> >
Sonorizador de banda na boate Kiss diz que errou ao desligar microfones

Sonorizador de banda na boate Kiss diz que errou ao desligar microfones

"Quando o outro rapaz [que não era da banda] sobe no palco, eu não tenho a dimensão do que está acontecendo e eu desabilito o áudio. Eu desabilitei. Errei. Errei. Mas desabilitei o áudio", disse Venâncio

Publicado em 7 de dezembro de 2021 às 16:32

Ícone - Tempo de Leitura 4min de leitura
Boate Kiss, em Santa Maria, deixou 242 pessoas mortas
Boate Kiss, em Santa Maria, deixou 242 pessoas mortas. (Daniel Marenco/Folhapress)

Responsável por operar o som da banda Gurizada Fandangueira, que tocava na boate Kiss quando houve a tragédia que terminou com 242 mortes, o sonorizador Venâncio da Silva Anschau, 40, disse ter sido o responsável por desligar os microfones em meio ao incêndio. Ele deu a declaração nesta terça-feira (7) durante o julgamento do caso, em Porto Alegre, no Rio Grande do Sul.

"Quando o outro rapaz [que não era da banda] sobe no palco, eu não tenho a dimensão do que está acontecendo e eu desabilito o áudio. Eu desabilitei. Errei. Errei. Mas desabilitei o áudio", disse ele, chorando, ao juiz Orlando Faccini Neto.

A questão sobre ter sido anunciado ou não o incêndio ao público da boate tem sido colocada em questão em depoimentos ao longo do júri.

Anschau é um dos sobreviventes da tragédia. Ele contou que ficou cinco dias hospitalizado, sendo internado alguns dias depois do incêndio, e que, até hoje, não consegue falar nem com a família sobre o que ocorreu naquela madrugada de janeiro de 2013.

O sonorizador foi a 21ª pessoa ouvida pelo júri que julga as acusações de homicídio e tentativas de homicídio simples por dolo eventual contra quatro réus. Estão sendo julgados Elissandro Spohr e Mauro Hoffmann, sócios-proprietários, e os integrantes da banda, Marcelo de Jesus dos Santos (vocalista) e Luciano Bonilha Leão (assistente de palco).

Chegando ao sétimo dia, nesta terça (7), o júri já se tornou o mais longo do Judiciário gaúcho, passando o julgamento pela morte do menino Bernardo Boldrini, em 2019. O caso da boate Kiss foi desaforado de Santa Maria para Porto Alegre a pedido de defesas, que questionaram se a cidade onde ocorreu a tragédia poderia ter júri imparcial.

Em seu depoimento, Anschau contou que a banda estava tocando e que estava concentrado em seu trabalho na mesa de som quando a música parou. Ele checou se havia algum problema com o equipamento e, quando não encontrou nada, olhou para o palco e viu os músicos se movimentando, gesticulando com garrafas d'água, olhando para o teto e uma pessoa de fora subindo, mas não entendia o que estava acontecendo.

"Quando essa pessoa sobe no palco, eu já fecho os microfones da frente, porque não estava entendo o que estava acontecendo. Eu fico olhando para onde eles olhavam e vejo um princípio de incêndio bem pequeno", contou ele.

Anschau afirmou que, quando percebeu que não estavam conseguindo combater o fogo ou diminuir, começou o pavor, deixou sua mesa e chamou o DJ conhecido como Bolinha, Lucas Cauduro Peranzoni, para que saíssem do local - o DJ depôs na quinta-feira (2). Lucas saiu mais tarde; Anschau relatou que saiu no início, mas já havia pessoas na rua em frente à boate.

O sonorizador confirmou que a banda costumava usar artefatos pirotécnicos em seus shows, embora ele não se envolvesse com essa parte, e que já haviam sido utilizados em apresentações na Kiss. Ele disse que, até onde sabia, o artefato usado era do chamado "fogo frio", recomendado para uso em espaços internos.

Anschau foi questionado ainda pelo Ministério Público sobre um depoimento que deu na época da tragédia no qual contou que Elissandro Spohr, sócio da boate e um dos réus, teria sugerido aos organizadores do grupo que o efeito de pirotecnia tivesse um tempo maior de duração nas apresentações da Gurizada Fandangueira, pois era o ápice da apresentação. No depoimento da época consta ainda que a banda nunca foi orientada a não usar artefatos pirotécnicos na Kiss.

Nesta terça, ele disse se lembrar de uma conversa entre Spohr e Danilo, gaiteiro da banda e apontado como responsável pelos contratos, que morreu na tragédia, sobre mudanças para que conseguissem ser melhor aceitos em boates. A Gurizada Fandangueira começou tocando em CTGs (Centros de Tradições Gaúchas).

"Ele [Elissandro] sugere outro nome para ficar mais condizente com casas, com boates, ele sugere uma banda mais compacta e mais efeitos. Eu perguntei para o Danilo depois o que ele havia falado, o Danilo disse: o nome não se troca de jeito nenhum, os componentes são os mesmos, não vou reduzir de jeito nenhum, eu vou só ver essa questão dos efeitos. Eu subentendi que ele iria trabalhar com mais efeitos após eles conversarem", afirmou o sonorizador.

Venâncio afirmou ainda que achava que a mudança não havia sido implementada nas apresentações seguintes e que nunca soube de restrições ao uso de fogos na Kiss.

Nesta terça, outras três pessoas serão ouvidas: a arquiteta Nívia da Silva Braido (chamada pelo Ministério Público), Gerson da Rosa Pereira (defesa de Spohr), ex-chefe do Estado-maior do 4° Comando Regional dos Bombeiros de Santa Maria, e Nilvo José Dornelles (defesa de Marcelo).

Este vídeo pode te interessar

Notou alguma informação incorreta no conteúdo de A Gazeta? Nos ajude a corrigir o mais rapido possível! Clique no botão ao lado e envie sua mensagem

Envie sua sugestão, comentário ou crítica diretamente aos editores de A Gazeta

A Gazeta integra o

The Trust Project
Saiba mais