizar o julgamento.

De acordo com informações do Tribunal de Justiça do Espírito Santo (TJES), cada Vara tem um substituto automático para o juiz titular. A medida que ele se dá por impedido, o caso segue para o próximo. No caso de haver um impedimento declarado por todos os oito juízes de Viana, a decisão passa para a presidência do Tribunal de Justiça, a quem caberá designar um magistrado que irá assumir o processo e marcar o Júri Popular.

Até que isso ocorra, o processo voltará para a chamada vara de origem, ou seja, a Primeira Vara Criminal de Viana, onde aguardará a indicação do novo magistrado.

Fato semelhante aconteceu com o julgamento do assassinato do juiz Alexandre Martins de Castro Filho. Em 2015, oito juízes de Vila Velha se declararam impossibilitados de conduzir o caso e foi designado o magistrado Marcelo Soares Cunha, que à época era responsável por uma Vara Criminal de Cariacica.

AMAGES

De acordo com Ezequiel Turíbio, presidente da Associação de Magistrados do Espírito Santo (Amages), a lei permite que o juiz se declare como suspeito para julgar um caso sem que seja necessário declarar os motivos. E há ainda, como ocorreu com o titular da Primeira Vara Criminal de Viana, os chamados impedimentos legais. "Neste caso, houve a presença de um parente de primeiro grau do juiz atuando no caso, o que o impede de fazer o julgamento. Mas tudo está previsto em lei", relata.

No caso de Viana, ele relata que dentre as possibilidades está o grande volume de processos existente nas Varas. "Dentre eles há os que respondem pela Execução Penal e área eleitoral", acrescenta. Também pesaria o fato de que o processo, que já acumula dez volumes, demandar que um juiz da área cível pare um tempo maior para estudá-lo. "Um juiz cível teria que parar tudo para estudar o caso", acrescenta.

MORTES

Dondoni vai a julgamento após o último recurso por ele apresentado não ter sido aceito pelo Superior Tribunal de Justiça (STJ). Ele transitou em julgado - quando não há mais recursos a serem feitos -, no dia 7 do mês de junho. Com isso, o Tribunal de Justiça informou à 1ª Vara Criminal de Viana que poderia dar prosseguimento. Desde o último dia 19, o processo está concluso para despacho, aguardando as próximas etapas até o julgamento, mas este trânsito foi interrompido pela indisponibilidade dos juízes.

Wagner José Dondoni de Oliveira na delegacia com garrafa de vodca. (Gustavo Louzada | Arquivo)

Ao STJ, o empresário questionou a sua pronúncia, a decisão que o encaminhou para o Tribunal do Júri. "Ele questionou em várias instâncias querendo mudar de homicídio doloso para culposo. Na prática, queria transformar os homicídios cometidos naquele dia apenas em crime de trânsito, com uma pena menor. Mas não obteve êxito", explicou o advogado Odilon Martins Silveira, acrescentando que no processo há provas contundentes, mas que o réu busca a imputação do crime num tipo legal cuja pena é menor. "O que perseguido a exaustão pela defesa do réu, felizmente não logrando êxito nos seus intentos", acrescentou Odilon, que atua como assistente da acusação, representando os familiares de Ronaldo Andrade, que perdeu a esposa e os filhos no acidente.

Na decisão em que negou o recurso de Dondoni, o ministro Sebastião Reis Júnior, do STJ, destacou que pelos elementos presentes no processo "não se pode desconsiderar que o recorrente (Dondoni) tenha agido com dolo eventual, não só por dirigir alcoolizado, conforme demonstrado no laudo etílico, mas também porque, conforme relatos testemunhais, o apelante dirigia em alta velocidade, em 'ziguezague', e em estrada de grande circulação de veículos mesmo tendo sido aconselhado por socorristas, a não dirigir o veículo, por demonstrar estar embriagado, o que em tese caracterizaria o dolo eventual".

Em entrevista para o Gazeta Online, há duas semanas, Odilon manifestou a sua expectativa de que se tenha mais agilidade no processo. "Não há mais recursos e com o retorno do processo para a Justiça Criminal de Viana esperamos que o julgamento se dê numa data mais próxima possível a fim de que tenhamos uma resposta para a família das vitimas e para a sociedade", destacou, lembrando que o julgamento já chegou a ser marcado duas vezes e adiado em decorrência de recursos.

Todos os advogados cujos nomes constam no processo informaram não estar mais na defesa do empresário Dondoni. Nem o empresário nem o advogado que atualmente faz a defesa dele foram encontrados pela reportagem.

10 ANOS DA TRAGÉDIA

Motorista embriagado em uma S10 atingiu um Fiat Uno e matou três pessoas. (Gustavo Louzada/Arquivo A Gazeta )

No dia 20 de abril, a família de Ronaldo Andrade, 35, seguia para Guaçuí, no Sul do Espírito Santo. No carro estavam a esposa, Maria Sueli Costa Miranda, 29, e os filhos Rafael Scalfoni Andrade, 14, e Ronald Costa Andrade, 4 anos. Na altura do quilômetro 304, próximo ao posto Flecha, em Viana, o carro em que viajavam, um Fiat Uno, guiado por Ronaldo, foi atingido pela S10 de Dondoni. Rafael morreu no local. Ronald, horas após ser socorrido. E a mãe, três dias depois. Ronaldo ficou muito machucado. Dez horas após o acidente, Dondoni foi submetido ao teste etílico, que apontou 6,7 decigramas de álcool por litro de sangue. 

Dez quilômetros antes do acidente que matou três pessoas, Dondoni já havia provocado outra ocorrência, ao jogar a S10 contra o carro de uma família de turistas na altura de Seringal, que teve que desviar e acabou capotando. Ele fugiu do local sem prestar socorro. Um pouco antes, ele havia entrado descontrolado em um posto de gasolina, em Guarapari, e quase colidiu contra uma ambulância. Chegou a ser alertado pelos socorristas a não seguir viagem. No dia do acidente que matou a família, a Polícia Rodoviária Federal (PRF) já tinha sido acionada sobre um motorista que estava 'ziquezagueando' pela pista, mas não chegou a tempo de impedir a tragédia.

ENTENDA

Ronaldo, único sobrevivente do Fiat Uno, durante velório dos filhos. (Nestor Müller | Arquivo | A Gazeta)

O acidente

A caminhonete S10 guiada por Wagner Dondoni e o Fiat Uno dirigido por Ronaldo Andrade colidiram por volta das 7 horas do dia 20 de abril de 2008, no km 304 da BR 101, próximo ao posto Flecha, em Viana.

As vítimas

A família de Ronaldo seguia para Guaçuí, no Sul do Estado. Seu filho, Rafael Scalfone Andrade, de 13 anos, morreu no local. O caçula, Ronald, 3 anos, morreu horas depois. A mulher do cabeleireiro, Maria Sueli Costa Miranda, 29, ainda ficou internada por três dias, mas não resistiu aos ferimentos.

Reprodução da foto da esposa e dos filhos de Ronaldo Andrade, que os perdeu em um acidente na BR 101, provocado por um motorista embriagado. (Arquivo A Gazeta)

Embriaguez

A embriaguez do empresário foi comprovada por meio de um exame feito com a coleta de sangue: o resultado foi 6,7 decigramas de álcool por litro de sangue. O teste foi realizado 10 horas após a colisão. Na hora do acidente, esse índice deveria ser ainda maior, já que estudos mostram que o corpo humano começa a eliminar o álcool depois de seis horas do consumo.

A prisão

Dondoni foi detido após o acidente e foi levado para o DPJ de Cariacica, mas foi liberado após pagar fiança de R$ 2,1 mil.

Liberdade

Em setembro de 2008, Dondoni saiu da cadeia. Meses depois, sem carteira de motorista, tentou retirar uma nova habilitação, em Minas Gerais, mas foi descoberto.

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