• Rachel Martins

    Uma jornalista que ama os animais, assim é Rachel Martins. Não é a toa que ela adotou duas gatinhas, a Frida e a Chloé, que são as verdadeiras donas da casa. Escreve semanalmente sobre os benefícios que uma relação como essa é capaz de proporcionar

Como a interação com animais pode diminuir o medo de voar

Publicado em 06/06/2023 às 07h00
O gato Duke atua no Aeroporto de São Francisco, Estados Unidos, e juada passageiros com medo de voar.

O gato Duke foi contratado para integrar a equipe da Wag Brigade. Crédito: Reprodução Duke Trerapy Cat

O Aeroporto Internacional de São Francisco, nos Estados Unidos, “contratou” o gato Duke, de 14 anos, para integrar a equipe da Wag Brigade, programa que leva animais de terapia aos terminais para interagir com os passageiros e, consequentemente, acalmá-los do estresse que as viagens podem causar. A equipe animal é composta, ainda, pela porquinha Lilou, pelo coelho gigante Alex e outros 15 cães. O golden retriever Brixton é um dos funcionários mais antigos e integra a equipe há nove anos.

O gato Duke foi resgatado das ruas da cidade por um abrigo e adotado pela tutora Jen Morris, em 2010. E ela, ao notar o comportamento descontraído do bichano, buscou uma certificação para transformá-lo em um animal de terapia e desde então ele já trabalhou em diferentes hospitais da região.

Pegando como gancho essa história, a coluna É o bicho entrevistou a psicóloga, especializada em desenvolvimento adulto e felicidade, Angelita Corrêa Scardua, para falar sobre a importância e os benefícios da interação de um animal doméstico com seres humanos.

Bem-estar físico e mental

Segundo ela, os estudos científicos sobre o impacto da interação com animais para o bem-estar físico e mental são, de certa forma, recentes.

“Não existe uma literatura muito extensa sobre o assunto. Há um estudo coordenado pelo Instituto Nacional de Saúde, nos Estados Unidos, em parceria com uma rede de empresas de alimentos para animais de estimação, mas basicamente com tutores de pets. Além disso, existem outros sobre os efeitos dessa interação terapêutica entre humanos e animais envolvendo pacientes terminais, principalmente crianças, em hospitais. São muitos os programas, inclusive aqui no Brasil, que trabalham essa interação, tanto deixando o paciente receber seu pet em uma visita, quanto com animais treinados e profissionais qualificados para atuarem junto aos enfermos, incluindo, também, pessoas com Síndrome de Down, com Transtorno do Déficit de Atenção com Hiperatividade (TDAH) e alguma coisa envolvendo autistas”.

Mas o que esses estudos indicam? Segundo a psicóloga, mostram que o convívio ou a interação com animais têm um efeito terapêutico, ajudando a diminuir a liberação de cortisol no organismo, um hormônio associado ao estresse.

"Esse hormônio é liberado sempre que há um nível alto de estresse. Então, nessa interação com os animais há uma diminuição da liberação de cortisol, abaixando, consequentemente, o estresse e ajudando a manter a pressão arterial. Esses dois resultados são os mais consistentes"

"Esse hormônio é liberado sempre que há um nível alto de estresse. Então, nessa interação com os animais há uma diminuição da liberação de cortisol, abaixando, consequentemente, o estresse e ajudando a manter a pressão arterial. Esses dois resultados são os mais consistentes"

Angelita Corrêa Scardua

Angelita Scardua ressalta, ainda, que pessoas que moram sozinhas, tem um pet e interagem com ele regularmente enfrentam melhor a solidão, e isso vale também para pacientes que precisam ficar um longo tempo em hospitais.

“Alguns estudos indicam que a interação com animais melhora o humor, tornando a pessoa mais otimista, leve e alegre, ajudando a minimizar os sintomas da depressão e da ansiedade. Outro benefício é a questão do suporte social, o que significa que se a pessoa está muito aflita, ansiosa, insegura e amedrontada em determinada situação, essa interação pode passar uma sensação de apoio, de suporte social, fazendo-a sentir-se acolhida, minimizando aquele sentimento de estranhamento que é comum quando o indivíduo se encontra numa situação social onde está desconfortável”, explica

Liberação de ocitocina

No caso de passageiros com medo de voar, ela explica que não existem ainda estudos dos benefícios dessa interação, mas a partir do que já foi falado, com certeza pode ajudar a diminuir a sensação de insegurança, de estranhamento, de deslocamento no ambiente, que é muito comum numa pessoa com medo.

“Nesse caso, o passageiro, por exemplo, tende a achar que só ele tem medo e começa a entrar em um processo de autojulgamento muito severo. Ele pensa: ‘como sou bobo, por que eu tenho medo? Todo mundo viaja tranquilo’. E assim, essa interação com o animal vai minimizar essa sensação de inadequação social, oferecendo amparo afetivo, o que leva a melhora do humor e com isso a pessoa se sente mais tranquila no nível de ansiedade e estresse, diminuindo o impacto do medo e deixando esse processo doloroso mais confortável e menos sofrido para o passageiro”, afirma.

A psicóloga lembra, também, que essa interação humano e animal tem um aspecto do ponto de vista neurofisiológico, já que gera uma liberação de ocitocina, que é um neurotransmissor, um hormônio conhecido como “hormônio do abraço”, porque envolve a motivação para a vinculação, a formação de vínculos no contato com outro ser.

“Esse hormônio, por exemplo, é liberado quando a mulher está em trabalho de parto. A ocitocina prepara o organismo da mãe para receber a criança com o objetivo de formar o vínculo. Isso acontece em qualquer experiência que envolve afeto, vínculo e contato, quando a ocitocina é liberada para que o vínculo seja fortalecido. E isso ocorre, também, na interação com animais”.

Ela ressalta, também, que a ocitocina interage com outro hormônio, a vasopressina, que está associado à regulação do estresse. “Não há evidências científicas que comprovem 100% o que estou falando, mas o que se imagina é que o efeito da interação com animais é o mesmo que ocorre entre os seres humanos, de conforto e segurança que o vínculo traz, ajudando a diminuir o estresse”.

E quem não gosta de animais?

Mas Angelita Scardua faz um alerta: para quem não gosta de animais ou tem um trauma a presença dos mesmos pode não ser algo tranquilizador. Ela explica que se a pessoa tem um registro mental de experiência com animal isso pode gerar desconforto, ansiedade, medo e insegurança e estar próximo de um no terminal de passageiros não vai ajudá-la.

“Pelo contrário, vai disparar gatilhos de respostas traumáticas, automáticas, de ansiedade, medo e insegurança. Mesma coisa para quem não gosta de animais, essa pessoa vai sentir rejeição e a sensação que se tem nesse momento é de desgosto, de nojo, de desconforto. Nesses casos, o ideal seria a criação de um espaço específico para os passageiros que queiram fazer essa interação, tipo uma sala de espera com animais saudáveis e profissionais especializados no manejo dessa interação, porque podem surgir algumas situações inesperadas. Eu penso que ter animais num local assim é ótimo, eu adoraria, não tenho medo de voar mas amaria”.

Ela lembra que não gostar de animais, falando de uma perspectiva psicológica, não é natural do ser humano. “Existe algo na história de vida dessa pessoa que a levou a esse sentimento, porque naturalmente o ser humano está predisposto a fazer vínculo com animais, essa é nossa história, nós domesticamos vários deles, a nossa evolução está atrelada a isso. E tratar esse sentimento ruim é muito importante”.

Animais e crianças com TDAH

Ela explica que no caso de passageiros, especialmente crianças com TDAH, existem estudos que indicam que essa interação pode diminuir a hiperatividade, ajudando a melhorar a concentração. Já para pessoas com autismo e Síndrome de Down, que não têm resistência a animais, essa interação minimiza os níveis de estresse.

Ainda em relação a interação entre humanos e animais em terminais, Angelita Scardua, ressalta que além dos espaços específicos para passageiros que queiram essa interação, poderia-se criar um espaço específico também para aqueles que se sintam desconfortáveis na presença dos mesmos, por algum motivo.

“Seria um espaço de familiarização, com um profissional especializado, um terapeuta, que pode conduzir esse processo de aproximação dos passageiros com o animal. Na terapia comportamental cognitiva existem várias estratégias que podem ajudar uma pessoa, por exemplo, que tem fobia, que tem dificuldade nesse contato,que se sente desconfortável, a fazer uma interação, ainda que breve, pontual, de forma controlada, monitorada. Seria um espaço de adaptação, intermediário. Imagine os benefícios que isso pode trazer?", conclui.

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Este texto não traduz, necessariamente, a opinião de HZ.

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