Publicado em 28 de março de 2021 às 12:00
- Atualizado há 5 anos
BRASÍLIA - A crise fiscal do país travou os planos do governo para a retomada do emprego em um momento em que a taxa de desocupação ▬ que chegou a 13,5% em 2020, pior média da história, segundo o IBGE ▬ não dá sinais de arrefecer. >
Enquanto isso, cresce a pressão de empresários por iniciativas que reduzam custos operacionais, especialmente em um momento de forte aceleração da pandemia, com aumento do número de cidades que adotaram medidas restritivas e de isolamento social. >
A limitação no Orçamento não só atrasou a apresentação de ações emergenciais para mitigação do efeito da crise na economia, como também prejudica propostas para estimular contratações de forma permanente.>
A equipe econômica tem quatro planos prioritários para evitar cortes de vagas e estimular contratações: o programa que permite suspensão de contratos e corte de jornadas e salários, com compensação paga ao trabalhador pelo governo, a carteira verde e amarela, o Imposto de Renda negativo e a redução linear de encargos trabalhistas.>
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Essas medidas estão atrasadas ou totalmente travadas por causa de dificuldades orçamentárias.>
No plano emergencial, o governo está há quase três meses se preparando para relançar o programa que permitiu corte de jornadas e salários e suspensão de contratos. No ano passado, sob vigência do estado de calamidade pública e com a retirada de amarras do Orçamento, foram liberados quase R$ 52 bilhões para essa finalidade, dos quais R$ 33,5 bilhões foram gastos.>
A equipe do ministro Paulo Guedes chegou a estudar uma reformulação do programa. Para compensar os gastos, a ideia era reduzir pagamentos do seguro desemprego e usar recursos do FAT (Fundo de Amparo ao Trabalhador), mas o plano foi barrado pelo presidente Jair Bolsonaro (sem partido).>
Agora, a equipe econômica retomou a ideia de custear o programa com recursos do Tesouro. Como a margem é baixa e há disputa por recursos, o estado de calamidade não foi reeditado em 2021, tornando o Orçamento para o ano enxuto, uma opção levantada é a de usar créditos extraordinários, autorizados em situações de comprovada urgência e que não são contabilizados no teto de gastos (regra que limita a despesa do governo à variação da inflação).>
A pasta aguardava a votação do Orçamento de 2021 no Congresso para avaliar a forma de financiamento. Como os parlamentares aprovaram o texto na quinta-feira (25), é possível que uma medida provisória com o programa seja apresentado na próxima semana.>
O presidente-executivo da Abrasel, entidade que representa bares e restaurantes, duas das atividades mais atingidas pela crise, Paulo Solmucci, afirma que o setor aguarda a reedição do programa desde janeiro, quando se reuniu com Bolsonaro e Guedes.>
"Naquela reunião, o presidente saiu com o compromisso de entregar a solução em 15 dias, mas passaram dois meses e ela [a MP] ainda não saiu. Muitas empresas que fecharam em março poderiam estar funcionando se tivessem soltado a medida no tempo prometido", disse.>
Segundo ele, a situação do setor é tão complicada que uma grande parcela das empresas não conseguirá pagar salários a partir de abril, nem terá dinheiro para pagar rescisões.>
Para o pesquisador Bruno Ottoni, do iDados e do Ibre/FGV (Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getulio Vargas), a reedição do programa é bem-vinda, mas o atraso deve fazer com que haja uma maior destruição de vagas formais em março do que aquilo que seria observado se a medida já estivesse em vigor.>
Faltou ao governo um esforço maior no final do ano passado para já aprovar o Orçamento deixando espaço para eventuais necessidades que surgissem ao longo deste ano, disse.>
Em relação aos programas permanentes, a avaliação de técnicos do governo é que não há recursos disponíveis para bancar as ações. Continua na gaveta, por exemplo, a carteira de trabalho verde e amarela. O modelo prevê a flexibilização de contratos trabalhistas e redução de custos com tributos para faixas salariais mais baixas com o objetivo de incentivar a inclusão de informais no mercado de trabalho.>
Para viabilizar a medida, o governo precisa encontrar uma fonte de recurso que compense a perda de receita com o corte de encargos.>
O programa chegou a ser lançado em 2019, visando jovens de 18 a 29 anos em primeiro emprego, mas a MP que o instituiu foi derrubada pelo Congresso durante uma fase de atrito com o Palácio do Planalto Para bancar o programa, o governo previa cobrar contribuição previdenciária sobre o seguro-desemprego, o que também gerou críticas.>
Com a carteira verde e amarela, o trabalhador teria contrato mais flexível e poderia prestar serviços por hora, com salário proporcional ao período trabalhado. Haveria a exigência de um piso a ser pago pela hora, mas, no fim do mês, a remuneração dessa pessoa poderia ser inferior a um salário mínimo.>
Um dos modelos em estudo pelo Ministério da Economia prevê uma interligação do programa a outra iniciativa que também está travada por falta de recursos: o Imposto de Renda negativo.>
A iniciativa, que seria batizada de BIP (Bônus de Inclusão Produtiva), alcançaria beneficiários de programas sociais e seria vinculada a cursos de qualificação. No início do ano, Guedes chegou a afirmar a interlocutores que o BIP seria o substituto do auxílio emergencial, mas depois recuou.>
A medida seria uma forma de complementar os ganhos de pessoas mais pobres. Como forma de formalizar trabalhadores, o governo se comprometeria a complementar essas remunerações.>
A pasta estuda alguns modelos. O pagamento poderia ser feito diretamente ao beneficiário, por meio de um vale, ou iria para uma espécie de fundo de Previdência para ser sacado no futuro.>
Os sistemas têm em comum a necessidade de uma fonte de financiamento. Além disso, repasses seriam contabilizados no teto de gastos, que não tem espaço.>
Para a equipe de Guedes, o plano de emprego ideal - e ainda mais remoto - seria uma desoneração ampla e linear da folha de salários dos trabalhadores. O programa teria custo elevado e a compensação defendida por Guedes, de criar um imposto sobre transações aos moldes da extinta CPMF, sofre com resistências dentro e fora do governo.>
O plano inicial era instituir uma alíquota de 0,2% para o novo tributo, com arrecadação anual de R$ 120 bilhões que seria direcionada ao novo programa.>
Em versão mais recente, a pasta passou a avaliar uma proposta mais enxuta, com alíquota de 0,1% e receita de R$ 60 bilhões. Nesse caso, haveria uma desoneração linear para todos os trabalhadores, mas apenas sobre um salário mínimo.>
Depois de barrar o tributo no início do governo, Bolsonaro chegou a autorizar que Guedes dialogasse sobre o tema com parlamentares. Por resistência das lideranças, a proposta acabou engavetada.>
Auxiliares do ministro avaliam que não há clima no Congresso para levar adiante essa proposta.>
Membros da pasta afirmam que não seria possível implementar o programa sem o novo imposto. E, como 2022 é ano eleitoral, a desoneração ampla de encargos trabalhistas no governo Bolsonaro pode ficar na promessa.>
"Eu não vejo a menor viabilidade. Desde o primeiro dia de governo, Guedes diz que as medidas virão, mas nós não trabalhamos mais com essa perspectiva", disse Solmucci.>
Para Ottoni, como o Orçamento do governo é restrito, é necessário aprimorar os mecanismos para avaliar o custo-benefício dos programas de emprego.>
"Em um contexto de pouco dinheiro, você quer que cada real gasto na política gere o maior efeito possível. E o problema é que o governo tem feito muito pouco disso", afirmou.>
Benefício Emergencial (BEm)>
Programa emergencial que autoriza suspensão de contrato e redução de jornada e salário de trabalhadores, com compensação parcial paga pelo governo às pessoas afetadas>
Situação - Sem Orçamento, relançamento do programa atrasou. Equipe econômica chegou a avaliar programa com menor custo, cortando gastos do seguro desemprego, mas ideia foi barrada por Bolsonaro. Agora, medida deve ser editada com despesa fora do teto de gastos>
Carteira Verde a Amarela>
Contrato de trabalho mais flexível, com autorização para prestação de serviços por hora e remuneração proporcional ao período trabalhado. Alcançaria trabalhadores de baixa renda, que teriam custo de contratação reduzido>
Situação - Modelos do programa passam por avaliação no Ministério da Economia, mas faltam recursos para compensar a perda de arrecadação. Ainda não há previsão de lançamento>
Imposto de Renda Negativo>
Trabalhadores de baixa renda receberiam uma espécie de complementação de salário pelo governo, com pagamento direto à pessoa ou a um fundo de Previdência>
Situação - Programa está indefinido porque carece de fonte de financiamento. Outro entrave é o teto de gastos, que poderia ser pressionado por esses repasses>
Desoneração ampla e linear de salários>
Plano para cortar encargos trabalhistas no país. Versão mais recente prevê que seja feita desoneração sobre um salário mínimo>
Situação - Compensação do programa depende da criação de um imposto de transações aos moldes da extinta CPMF, que sofre rejeição dentro e fora do governo. Não há plano para apresentação>
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