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Após ser baleado, universitário encontra no esporte um recomeço na vida

Após ser baleado, universitário encontra no esporte um recomeço na vida

Caio Rodriguez,  que ficou paraplégico depois de ser atingido por um tiro disparado por um policial militar, na Rodovia do Sol, em Vila Velha, se aventura na canoagem e redescobre a alegria de viver

Publicado em 22 de outubro de 2019 às 13:20

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De remo em mãos, Caio conta com o auxílio do instrutor Pedro Henrique para se desenvolver na canoagem. (Arquivo pessoal)

Quando acordou no último dia 31 de março, o universitário Caio Rodriguez de Oliveira, de 25 anos, já tinha a percepção de que daquele dia em diante a vida dele estava inserida em uma nova e difícil realidade: a paraplegia.

Uma lesão medular causada por um tiro na coluna, disparado por um policial militar na Rodovia do Sol, em Vila Velha, o deixou sem os movimentos da região do umbigo para baixo, forçando-o, momentaneamente, a deixar de fazer as coisas que mais gostava, como surfar e nadar.

Quase sete meses após o fatídico dia 30 de março, Caio já exibe o sorriso no rosto. Levando uma vida normal para um agora cadeirante, o estudante do curso de Publicidade e Propaganda dá as primeiras remadas na canoagem.

VEJA COMO ESTÁ A RECUPERAÇÃO DE CAIO

Após evoluir fisicamente nas sessões de fisioterapia e musculação, além de recuperar a confiança em si mesmo, Caio agora vai se reinsirindo socialmente. Ele escolheu a modalidade para voltar a praticar esportes e ter uma vida ativa. Nesse processo de pequenas vitórias diárias, o universitário conta com o apoio fundamental da família, da namorada e também do fisioterapeuta Fernando Marcarini, que o acompanha desde os primeiros dias após ser baleado pelas costas.

"Eu sempre gostei muito do mar. Surfar era algo que eu adorava e estar na água me fazia bem. Quando comecei a me recuperar, queria de alguma forma ter a possibilidade de voltar à agua. Vendo os cenários possíveis, vi na canoagem um esporte adequado às minhas condições físicas e iniciei o processo de transição para a água", disse Caio.

AS PRIMEIRAS REMADAS

Três vezes na semana, Caio deixa Vila Velha, segue pela Terceira Ponte e tem como destino uma pequena praia logo no acesso à Ilha do Frade, em Vitória. É lá que ele deixa a cadeira de rodas, senta-se na canoa e rema, sempre na companhia do pai, Fabrício, e do instrutor de canoagem, Pedro Henrique Weichert.

Aspas de citação

É uma adaptação, é um começo. Ainda está sendo um pouco difícil porque tem a questão do equilíbrio de tronco, mas tem sido muito bom. Só de estar em contato com o mar, de vir à praia de um jeito acessível. Estar na água sempre foi algo presente em minha vida, é uma coisa que quero manter, por isso procurei por esses esportes. Estar aqui, além de ser um lazer, é uma fisioterapia. Faço mais esforço aqui na própria canoagem para tentar me equilibrar, para conseguir remar do que propriamente nas sessões

Caio Rodriguez de Oliveira
Universitário
Aspas de citação

Quando Caio afirma fazer muito esforço ao sentar-se no barco não é força de expressão. O fisioterapeuta dele explica como essa fase é importante na reabilitação e evolução física do estudante do curso de Publicidade.

"Um dos objetivos que temos no processo de reabilitação é a reinserção social do paciente. Isso daqui (praticar canoagem) tem uma importância enorme nesse processo, porque não visamos apenas a parte física, mas também a psicológica. Ter esse contato com novas pessoas, com a natureza, faz com que a parte psíquica dele fique mais fortalecida para encarar as adversidades", destacou Fernando.

ADAPTAÇÃO

Remar é algo novo na vida de Caio. Assim como toda novidade, a atividade requer adaptação, que ocorrerá gradativamente. "Após o Caio optar pela canoagem, agora temos que adaptá-lo para o esporte. Nesse processo, teremos de ajustar a canoa para que ele possa ter mais sustentação enquanto rema. Estamos desenvolvendo um banco especialmente para ele poder se desenvolver nessa modalidade", disse o fisioterapeuta.

Caio já consegue se sentar sozinho e demonstra boa recuperação física(Fernando Madeira)

Para ingressar de vez na canoagem, Caio conta com a ajuda de uma pessoa que até poucas semanas atrás não fazia parte do dia a dia dele, mas que agora é constante quando o assunto é água: trata-se do instrutor Pedro Henrique Almeida Weichert. Satisfeito com a evolução de Caio, o instrutor projeta um futuro promissor para o jovem.

"Ele tem ido muito bem. Estamos em uma caminhada e nos descobrindo a cada contato. Até então nunca tivemos um atleta na condição especial como é o caso do Caio, mas ele está em uma crescente. Ainda há alguns movimentos que exigem mais desenvolvimento, mas com o tempo e os ajustes necessários ele irá evoluir. O Caio não está mudando apenas a vida dele, também muda a minha e de todas as outras pessoas que estão aqui. O Caio nos mostra que qualquer problema que temos é pequeno perto do que ele faz para poder remar conosco e superar o que ele passou. Nos faz refletir sobre o que é de fato ter um problema na vida", apontou o instrutor.

AO LADO DO PAI

A família é um dos pilares na recuperação. É dentro da água que os laços entre Caio e o pai, Fabrício, se fortalecem. "Venho aprendendo muito mais com ele do que ensinando. Compartilhamos dos mesmos princípios, vivenciamos um dia por vez. É como remar, é uma a uma. Nessa trajetória que a vida nos impôs, estamos no intuito de superá-la sempre de peito aberto. Poder partilhar desses momentos com meu filho é sensacional", descreveu.

Caio e o pai, Fabrício, aproveitam a remada para um mergulho no mar de Vitória. (Arquivo Pessoal)

Além da canoagem, Caio também se aventura na natação e as primeiras experiências foram animadoras, como contou o fisioterapeuta do universitário. "O Caio é jovem, tem muita potência muscular e um biotipo que o favorece para o esporte. O professor de natação viu um potencial enorme nele. Também é uma alternativa que estamos analisando para ele, acrescentou Fernando.

O CASO

No dia 30 de março, Caio seguia de carro pela Rodovia do Sol em direção à Ponta da Fruta, onde se encontraria com um amigo, dono de um canil. Nas proximidades do cemitério Parque da Paz, bem perto de onde planejava chegar, o universitário foi atingido por um tiro nas costas. O autor do disparo é o policial Alex Lopes Neves. Em depoimento, o militar alegou ter discutido com Caio após ter levado uma fechada e disparou em seguida.

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Caio, por sua vez, nega ter discutido com o policial e afirmou ter se assustado com a presença do militar com uma arma em mãos e parado ao lado dele em um semáforo da Rodovia. Assustado, Caio acelerou o veículo e na sequência acabou atingido pelo disparo.

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