> >
Cidades que gastam mais com educação não têm resultados melhores

Cidades que gastam mais com educação não têm resultados melhores

Com mais despesa por aluno, notas em avaliação são baixas ou médias

Publicado em 13 de julho de 2019 às 23:47

Ícone - Tempo de Leitura 0min de leitura
Municípios que gastam mais por aluno, não têm necessariamente, resultados melhores no Ideb. (Marcel Alves)

Um levantamento sobre como os municípios do Espírito Santo têm gastado o dinheiro que arrecadam revela o ranking de despesas com educação em todo o Estado. Contudo, maior gasto não indica, até o momento, mais qualidade no ensino. O desempenho nas cidades que despenderam mais recursos na área, por aluno, não se mostra equivalente.

No anuário Finanças dos Municípios Capixabas, com dados referentes a 2018, Vitória, Serra, Vila Velha e Cariacica, nessa ordem, aparecem como as cidades que mais gastaram com educação em volume total de dinheiro. Mas ao dividir os recursos pelo número de alunos matriculados, assumem as primeiras posições do ranking os municípios de Presidente Kennedy, Governador Lindenberg, Itapemirim e Itarana.

Seja de uma maneira, seja de outra, ao cruzar os dados dos municípios que constam do anuário com o Índice de Desenvolvimento da Educação Básica (Ideb) de 2017 – indicador bienal –, nenhum dos 10 que mais gastam se encontra entre os 10 primeiros colocados do Estado no índice de ensino do Ministério da Educação (MEC), do ensino fundamental.

Dessas cidades, Itarana ficou mais bem posicionada, pois alcançou o 12º melhor resultado do Ideb entre os 78 municípios capixabas, embora não tenha batido a meta definida pelo MEC – a cada resultado, o Ideb estipula as metas de cada município para a próxima avaliação. Para efeito de comparação, foi considerado o resultado do Ideb da 4ª série/5º ano de cada cidade, uma vez que o primeiro ciclo do ensino fundamental é majoritariamente conduzido pelas prefeituras.

Em Vitória, foram gastos mais de R$ 396 milhões em um universo de 45.946 matrículas, o que representa R$ 8,6 mil por aluno. No Ideb, 54ª posição. Em Presidente Kennedy, a despesa na área foi de R$ 77,2 milhões mas, com um número bem menor de matriculados (2.949), o gasto com educação, por aluno, ultrapassou os R$ 26 mil. Ainda assim, no Ideb está apenas na 35ª colocação.

PERFORMANCE

“Existe uma noção de que é necessário fazer mais investimentos na educação, porém mais recursos não significam necessariamente melhoria da performance e desempenho da educação”, observa o economista Eduardo Araújo.

Para ele, obter melhores resultados está relacionado em boa medida à gestão. “A eficiência dos gestores na área pode sim trazer diferenças”, pontua o economista.

Araújo reconhece, contudo, que há variáveis que impactam, como a qualificação dos educadores ou quantidade de estudantes por turma. “Neste ponto, é preciso um equilíbrio: se coloca muitos alunos por sala, há uma queda na eficiência do ensino; se coloca poucos, o custo fixo fica muito elevado”, compara.

Entre as estratégias que ele acredita que podem surtir mais efeito está a ampliação da jornada dos alunos nas escolas, mas Araújo também aposta em aspectos econômicos. A Constituição Federal prevê que 25% do ICMS recolhido pelos Estados seja repassado aos municípios. Na opinião de Araújo, os critérios de distribuição poderiam ser revistos e levar em consideração o desempenho da educação.

“Com a transferência pautada na melhoria desse indicador, o prefeito vai começar a se envolver mais com isso. Entenderá que não é só cumprir a aplicação mínima de recursos na educação (25% do orçamento), mas que a qualidade também é importante.”

Doutora em Educação e professora da Ufes, Cleonara Schwartz aponta que a questão básica para o problema do descompasso entre aplicação de recursos e desempenho é: onde os municípios estão gastando o dinheiro? Em sua avaliação, os recursos muitas vezes são aplicados sem levar em conta a realidade, as especificidades de uma comunidade.

“É preciso fazer uma escuta de professores, pedagogos, famílias para entender o que é realmente necessário. A melhor fonte de informação de onde o dinheiro deve ser gasto é o profissional que atua na escola. Quando as verbas são definidas dentro de gabinetes, não costumam atender as demandas.”

MUNICÍPIO GASTA QUATRO VEZES MAIS MAS TEM RESULTADO SEMELHANTE A OUTROS

Prefeitura de Presidente Kennedy, onde fica a Secretaria de Educação: cidade é a que mais gasta por aluno. (Carlos Alberto Silva)

Com maior despesa em educação por aluno, Presidente Kennedy gastou, em 2018, quatro vezes mais do que Rio Bananal para obter o mesmo resultado no Índice de Desenvolvimento da Educação Básica (Ideb) da 4ª série/5º ano de cada cidade: nota 5,9. A primeira cidade teve despesa de mais de R$ 26 mil por estudante, enquanto a outra gastou R$ 6,6 mil.

Sob outra perspectiva, Mantenópolis desembolsou R$ 6,3 mil por estudante, menos do que Alegre (R$ 7,6 mil), mas ficou em primeiro lugar entre as cidades capixabas na avaliação do Ministério da Educação (MEC), com nota 6,9. Já o município do Sul do Estado recebeu 4,9, a pior nota do Espírito Santo – dentro da própria meta, porém dois pontos abaixo do líder no ranking de municípios capixabas.

A análise dos dados, conduzida pelo economista Eduardo Araújo, revela as distorções da aplicação dos recursos da educação. “Presidente Kennedy podemos dizer que é quase um ponto fora da curva pelo volume de recursos gastos por aluno. Mas, ao fazer a comparação com outros municípios, vemos que entrega um resultado muito baixo”, afirma.

“A diferença entre o melhor e o pior desempenho (Mantenópolis e Alegre) também demonstra distorção entre despesas e resultado”, acrescenta.

INICIATIVAS

A secretária municipal de Educação de Presidente Kennedy, Karem Martins Campos, reconhece as dificuldades da cidade do ponto de vista de qualidade do ensino. Há pouco mais de dois meses no cargo, disse que várias iniciativas estão sendo adotadas para que o quadro de baixo desempenho seja revertido.

Entre as ações, afirma Karem, está um projeto de reforço escolar no contraturno para os estudantes do ensino fundamental que ainda não estão alfabetizados, e outro que promove a identificação dos alunos que abandonaram os estudos para levá-los de volta aos bancos escolares.

“Também estamos fazendo a formação dos professores, reforçando a Educação de Jovens e Adultos (EJA) porque temos um número expressivo de pessoas analfabetas e temos um projeto de escola em tempo integral (educação infantil e ensino fundamental)”, pontua a secretária. Karem esclareceu que o recurso gasto com educação no município, proveniente em parte dos royalties do petróleo, não é exclusivo para a ensino básico. Parte da verba é destinada para um programa que custeia bolsas em cursos de nível técnico e superior.

 

Presidente da União Nacional dos Dirigentes Municipais de Educação (Undime-ES), Vilmar Lugão de Britto reconhece que despesa não reflete qualidade e destaca que os municípios precisam rever os gastos na área. “Falar em qualidade não é só investimento. Fazer mais com menos não é o suficiente. É preciso priorizar ações, saber escolher em que investir para obter melhores resultados”, diz o representante das secretarias municipais de educação do Estado.

PROJETOS PARA TER RENDIMENTO

As cidades da Grande Vitória apresentaram os maiores volumes totais de recursos em educação, mas estão na parte de baixo do ranking do Ideb do Estado. Mesmo a Serra, que bateu a sua meta no indicador, teve um desempenho que colocou a cidade na 56ª colocação. Todas têm projetos que visam melhorar seus resultados.

 

“O investimento é expressivo, e a educação é política prioritária. Temos um plano municipal, pactuado com a sociedade e com metas já batidas. A qualidade é bacana e trabalhamos para melhorar. Das 53 Emefs (Escolas Municipais de Ensino Fundamental), 33 já avançaram no Ideb”, ressalta a secretária municipal de Educação de Vitória, Adriana Sperandio. A Capital é a 54ª no Ideb.

Em Cariacica (69ª no ranking), o secretário José Roberto Martins Aguiar revela que a evasão e a reprovação, altas no municípios, também causam impacto financeiro e, por isso, a administração tem focado projetos para reduzir esses indicadores negativos. “Mas, com receita baixa e uma rede grande, não conseguiremos avançar muito se não houver o apoio do Estado e do governo federal”, afirma.

Na Serra, a subsecretária de Educação Pedagógica, Elizângela Ribeiro Fraga, falou que, após análises estatísticas de desempenho dos estudantes, constatou-se maior dificuldade nas turmas do 3º e do 6º ano do ensino fundamental, para os quais estão sendo desenvolvidos projetos específicos. “Há formação continuada de professores, mas para aqueles do 3º ano, por exemplo, estamos orientando um trabalho diferenciado para consolidar a alfabetização dos alunos, uma vez que eles têm níveis diferentes de aprendizagem.”

Este vídeo pode te interessar

Vila Velha (63ª no Ideb) também está investindo mais na qualificação e remuneração dos professores, bem como em material pedagógico, segundo afirmou a subsecretária Soliandra Mattos.

Notou alguma informação incorreta no conteúdo de A Gazeta? Nos ajude a corrigir o mais rapido possível! Clique no botão ao lado e envie sua mensagem

Envie sua sugestão, comentário ou crítica diretamente aos editores de A Gazeta

A Gazeta integra o

The Trust Project
Saiba mais