Publicado em 15 de julho de 2024 às 08:01
A campanha eleitoral de 2024 tem uma nova imagem icônica: Donald Trump, momentos depois de evitar por pouco a morte ou ferimentos graves causados pelas balas de um atirador, de pé com o punho erguido, sangue espalhado pelo rosto, e atrás dele uma bandeira americana tremulando na brisa sob um céu azul.>
“Lute! Lute! Lute!”, disse o ex-presidente, quando alguns dos apoiadores, que momentos antes temiam por suas vidas, começaram a aplaudir.>
O derramamento de sangue na Pensilvânia deixará uma marca duradoura na psique americana, perfurando a blindagem de segurança em torno dos mais altos níveis da política presidencial — de blindagem magnética, limusines à prova de balas e agentes do Serviço Secreto fortemente armados. >
Mesmo ex-presidentes não estão protegidos da violência que pode surgir de repente na vida cotidiana americana.>
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Foi também um momento dramático na história política americana, que certamente será repetido em videoclipes, fotos e relatos de depoimentos ao longo desta campanha presidencial e nas próximas campanhas.>
Em um raro pronunciamento no Salão Oval na noite de domingo (14/07), o presidente Joe Biden pediu aos americanos que baixassem a temperatura em torno do debate político.>
“Nunca deve ser transformado num campo de batalha e, Deus não permita, em um campo de extermínio”, alertou. “Não importa quão fortes sejam nossas convicções, nunca devemos descambar em violência.”>
O ataque já começou a impregnar o diálogo partidário americano, vários republicanos se manifestaram para condenar o presidente Biden e os democratas por criarem um ambiente retórico propício à violência.>
Eles destacam os alertas feitos por democratas sobre a possibilidade de o ex-presidente se tornar um ditador e ameaçar a democracia, como exemplos de linguagem exagerada que pode motivar um assassino.>
Em especial, eles citam os comentários vazados que o presidente Biden fez em conversa privada com doadores na semana passada sobre o aumento dos ataques ao ex-presidente e a colocação de um “alvo” sobre ele.>
“Eles tentaram matá-lo de muitas outras maneiras, financeiramente, tentaram jogá-lo na cadeia”, disse Donald Trump Jr em uma entrevista na televisão no domingo (14/07). “É quase como se eles adorassem que isso tenha acontecido.”>
Pelo menos até agora, no entanto, os motivos e as afiliações políticas do atirador, Thomas Matthew Crooks, morador da Pensilvânia, de 20 anos, não foram totalmente revelados. Em última instância, eles poderão confrontar uma narrativa partidária feita precipitadamente.>
O filho mais velho do ex-presidente acrescentou que, após a tentativa de assassinato, os partidários da esquerda não podem mais acusar o ex-presidente de culpa pelo ataque de 6 de janeiro ao Capitólio dos EUA.>
Esse episódio violento ocorreu horas depois de o então presidente Trump ter realizado um comício a apenas alguns quarteirões de distância, desafiando os resultados das eleições de 2020. >
Suas ações naquele dia levaram à aprovação de seu impeachment pela Câmara dos Deputados (negado depois pelo Senado) e, mais de um ano depois, à acusação formal por um advogado nomeado pelo procurador-geral dos EUA.>
Se o ataque a Trump na Pensilvânia neutralizar essa linha de argumento dos democratas, esta será apenas uma das muitas maneiras pela qual o atentado terá remodelado fundamentalmente a campanha presidencial.>
Outros efeitos podem ficar mais claros durante a Convenção Nacional Republicana, que começa na segunda-feira (15/07) em Milwaukee.>
O ataque fracassado ao ex-presidente tem reflexo em vários temas que a campanha de Trump já estava planejando para a reunião quadrienal, que culminará com o ex-presidente subindo ao palco para aceitar a indicação de seu partido na noite de quinta-feira (17/07).>
O primeiro é que isso poderia dar força às alegações de queixa e perseguição, que têm sido o foco central de seus discursos em comícios e postagens nas redes sociais.>
“Eles não estão realmente atrás de mim; eles estão atrás é de vocês”, é um refrão comum de Trump, estampado em camisetas, outdoors e adesivos de carros. “Estou apenas no caminho [deles].”>
Essa mensagem ganhará nova força depois do ex-presidente e sua multidão de apoiadores terem sido alvo de tiros. >
As legiões de fãs de Trump — muitos dos quais o apoiam quase que messianicamente como seu grande herói — terão ainda mais motivos para se identificar com um homem que quase perdeu a vida enquanto estava diante deles.>
As imagens que mostram o ex-presidente evitando a morte por milímetros e as que se seguiram com Trump em postura desafiadora com o rosto ensanguentado também se encaixarão no contraste que a campanha de Trump está tentando ressaltar na convenção desta semana — uma imagem em que o candidato e seu partido personificam masculinidade e força robustas, diante da fraqueza de seus oponentes.>
A idade e as confusões do presidente Biden têm prejudicado sua campanha há meses — e causaram uma crise de confiança democrata em sua tentativa de reeleição principalmente após um desempenho surpreendentemente ruim no debate presidencial há pouco mais de duas semanas.>
O ataque de sábado (13/07) e a resposta de Trump permitirão que os republicanos se utilizem desse contraste nos próximos dias.>
Os democratas passaram as últimas duas semanas examinando angustiadamente o futuro político de seu presidente. Agora, eles têm um novo conjunto de preocupações.>
De certa forma, a tentativa de assassinato pode acabar fornecendo uma tábua de salvação política para Biden, uma vez que o foco se afastou dramaticamente de suas lutas relacionadas à idade e às tentativas internas de expulsá-lo.>
Mas a estratégia de reeleição do presidente - que passa por exibir Trump como um perigo para a nação se ele se tornar presidente novamente — pode ser seriamente prejudicada se o público americano for hostil a críticas novas e pontuais ao ex-presidente.>
A campanha de Biden já retirou todas as propagandas negativas dirigidas ao ex-presidente, para que não fossem vistas como inapropriadas, dado o clima nacional. O presidente também remarcou uma viagem ao Texas planejada para segunda-feira (15/07).>
No entanto, é apenas uma pausa, pois os democratas precisarão voltar à ofensiva se quiserem reverter a estreita liderança que o ex-presidente tem nas recentes pesquisas.>
Essa liderança — pequena, portanto não insuperável, mas ainda assim significativa — se manteve estável por meses, mesmo quando a política nacional foi atingida por um fluxo aparentemente interminável de notícias sem precedentes.>
O julgamento e a condenação do ex-presidente, uma série de decisões históricas da Suprema Corte, o fracasso do debate de Biden — nada disso pareceu mover a agulha do medidor de popularidade na política americana na que é, e parece destinada a continuar sendo, uma nação profundamente dividida.>
Embora tenha havido muita discussão sobre como essa campanha presidencial foi interrompida pela tentativa de assassinato, não há garantia de que a corrida não retornará ao seu ponto de equilíbrio que quase foi eliminado nos três meses anteriores à eleição.>
Só que agora os democratas têm menos tempo, menos vantagens financeiras e menos oxigênio político para reverter a dinâmica eleitoral a seu favor.>
O que a tragédia de sábado à noite demonstrou mais claramente, no entanto, é que as expectativas e as narrativas políticas podem mudar em segundos.>
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