Publicado em 30 de janeiro de 2019 às 03:39
Um dia após tomar posse como presidente do Banestes, Vasco Cunha Gonçalves acabou preso preventivamente pela Polícia Federal, em Vitória, nesta terça-feira (29), por determinação do juiz Vallisney de Souza Oliveira, da 10ª Vara Federal de Brasília. Era a Operação Circus Maximus, um desdobramento da Operação Greenfield.>
Como o pouco tempo à frente do Banco do Estado do Espírito Santo indica, a operação e a prisão de Vasco Gonçalves nada têm a ver com a instituição capixaba. A investigação remonta ao BRB, Banco de Brasília, que era presidido por ele até o último dia 22.>
A força-tarefa do Ministério Público Federal aponta que Gonçalves, outros ex-integrantes do banco, empresários e operadores intermediários formavam uma organização criminosa que, por meio de pagamento de propina, garantiam a liberação de recursos para investimentos privados que poderiam causar prejuízo à entidade.>
Horas após a prisão, o governo Renato Casagrande (PSB), responsável pela indicação de Vasco Gonçalves para comandar o Banestes, divulgou que um interino assumiria o posto. Trata-se de Silvio Grillo, que já era diretor de Tecnologia. O banco também enviou um fato relevante, um comunicado ao mercado, informando sobre a renúncia de Gonçalves.>
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No pedido feito à Justiça Federal, que incluiu prisões temporárias, preventivas e mandados de busca, o Ministério Público Federal apontou que o ex-presidente do BRB e do Banestes fazia parte do esquema, mas não era o líder. Apesar de, administrativamente, ser hierarquicamente superior a outros citados, ele foi indicado à presidência graças à influência de Ricardo Leal, que integrava o Conselho Administrativo do banco e havia sido tesoureiro de campanha de Rodrigo Rollemberg (PSB), ex-governador do DF. Leal, ainda de acordo com o MPF, era o líder.>
GRAVE>
Os 11 procuradores que assinam o pedido consideraram, no entanto, grave a conduta de Vasco Gonçalves, relacionada diretamente à negociação de pagamento de propina no BRB. "É deveras grave que o presidente de uma instituição financeira pública tenha tratado diretamente o pagamento de propinas", escreveram os procuradores da República.>
Isso ocorreu em ao menos três ocasiões, segundo o MP. Em uma delas, houve o pagamento de R$ 60 mil, em notas de R$ 100, dentro do gabinete do então presidente do BRB. O destinatário, de acordo com delatores que colaboraram com as investigações, era Nilban Júnior, ex-vice-presidente do Banco de Brasília.>
Outro evento narrado foi o convite que Vasco Gonçalves e Nilban receberam, e aceitaram, para assistir de camarote aos shows do Rock in Rio de 2015. O delator Ricardo Rodrigues, empresário interessado em recursos do BRB para erguer um hotel (ex-Trump Hotel, hoje LSH Lifestyle) na Barra da Tijuca, no Rio, é que pagou pelo espaço vip aos dois. Para o MPF, "a própria atração, cujo custo para acesso ao camarote VIP certamente possui valor econômico acima de qualquer patamar que possa ser considerado um valor irrelevante, constitui vantagem indevida".>
Outra negociação ocorreu nas instalações do hotel. Na ocasião, narra o MPF, Vasco e Nilban manifestaram a Rodrigues insatisfação com a repartição de propinas com Ricardo Leal. Para os investigadores, não há dúvidas de que os servidores sabiam dos pagamentos anteriores "e participavam da partilha". O empresário pedia um aporte de R$ 50 milhões para seu empreendimento. Para liberar o dinheiro, os servidores requisitaram R$ 600 mil em propina, frisam os procuradores.>
LAVA JATO>
A Operação Greenfield, para a qual há uma força-tarefa em Brasília, apura fraudes em fundos de pensão, custeados por servidores públicos em busca de uma aposentadoria complementar. E chegou ao que resultou na Circus Maximus por meio da troca de informações com a Operação Lava Jato do Rio. Foi aí que surgiu a também colaboração do doleiro Lúcio Funaro, velho conhecido da PF e do MPF. Funaro assim descreve as atividades de Leal, apontado como chefe do esquema: "Analisando toda a trajetória de vida do Ricardo Leal e conhecendo ele há mais de 20 anos, só pode ser fins ilícitos".>
Entre os citados pelo MPF e contra o qual foi expedido mandado de prisão nesta terça-feira (29), está também um cunhado de Vasco Gonçalves, Marco Aurélio Monteiro de Castro, ex-diretor de Risco e Controladoria do BRB. O estatuto do banco até foi alterado para permitir a alocação do parente.>
Marco Aurélio era o responsável pela área de compliance do BRB, ou seja, deveria impedir a ocorrência de esquemas, mas de acordo com a acusação, na verdade participava da organização, impedindo que auditorias detectassem as transações suspeitas.>
Após ser preso na capital capixaba, Vasco Gonçalves foi levado para Brasília, de acordo com o que a reportagem apurou. A Polícia Federal no Estado não repassou informações. A defesa do ex-presidente do Banestes não foi localizada.>
OUTRO INTEGRANTE>
Na última segunda-feira, quando Vasco Cunha Gonçalves assumiu a presidência do Banestes, outro ex-integrante do BRB também aportou na instituição. Trata-se de Carlos Artur Hauschild, que era diretor de Risco e Controladoria do Banco de Brasília. Ele tomou posse como diretor de Riscos e Controle no Banestes, ou seja, mesma posição em que atuou ao lado de Vasco Gonçalves no DF. Hauschild não está entre os investigados na Operação Circus Maximus. O Banestes e o governo do Estado não informaram se ele continuará ou não como diretor do banco.>
CASAGRANDE: "FOMOS PEGOS DE SURPRESA">
O governador do Espírito Santo, Renato Casagrande (PSB), mostrou-se surpreso com a prisão de Vasco Gonçalves, apresentado por ele como futuro presidente do Banestes ainda em dezembro de 2018.>
Casagrande cumpria agenda, nesta terça-feira (29), no Rio de Janeiro, em evento na Casa da Indústria, quando se manifestou. A gente precisa compreender um pouco mais (o que está acontecendo). Por enquanto, estamos sem informação. Fomos pegos de surpresa, literalmente de surpresa, disse à colunista Beatriz Seixas.>
O governador justificou o espanto argumentando que o nome de Vasco Gonçalves havia sido submetido ao Banco Central e aprovado.>
Oficialmente, o banco capixaba reagiu da mesma forma. Em nota, destacou que Gonçalves havia sido aprovado pelo Banco Central, que promove rigorosa análise dos currículos dos indicados para bancos públicos. A operação estava em segredo de Justiça e o governo foi, assim, surpreendido pelos fatos.>
O Banco Central foi procurado pela reportagem para comentar os critérios para a aprovação. Informou apenas que não comenta situações específicas de instituição regulada.>
Banco ileso>
A crise demandou que o Banestes fizesse a comunicação de dois fatos relevantes ao mercado. O primeiro, sobre a designação de um interino, Silvio Grillo. O segundo foi sobre a renúncia de Vasco Gonçalves.>
As ações preferenciais do Banestes (BEES4) negociadas na Bolsa de Valores, B3, fecharam o pregão negociadas a R$ 4,65, com queda de 3,33%.>
Apesar da prisão de Vasco Cunha Gonçalves, o banco público capixaba não foi alvo da Operação Circus Maximus, deflagrada nesta terça.>
As investigações estão concentradas em supostas práticas criminosas no Banco de Brasília (BRB), presidido por Vasco Gonçalves entre 2015 e 2018.>
De acordo com atas do BRB, ele foi destituído da presidência no dia 2 de janeiro, mas só deixou de responder efetivamente pelo Banco de Brasília no último dia 22.>
Nos pedidos de prisão e de busca e apreensão apresentados pelo Ministério Público Federal não há qualquer suspeita lançada sobre o Banestes ou sobre diretores do banco.>
Ao autorizar as prisões e as buscas, o juiz Vallisney de Souza Oliveira, da 10ª Vara Federal de Brasília, menciona o Banestes apenas ao dizer que a indicação de Vasco não elimina a necessidade de prisão, por conta de atos anteriores dele, no BRB.>
O fato de já ter sido indicado para a presidência do Banco do Estado do Espírito Santo (Banestes) não ameniza ou elimina a necessidade da prisão preventiva, destacou na decisão, de 8 de janeiro.>
PERGUNTAS SEM RESPOSTA>
O Gazeta Online procurou o governo do Estado, o IPAJM, o Banestes e o Banco Central para esclarecer informações decorrentes da operação. Mas não obteve resposta para as seguintes questões:>
Qual foi o critério para a escolha de Vasco Cunha Gonçalves para a presidência do Banestes?>
Qual será o critério para nortear a escolha do novo presidente (sem ser o interino)?>
O atual diretor de Riscos e Controle do Banestes é Carlos Artur Hauschild, que tomou posse na última segunda-feira, com Vasco Gonçalves. Ele também já atuou no BRB, ao lado de Gonçalves. Hauschild deve permanecer na diretoria do Banestes?>
O governador Renato Casagrande, então sem mandato, integrou o conselho de administração do BRB de abril de 2015 a abril de 2018, parte desse período está sob investigação na operação. Nesse período, notou, como conselheiro, alguma atitude suspeita?>
O Banco Central não encontrou nenhuma vedação para que Vasco Gonçalves presidisse o Banestes?>
Como foi possível a chancela ao nome dele em meio a uma investigação do Ministério Público Federal?>
BANCO GERE RECURSOS DO IPAJM>
O BRB DTVM, que atua como administrador de recursos de terceiros do Banco de Brasília, é uma das instituições financeiras credenciadas para operar no mercado financeiro e de capitais com recursos financeiros do Regime Próprio de Previdência dos Servidores do Estado do Espírito Santo.>
As outras três instituições são Banestes, Caixa e Banco do Brasil. As operações são realizadas pela equipe de investimentos do Instituto de Previdência dos Servidores do Estado (IPAJM), conforme estabelece resolução de 2010.>
O atual presidente do BRB DTVM, Carlos Vinícius Raposo Machado Costa, é um dos presos nesta terça. É apontado como aliado de Ricardo Leal, considerado pelo Ministério Público Federal como líder do esquema.>
O ex-presidente do BRB DTVM é Nilban Júnior, também preso. Ele atuou com Vasco Gonçalves, segundo o órgão ministerial.>
O governo foi questionado sobre quais são os recursos administrados pela instituição de Brasília e se a operação exigiria alguma providência. Não houve respostas.>
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