Publicado em 8 de março de 2022 às 08:15
A Mesa da Câmara dos Deputados, presidida por Arthur Lira (PP-AL) e composta por outros seis deputados titulares, tem segurado na gaveta pedidos de punição a parlamentares de partidos que integram a base governista, sendo que um deles está há mais de dois anos aguardando uma mera canetada para começar a tramitar.>
Ao mesmo tempo em que não se move em relação a esses parlamentares, Lira indica que dará prioridade ao caso envolvendo o deputado Kim Kataguiri (União-SP), adversário político e crítico do governo Jair Bolsonaro, que, em uma entrevista, disse ter sido um erro a Alemanha ter criminalizado o partido nazista.>
O caso mais antigo se refere ao deputado Wilson Santiago, que, em 2019, teve o mandato suspenso por ordem do STF (Supremo Tribunal Federal) nas investigações de desvio de verbas públicas de obras contra a seca no sertão da Paraíba.>
A denúncia feita pelo Ministério Público trazia fotos de ações policiais controladas que mostrariam pagamento de propina no apartamento do deputado e em seu gabinete na Câmara, além de imagens de um prefeito aliado supostamente enfiando maços de dinheiro na cueca.>
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O plenário da Câmara, presidida à época por Rodrigo Maia (sem partido-RJ), derrubou a decisão do STF e restabeleceu o mandato de Santiago. O discurso dos parlamentares, na ocasião, foi o de que o caso seria tratado pela instância adequada, o Conselho de Ética da Câmara. Para isso, era preciso apenas que a Mesa da Câmara encaminhasse a representação ao Conselho, órgão que poderia propor penalidades que não de advertência à cassação do mandato.>
Só que essa mera formalidade não aconteceu até hoje. No último ano da gestão de Maia, a pandemia de Covid-19 deixou o colegiado e as demais comissões da Câmara inativos. No mandato de Lira, que teve início em fevereiro do ano passado, a representação também não andou.>
Outro caso parado na Mesa da Câmara há oito meses se refere a recomendações do Conselho de Ética para suspensão do mandato do bolsonarista Daniel Silveira (União-RJ), que foi preso em fevereiro do ano passado por ordem do ministro Alexandre de Moraes, do STF, por ter publicado na internet um vídeo com ataques a ministros da corte - Moraes, por exemplo, era chamado de "Xandão do PCC".>
São duas as punições decididas pelo conselho, mas elas dependem do aval do plenário para serem aplicadas. A maior, de suspensão de seis meses do mandato, foi deliberada justamente pelos vídeos com xingamentos a ministros do STF.>
Há ainda outra suspensão de dois meses que tem como origem a gravação clandestina, pelo bolsonarista, de uma reunião interna do PSL durante a crise que rachou o partido no primeiro ano do governo de Jair Bolsonaro. Em outubro de 2019, o ex-PM divulgou o encontro, durante o qual o deputado Delegado Waldir (PSL-GO), então líder do partido na Câmara, chamou o presidente Jair Bolsonaro de "vagabundo".>
Waldir integrava a ala do PSL alinhada ao presidente da sigla, o também deputado federal Luciano Bivar (PE), que foi alvo de Bolsonaro e de aliados em uma disputa pelo comando do partido.>
Cabe à Mesa colocar esses pareceres em votação no plenário, mas isso não ocorreu até agora - ainda não foi decidido se as duas punições serão cumulativas ou se será considerada a maior suspensão, de seis meses. Com isso, Daniel Silveira, que cumpre medidas cautelares, segue recebendo salário (R$ 33,8 mil) e cotas, como os R$ 112 mil mensais para contratação de assessores.>
Outros casos parados na Mesa da Câmara são o de Josimar Maranhãozinho (PL-MA), suspeito de desvio de recursos de emendas para a Saúde, de Bia Kicis (União-DF), por divulgação de dados de médicos favoráveis à vacinação infantil, e de Evandro Roman (Patriota-PR), que teve o mandato cassado pelo Tribunal Superior Eleitoral em novembro por infidelidade partidária.>
Nesse último caso, cabe à Câmara, pela Constituição, apenas efetivar a perda do mandato, mas isso não ocorreu até agora.>
Questionado por jornalistas no último dia 22 sobre o caso de Daniel Silveira, Arthur Lira não deu uma definição clara, mas citou especificamente o caso de Kataguiri, que é do mês passado, o mais recente a chegar à Mesa da Câmara. "Tem muita coisa aí que está esperando, inclusive a remessa do Kim Kataguiri para o Conselho de Ética também está parada. Nós precisamos reunir a mesa para deliberar sobre isso", disse.>
Em 7 de fevereiro, Kataguiri participou do podcast Flow ao lado do podcaster Monark (Bruno Aiub) e da deputada Tabata Amaral (PSB-SP). No programa, Monark defendeu o direito de existência de um partido nazista. Tabata Amaral rebateu o podcaster. Kim foi questionado por Tabata se achava errado a Alemanha ter criminalizado o nazismo. O deputado respondeu que sim.>
Kim e Arthur Lira são adversários desde que o fundador do MBL se posicionou contra a eleição do alagoano para a Presidência da Câmara, no início de 2021. Lira venceu o presidente do MDB, Baleia Rossi (SP), por 302 votos a 145.>
"Em pouco mais de dois anos de mandato, você já tem o presidente da República e os deputados bolsonaristas apoiando Arthur Lira para a Presidência da Câmara. Arthur Lira que é condenado em segunda instância, que só assumiu o mandato de deputado federal porque está com uma liminar no Tribunal de Justiça", afirmou Kataguiri em entrevista concedida em janeiro de 2021 ao programa "Papo Antagonista".>
Pouco tempo depois que Lira foi eleito, em 1º de fevereiro de 2021, o fundador do MBL escreveu em uma rede social: "Quanto custou os 302 votos de Arthur Lira para você, pagador de impostos? Você sabe? Considerando aqueles R$ 3 bilhões são quase R$ 10 milhões pra cada deputado. Eleger o candidato réu e condenado de Bolsonaro para a presidência da Câmara tem um preço que vai ser cobrado.">
Procurado pela reportagem, o presidente da Câmara disse não haver prazo específico que a Mesa tome essas decisões, "o que dependerá da complexidade de cada caso". "Os casos dos parlamentares citados são diferentes entre si, de complexidade diversa e se encontram em momentos distintos de análise.">
Especificamente sobre os mais de dois anos que o caso de Wilson Santiago está parado à espera de uma mera decisão de encaminhá-lo ao Conselho de Ética, Lira ressaltou que ele começou a tramitar na gestão de Maia. "O assunto está na pauta, mas a Mesa ainda não se reuniu para deliberar sobre a matéria", se limitou a dizer.>
O presidente da Câmara disse ainda não há decisão de como o plenário irá apreciar as representações contra Daniel Silveira (se ambas ou apenas a de maior pena), mas ressaltou que será no formato de projeto de resolução, que permite ao plenário alterar a pena recomendada pelo Conselho de Ética - e não só arquivar ou referendar.>
Kicis e Maranhãozinho não se manifestaram. A assessoria de Silveira lembrou que ele está impedido por Moraes de dar entrevistas. A defesa de Roman, que recorre no TSE, disse que o tribunal deveria rever a sua decisão.>
- Wilson Santiago (PTB-PB)>
O que: acusação de desvio de verbas de obras contra a seca no sertão da Paraíba Fase: Em fevereiro de 2020, os deputados derrubaram decisão do STF que havia afastado Santiago do mandato, sob o argumento de que o Conselho de Ética analisaria o caso. Mais de 2 anos depois, a Mesa ainda não encaminhou o processo para o colegiado.>
- Daniel Silveira (União Brasil-RJ)>
O que: gravação de reunião do PSL e ameaças e xingamentos a ministros do STF Fase: Conselho de Ética aplicou penas de suspensão do mandato em junho e julho de 2021, mas até hoje a Mesa da Câmara não levou o caso para o plenário, que tem a palavra final.>
- Josimar Maranhãozinho (PL-MA)>
O que: suspeito de desviar recursos de emendas para a Saúde. Fase: A Rede protocolou representação contra o parlamentar em dezembro. Até agora a Mesa não devolveu o caso para o Conselho de Ética dar início à tramitação>
- Bia Kicis (União Brasil-DF)>
O que: divulgação de dados de médicos favoráveis à vacinação infantil que participaram de audiência pública sobre o tema. Fase: PT protocolou representação contra ela em janeiro. Até agora, a Mesa não devolveu o caso para o Conselho de Ética dar início à tramitação>
- Evandro Roman (Patriota-PR) >
O que: cassação do mandato pelo TSE, por infidelidade partidária, em novembro Fase: a Mesa ainda não efetivou a cassação, embora caiba à Câmara apenas homologar a decisão>
- Kim Kataguiri (União Brasil-SP)>
O que: afirmação de que foi um erro a Alemanha ter criminalizado o partido nazista Fase: Aguarda Mesa enviar ao Conselho de Ética representações apresentadas em fevereiro por PP, PT e Eduardo Bolsonaro>
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