Publicado em 19 de abril de 2021 às 15:48
O governo dos EUA já traçou o roteiro que espera do discurso de Jair Bolsonaro durante a Cúpula de Líderes sobre o Clima, marcada por Joe Biden para os dias 22 e 23 de abril. Os americanos querem que Bolsonaro afirme que não vai mais tolerar o desmatamento ilegal no Brasil e apresente um plano concreto para diminuir os números de destruição das florestas no curto prazo, o que poderia incluir o aumento de verba para órgãos de fiscalização do meio ambiente. >
Como mostrou a Folha, o presidente brasileiro avalia anunciar mais recursos para agências como Ibama e ICMBio durante a cúpula de Biden, mas enfrenta resistência do Ministério da Economia, que não quer ampliar despesas em meio à pandemia e à crise fiscal.>
Interlocutores americanos dizem que querem ver no encontro mais do que apenas o compromisso de Bolsonaro de acabar com o desmatamento ilegal até 2030, como o brasileiro escreveu em carta para Biden na semana passada. Eles insistem que é preciso mostrar ações imediatas para que as promessas produzam o que chamam de resultados tangíveis e confirmam que mais recursos para o meio ambiente seria uma delas.>
Com o avanço das conversas entre autoridades dos governos brasileiro e americano, os EUA dizem que não vão estabelecer um número específico que o Brasil tem que alcançar neste ano no combate ao desmatamento, mas exigem sinalizações políticas e uma mensagem clara sobre o assunto no discurso de Bolsonaro na cúpula -a previsão é que o presidente brasileiro fale por três minutos na quinta-feira (22).>
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Os americanos dizem estar cientes de que não haverá uma queda brusca no desmatamento do Brasil nos próximos meses, mas a condição é que os números não aumentem -os índices de destruição da Amazônia atingiram novos recordes em março.>
O problema é que o governo brasileiro tem uma janela estreita para conseguir reverter a tendência de aumento da devastação da floresta ainda em 2021 e o mais recente programa anunciado pelo Planalto foi considerado fraco por ambientalistas.>
Apresentado pelo vice-presidente Hamilton Mourão, o plano Amazônia se compromete a reduzir até o fim de 2022 as queimadas e o desmatamento ilegal aos níveis da média histórica entre 2016 e 2020 do Prodes (Projeto de Monitoramento do Desmatamento na Amazônia Legal por Satélite), sistema do Inpe (Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais).>
Apesar de ser uma redução objetiva, apontam especialistas, como houve muito aumento nos últimos anos, na prática o índice vai representar um desmatamento maior do que os do início da administração de Bolsonaro, em 2019, por exemplo.>
Um eventual fracasso brasileiro ao não atingir ao menos uma curva de desmatamento descendente até o final do ano será interpretado por Washington como falta de comprometimento do Brasil com o tema, de acordo com interlocutores, o que poderia prejudicar as relações com a Casa Branca.>
A ordem inicial de Biden é o diálogo para a construção de possíveis acordos no futuro, mas sanções contra o Brasil não estão descartadas caso as metas não sejam atingidas.>
Por conta de projeções desanimadoras e da falta de estrutura de agências como o Ibama e o ICMBio, o Planalto voltou a discutir a prorrogação da GLO (Garantia da Lei e da Ordem) para o combate de ilícitos ambientais na Amazônia, em uma nova tentativa de reforçar ações de controle do desmatamento.>
Zerar o desmatamento ilegal até 2030 foi o compromisso do Brasil assumido em 2015, no âmbito do Acordo de Paris, mas essa foi a primeira vez que Bolsonaro abraçou a meta, em alto nível diplomático, em carta direta a Biden.>
Na sexta-feira (16), o enviado do clima de Biden, John Kerry, havia concretizado em mensagem pública o que integrantes do governo americano estavam dizendo nos bastidores sobre o texto: o compromisso de Bolsonaro de acabar com o desmatamento ilegal até 2030 é uma sinalização positiva e importante, mas é preciso "ações imediatas e engajamento com as populações indígenas e a sociedade civil para que esse anúncio produza resultados tangíveis", escreveu Kerry em sua conta no Twitter.>
Agora, interlocutores americanos tentam cristalizar o que seriam essas ações concretas a serem indicadas por Bolsonaro em seu discurso.>
Durante a cúpula desta semana, o presidente americano quer recolocar os EUA como líderes de uma nova organização mundial, ditada pelo clima, com ambição de limitar o aquecimento global a 1,5 grau Celsius. Para isso, Biden vai anunciar novas metas para o país para diminuir até zerar a emissão de gases do efeito estufa e quer contar com mais engajamento de Bolsonaro.>
Outra ação do governo americano é seguir pedindo que o Brasil estabeleça NDCs (contribuições nacionais determinadas, na sigla em inglês) mais ousadas. As NDCs são metas de redução da emissão de CO2 na atmosfera assumidas com o Acordo de Paris.>
A meta brasileira é reduzir a emissão total de gases do efeito estufa em 37% até 2025 e em 43% até 2030. Os valores levam em conta o ano de 2005.>
O governo Bolsonaro tem resistido a revisar seus objetivos por já considerá-los ambiciosos.>
Sem conseguir o comprometimento com uma nova NDC do Brasil a tempo da Cúpula do Clima, os americanos pretendem continuar com a pressão até a COP-26 (Conferência das Nações Unidas sobre Mudança Climática), a ser realizada em novembro no Reino Unido.>
A Cúpula do Clima organizada por Biden nesta semana é considerada momento-chave da relação entre o Brasil e os EUA. Diplomatas brasileiros temem que resultados avaliados como frustrantes pelos americanos travem pontos importantes da parceria bilateral ou mesmo o apoio americano a pleitos estratégicos do Brasil, como a entrada na OCDE.>
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