Publicado em 4 de maio de 2023 às 19:40
BRASÍLIA - O Supremo Tribunal Federal formou maioria nesta quinta-feira (4) para derrubar a graça concedida pelo ex-presidente Jair Bolsonaro ao ex-deputado Daniel Silveira, condenado a 8 anos e 9 meses de prisão por ataques à Corte máxima. O placar está em 6 a 2 para declarar inconstitucional o 'perdão' de Bolsonaro a seu aliado, nos termos do voto da relatora, ministra Rosa Weber.>
Acompanharam Rosa os ministros Alexandre de Moraes, Edson Fachin, Luís Roberto Barroso, Dias Toffoli e Cármen Lúcia. Eles apresentaram votos marcados por recados não só a Silveira, mas à base aliada do ex-presidente, em especial os investigados pelos atos golpistas do dia 8 de janeiro.>
Os votos divergentes foram dados pelos ministros Kassio Nunes Marques e André Mendonça, indicados por Bolsonaro ao STF. Eles defenderam a validade do decreto do ex-presidente, destacando a discricionariedade do então chefe do Executivo para editá-lo e ressaltando que trata-se de um instituto político.>
"Entendo, até pelo contexto, que a concessão da graça teve um efeito de pacificação, ainda que circunstancial e momentâneo. Não excluo eventuais finalidades que nós possamos questionar, mas também não posso excluir razões políticas que em tese justificariam a concessão do instituto", indicou Mendonça.>
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Ele e Kássio estão isolados, por enquanto. O julgamento ainda será retomado para os votos de Luiz Fux e Gilmar Mendes.>
O primeiro ministro a acompanhar a ministra Rosa Weber na sessão desta quinta-feira (4) foi Alexandre de Moraes, que ponderou que o decreto de Bolsonaro atenta contra cláusulas da Constituição, em especial quanto à separação de Poderes, além de conter 'desvio de finalidade claro'.>
Segundo Alexandre, relator da ação na qual Silveira foi condenado, a graça do ex-presidente é um 'ataque direto e frontal' ao Poder Judiciário.>
"São coisas diversas, um indulto coletivo, de política criminal, e um indulto individual, como o concedido por Getúlio Vargas a desertor do Exército, com um simples 'concedo indulto' e acabou. Podemos concordar ou não. Agora, o indulto que pretende atentar, insuflar e incentivar a desobediência às decisões do Judiciário é um indulto atentatório à cláusula pétrea", advertiu Alexandre.>
Segundo ele, há uma 'limitação constitucional implícita' para a edição do decreto de Bolsonaro, a mesma que existe para um eventual indulto a crimes atentatórios ao estado democrático. "Seria possível o Supremo aceitar um indulto a todos os eventualmente condenados pelos atos de 8 de janeiro, atentados contra a democracia?", questionou.>
Já o desvio de finalidade do decreto, segundo Alexandre, está disposto no próprio texto, em 'justificativa que não corresponde à realidade'.>
"Veja os últimos considerandos (do decreto). 'Considerando que a sociedade se encontra em comoção'. Talvez uma outra sociedade, paralela, nas redes sociais", assinalou o ministro, com um tom de ironia.>
Em voto breve, Fachin destacou que o indulto tem que 'ter um corpo interno de coerência'. "Desbordando disso, há uma desobediência constitucional. Trata-se de um ato írrito e inconstitucional, portanto nulo", ressaltou.>
Barroso também seguiu Rosa: "De forma inusitada, o presidente concedeu a graça no dia seguinte ao julgamento no Supremo, deixando clara, inclusive em reunião, a afronta que pretendeu fazer ao Judiciário. Um desrespeito, um descrédito que se pretende trazer às instituições como um projeto.">
O ministro considerou que o decreto violou a separação dos Poderes, considerando seu 'açodamento' e suas justificativas. Segundo Barroso, o então presidente Bolsonaro 'julgou o mérito da decisão do Supremo, se arvorou na condição de 'juiz dos juizes' para dizer 'os juízes estão errados, eu que estou certo e portanto vou dar indulto'.>
Barroso ainda rechaçou alegações de que o Supremo teria ferido a liberdade de expressão ao condenar Silveira. O ministro qualificou as declarações do ex-deputado como 'prenúncio do golpe'. Segundo ele, 'ali estava a incitação do 8 de janeiro, o embrião do que estava para vir'.>
O magistrado destacou que é preciso deixar claro, 'para as pessoas de boa fé', que 'não há vestígio de liberdade' nas falas de Silveira, mas sim 'agressão, ofensa, incitação à violação das instituições e preparação de um golpe de estado'.>
"As pessoas que falam em 'Deus, Pátria e Família' não podem pactuar com isso. Deviam, se tiverem dúvida, reunir a família na sala, invocar a proteção de Deus e exibir o vídeo que motivou a condenação. Ai, se acharem que está bem, após ver o video, dizer: 'esse é o País que nós temos, antidemocrático, com animosidade entre civis e militares e linguagem chula e grosseira que mais parecia um esgoto a céu aberto"', afirmou, em duro recado.>
Toffoli também acompanhou a relatora, destacando que crimes atentatórios aos Estado de Direito, implicitamente, não podem ser objeto de graça e indulto. Assim como Alexandre de Moraes, o magistrado destacou que os atos golpistas do dia 8 de janeiro, por exemplo, são insuscetíveis de perdão.>
Rosa Weber, relatora, votou pela inconstitucionalidade do decreto de Bolsonaro um dia depois de Daniel Silveira ser condenado pelo STF. A presidente da Corte deu seu voto na sessão plenária desta quarta-feira (3), horas após a Polícia Federal bater à porta de Bolsonaro em investigação sobre supostas fraudes em sua carteira de vacinação contra a Covid-19.>
Rosa viu 'desvio de finalidade' no perdão de Bolsonaro ao aliado. Na avaliação da ministra, o ex-presidente usou sua competência para conceder benefício 'de forma absolutamente desconectada do interesse público'. "A verdade é que o fim almejado com o decreto de indulto foi beneficiar aliado político de primeira hora, legitimamente condenado pelo STF", ressaltou.>
A relatora viu ofensa aos princípios da impessoalidade e da moralidade administrativa. Para ela, a conduta de Bolsonaro, de conceder perdão 'por simples vínculo de afinidade político-ideológico', 'revela uma faceta autoritária e descumpridora da Constituição Federal, pois faz prevalecer os interesses pessoais dos envolvidos em contraposição ao interesse estatal'.>
Segundo Rosa, 'não pode criar no entorno da concessão de indulto um círculo de virtual imunidade penal'. "Não se pode aceitar a instrumentalização do Estado, de suas instituições e de seus agentes para, de modo ilícito, ilegítimo e imoral, obter benefícios de índole meramente subjetivos e pessoais, sob pena de subversão dos postulados mais básicos do estado democrático de direito", ressaltou a ministra.>
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