Thalles Contão é psicólogo clínico, existencialista, marido, pai, filho e humano, demasiadamente humano

É preciso olhar a realidade como ela é

No mundo real o sucesso não é uma chave, nem uma porta, muito menos uma sentimento. No mundo real o sucesso é alcançado por esforço pessoal, resignação psicológica e responsabilidade existencial

Publicado em 06/01/2021 às 05h00
Homem com expressão de cansaço
É fácil entender como a autoajuda atrapalha a vida das pessoas acessando suas fraquezas psicológicas advindas de uma cultura esteta e materialista. Crédito: shutterstock

J. pergunta: "Já tentei todos os processos possíveis de desenvolvimento pessoal, de imersões, congressos aos livros, mas ainda continuo estagnado, não sei o que fazer para virar a chave... Como mudo isto?" 

Caro leitor, se tem uma coisa absolutamente correta na sua questão é que precisa mesmo mudar isto! Acredite, tal possibilidade emergida diante de tantos processos fantasiosos que prometem o "céu" por mágica, é quase milagre. Mas tomemos como base uma hipótese, a de que você não se tornou ainda cético sobre estas "revoluções" de vida e ainda espera o dia em que o universo conspirará a seu favor. Vou jogar um balde de água gelada dizendo apenas a verdade: não existe chave a ser virada - pelo menos não a que você paga para nunca encontrar.

Querido amigo, perceba, há uma indústria crescente que fomenta em nós uma negação diária da realidade dizendo ser na verdade a construção de uma esperança, e se movimentam milhões na indústria da autoajuda criando um exército de pessoas que, buscando melhorar, ficam cada vez mais frágeis. E como isto acontece? Esta é a pergunta que deveríamos fazer!

É fácil entender como a autoajuda atrapalha a vida das pessoas acessando suas fraquezas psicológicas advindas de uma cultura esteta e materialista. Hoje, sucesso existencial é ter dinheiro e ser desejado; ou ter dinheiro para ser desejado; ou que, sendo desejado, eu consiga dinheiro. Em suma, sucesso é vaidade e cobiça com uma liga de egoísmo. É um universo fértil para crianças emocionais.

Ser uma criança emocional é alimentar a falsa crença de que sou um ser individual especial, único e pleno. É ter tudo aquilo que uma criança deseja gozar no ambiente materno. É segurança diante da adversidade, da dificuldade e do perigo. Ou seja, é se abraçar à crença de que todos os meus erros são passíveis de compreensão e de que todos os meu atos são dignos de palmas como um infante que sorri diante da aprovação dos pais por acertar uma palavra.

Vamos combinar caro leitor, a infância de fato ou desejo é sempre um espaço de prazeres: pleno amor, zero responsabilidade. É justamente suscitando estas memórias infantis, reais ou idealizadas de desejos não conclusos, que a indústria do "novo" desenvolvimento pessoal faz: ela é indulgente com você, diante de um mundo que te exige dever.

Não é difícil entender porque sua chave não vira, e aposto que um destes gurus já deve ter te dito que o problema era que você não acreditava de verdade... que você ainda não tinha atingido o ponto! E isto seria engraçado se não fosse trágico como potencial destrutivo de uma pessoa. Porque hoje, a crença em um Deus pessoal foi substituída pela crença de que a pessoa pode ser um deus. A esperança de um paraíso celeste virou a busca por um conto de fadas terrestre.

Você ainda não tentou de tudo, porque ainda não tentou olhar a realidade como ela é, e acredite, o sucesso está lá te esperando. Todavia meu amigo, no mundo real o sucesso não é uma chave, nem uma porta, muito menos uma sentimento acessado de forma mágica numa dimensão maravilhosa e pseudocientífica. No mundo real o sucesso é alcançado por esforço pessoal, resignação psicológica e responsabilidade existencial. No mundo real, caro leitor, você não vira chaves, você constrói portas!

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