Publicado em 15 de outubro de 2024 às 15:10
BRASÍLIA, DF (FOLHAPRESS) - O governo do presidente Lula (PT) ingressou com ações na Justiça para retirar de apartamentos funcionais da União ex-integrantes da gestão Jair Bolsonaro (PL) que se recusaram a deixar os imóveis após serem exonerados.>
Há casos de profissionais que passaram a atuar em outros poderes, governos locais e até mesmo quem nem vive mais em Brasília, mas mantém sua família no imóvel.>
Segundo o governo, pelo menos cinco casos chegaram às últimas instâncias administrativas ou tiveram decisão judicial pela expulsão do apartamento. Outros ainda estão em fase recursal dentro da administração pública.>
De acordo com a legislação, têm direito a um imóvel da União funcionários em cargos de confiança de alto escalão, com salários a partir de R$ 11 mil e que não sejam proprietários ou casados com alguém que tenha casa própria no Distrito Federal. Todos os apartamentos ficam no Plano Piloto, em áreas nobres da capital.>
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Quando o servidor for exonerado ou dispensado do cargo que lhe dá direito ao apartamento, deve devolvê-lo no prazo de 30 dias.>
Uma das ações na Justiça envolve Bruno Schettini Gonçalves, que foi da equipe de Paulo Guedes, no cargo de diretor de articulação institucional da Secretaria Especial de Desestatização, Desinvestimento e Mercados do então Ministério da Economia.>
Ele atualmente mora no Rio de Janeiro, onde é subsecretário do Tesouro da gestão Cláudio Castro (PL) desde janeiro de 2023.>
A União chegou a obter uma liminar no TRF-1 (Tribunal Regional Federal da 1ª Região) determinando a reintegração de posse, com o argumento de que Gonçalves estava cedido para o governo do Rio e havia recebido ajuda de custo para se mudar com a família.>
A liminar, no entanto, foi revertida no fim de agosto. Gonçalves, que é originalmente da Polícia Rodoviária Federal, afirma que a ajuda de custo é apenas um de seus direitos. Argumenta ainda que a sua posição como servidor efetivo garante ter sua mudança paga pela União.>
A Justiça acatou o recurso e, agora, o caso aguarda julgamento. À reportagem ele diz que uma de suas filhas, que é maior de idade, permaneceu em Brasília para cuidar dos móveis da família. Depois, sua esposa e outros filhos decidiram retornar para a capital federal.>
Ele acrescenta que a União cobra dele uma dívida de cerca de R$ 250 mil por permanecer no imóvel.>
"Eu trabalhei em alguns estados da federação, com a União me mandando para resolver problemas. Eu me mudei umas cinco, seis vezes. A União pagou a minha mudança uma vez, as outras eu paguei tudo do meu bolso. Então, assim, chegou um ponto que eu fiquei fulo da vida, eu falei: 'dessa vez eu não pago'", afirma.>
"Agora que eu estava na próxima mudança, a União quer me botar para fora. Eu falo: 'me bota para fora, mas com o caminhão de mudança e não com a polícia me dando porrada no ombro e tirando do apartamento'. Não tem cabimento. A lei me protege, diz que eles têm que pagar a minha mudança".>
O Ministério da Gestão e da Inovação em Serviços Públicos, responsável por administrar uma parte dos apartamentos funcionais, não quis comentar situações específicas.>
Em nota, afirmou que quem ocupa irregularmente apartamentos funcionais é notificado pela Secretaria do Patrimônio da União e está sujeito a multa e inscrição na dívida ativa da União.>
Um dos casos em fase final de procedimento é o de Uiara Couto de Mendonça, que desde dezembro de 2023 é subsecretária de Apoio a Vítimas de Violência na Secretaria de Justiça do Distrito Federal.>
A revogação da permissão para que ela ocupe um apartamento na Asa Norte foi publicada na quinta-feira (3) no Diário Oficial da União. Agora, se ela se recusar a deixar o imóvel, deve ser acionada na Justiça.>
Ela permaneceu pouco mais de um mês no governo federal. Foi nomeada em 6 de dezembro de 2022, para a Secretaria Nacional do Cadastro Único, no extinto Ministério da Cidadania. Teve direito a um apartamento funcional em 15 dias.>
Em 24 de janeiro de 2023, foi exonerada pelo ministro Wellington Dias (Desenvolvimento e Assistência Social).>
Em nota enviada antes de o governo oficializar que ela deveria devolver o apartamento, a subsecretária afirmou que a ocupação do imóvel era legal, pois ela passou a ter outro cargo em comissão.>
Citou normas que, em sua leitura e na de seus advogados, garantiriam a ela o direito, considerando que sua função no Governo do Distrito Federal tem correlação com os postos listados em uma portaria de 2019 — que faz uma equivalência entre cargos federais e em outros poderes e entes federados.>
Após a revogação, ela disse não foi notificada e que iria analisar a situação.>
No mês passado, a União obteve a reintegração de posse do apartamento que era ocupado por Luciana Coutinho Leite Barboza Simões, em um processo que durou mais de 20 meses. Ela se mudou dias depois.>
Na gestão passada, ela atuava dentro do Planalto como assessora especial da Secretaria de Governo, comandada por Célio Faria, que é próximo a Bolsonaro. Após ser exonerada, deveria ter deixado o apartamento no fim de janeiro de 2023.>
Ela, no entanto, pediu a prorrogação do prazo para a entrega do imóvel sob o argumento de que tem um filho de 19 anos com transtorno do espectro autista nível 2 (há três gradações).>
"Quando Bolsonaro perdeu a eleição, eu e muitas pessoas tivemos depressão. Eu nunca tinha tido depressão na vida e fiquei muito mal", diz. "Talvez por conta disso, ele, porque os autistas são muito sensitivos, têm uma sensibilidade aguçadíssima, meu filho, que estava bem até então, começou a ficar mal, a ficar agressivo".>
Ela diz que apresentou cinco laudos médicos sobre a condição de seu filho para a Presidência.>
Na decisão liminar, o juiz afirma que a ex-servidora dispôs de prorrogações de prazo, em vista de sua situação, "de forma que estava plenamente ciente de sua obrigação e teve amplo lapso temporal para tomar as providências necessárias, decidindo, no entanto, por ignorar as comunicações posteriores do ente público proprietário do imóvel".>
As regras para a cessão de apartamentos funcionais da União são regidas por um decreto de 1993. O pedido para ocupação deve ser feito pela autoridade máxima do órgão de lotação do servidor, por meio de ofício ao Ministério da Gestão.>
O processo não é automático e há uma fila de espera. Cabe ao morador pagar taxa de ocupação, condomínio e outras despesas referentes ao uso do imóvel.>
Uma pesquisa feita pela reportagem em portais de imobiliárias dá conta que apartamentos em quadras dos casos mencionados têm alugueis que variam de R$ 4.500 a R$ 7.800.>
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