Crítico de cinema e apaixonado por cultura pop, Rafael Braz é Jornalista de A Gazeta desde 2008. Além disso é colunista de cultura, comentarista da Rádio CBN Vitória e comanda semanalmente o quadro Em Cartaz

"Hora de Vencer": série do Lakers na HBO Max ignora a verdade

"Lakers: Hora de Vencer", sucesso da HBO Max, muda histórias, personalidades e resultado de jogos para "contar" história do Lakers dos anos 1980

Vitória
Publicado em 22/04/2022 às 13h55
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Série "Lakers: Hora de Vencer", da HBO Max. Crédito: HBO Max/Divulgação

O Los Angeles Lakers dos anos 1980 foi um dos maiores times da história do esporte profissional. O time revolucionou a maneira de se jogar basquete e é considerado um dos salvadores da NBA, liga que passava por crise de popularidade, com alto consumo de drogas entre jogadores e conflitos raciais.

Neste cenário, foi o show proporcionado jogo após jogo pelo Lakers de Kareem Abdul-Jabbar e Magic Johnson, dois dos maiores jogadores da história do esporte, comandados por Pat Riley, um dos maiores técnicos, que levou o público de volta ao ginásio - o time, inclusive, foi eternizado na música “Magic Johnson”, gravada pelo Red Hot Chili Peppers no clássico álbum “Mother’s Milk”.

“Lakers: Tempo de Vencer”, série produzida por Adam McKay (“Não Olhe Para Cima”) para a HBO Max, tem vários acertos, principalmente na estética da ambientação e nos costumes do início dos anos 1980, mas deixa de lado um dos pilares essenciais em uma trama que pretende se vender como uma história baseada em fatos, a verdade.

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Série "Lakers: Hora de Vencer", da HBO Max. Crédito: HBO Max/Divulgação

No sétimo episódio, por exemplo, o Los Angeles Lakers parte para uma viagem próxima ao Natal na qual enfrenta Indiana Pacers e Detroit Pistons antes do grande desafio, o Boston Celtics, um duelo que, na série, é o primeiro encontro de Magic Johnson e Larry Bird como profissionais após anos rivalizando no basquete universitário. Essa viagem não existiu dessa forma, tendo sido realizada mais à frente na temporada, o jogo com os Celtics não foi o primeiro duelo de Magic e Bird na liga, e a construção do ex-ala dos Celtics é risível. Ainda assim, é compreensível a ideia do texto reunir jogos em um episódio para explorar bem núcleos distintos.

A série, no entanto, se distancia dos fatos ao alterar resultados e acontecimentos dos jogos. “Tempo de Vencer” mostra o Lakers perdendo os jogos para Detroit e Indiana, quando, na verdade, ambos foram vencidos pela equipe de Los Angeles. A vitória contra o Boston foi por 100 a 98, não por 99 a 98, como mostrado na série; ainda, o jogo foi decidido por dois lances livres de Norm Nixon, e não por uma bandeja dramática de Michael Cooper - a partida pode ser conferida na íntegra no YouTube.

As alterações dos jogos são claramente realizadas para fins dramáticos, pois a série constrói o técnico Paul Westhead como um paspalho nos momentos em que substitui o acidentado Jack McKinney. A verdade é que Westhead foi um sucesso imediato, dando continuidade ao estilo de jogo de seu mentor (que realmente sofreu um acidente de bicicleta, mas que não ficou tanto tempo em coma) e até criando novas jogadas que consagraram o Lakers naquela década. É importante ressaltar que todo o arco criado pelo roteiro sobre Westhead possivelmente ser substituído por Elgin Baylor é fictício e nunca aconteceu.

Outra retratação incômoda é a do lendário Jerry West. O ex-jogador e treinador sempre foi aberto em sua luta contra a depressão, mas nunca foi a figura explosiva criada para a série, que quebrava tacos de golfe e atirava seus troféus de MVP da liga, quase  desprezando-os. “Tempo de Vencer” utiliza West como alívio cômico - não à toa, ele solicitou que a HBO faça uma retratação oficial.

Vários ex-jogadores saíram em defesa de West, inclusive Kareem Abdul-Jabbar. O histórico pivô escreveu um longo artigo sobre as incongruências da série, dando destaque às péssimas construções dos personagens. De fato, “Hora de Vencer” abusa das caricaturas e de personagens unidimensionais; Magic Johnson é um boa praça mulherengo e genial enquanto Kareem é o veterano intocável e cheio de pompa. A ideia do texto é obviamente mostrar como o time foi tão importante a ponto de desconstruir essas personalidades e esse conflitos.

Outro ponto conflituoso é a maneira como a série trata Jeanie Buss, filha do fanfarrão Jerry Buss, o megalomaníaco “entrepreneur” que compra o Lakers e inicia a revolução. A série mostra Jeannie imediatamente trabalhando na organização quando, na verdade, isso só ocorreu depois dela estudar e se formar - Jeanie comandou o Los Angeles Strings, uma popular franquia de tênis, antes de se enveredar pelo basquete.

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Série "Lakers: Hora de Vencer", da HBO Max. Crédito: HBO Max/Divulgação

O grande problema da série produzida por Adam McKay é que existe ali uma história incrível e cheia de drama, mas não é ela que “Hora de Vencer” leva para a tela. É desastroso como os produtores optaram por contar uma melodramática história fictícia ao invés de optar pelos fatos que exploram de maneira equivocada, algo que ocorreu também com “Bohemian Rhapsody”, sobre o Queen - filme que inventa situações para potencializar o drama da Freddy Mercury.

Ao tentar “homenagear” os Lakers dos anos 1980, “Lakers: Hora de Vencer” conseguiu irritar os ex-jogadores e qualquer um que conheça a história. Para os que estão tendo contato com ela pela primeira vez, é bem provável que a série funcione. O estilo narrativo de McKay, a quebra constante da quarta parede para fins didáticos (em excesso) e a edição problemática caíram no gosto da audiência, mas a falta de apreço pela verdade em uma história baseada em fatos é crucial.

Aqui, para encerrar, fica a dica para quem quer conhecer a história mais próxima da realidade: a AppleTV+ lançou nesta sexta (22) o documentário “Eles me Chamam de Magic Johnson”, que, ao acompanhar a jornada de Magic Johnson, mostra o “Showtime Lakers” de maneira muito mais real do que “Lakers: Hora de Vencer”.

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