Publicado em 23 de janeiro de 2019 às 20:11
Filho do presidente Jair Bolsonaro, o deputado estadual e senador eleito Flávio Bolsonaro (PSL-RJ) realizou de 2012 a 2014 operações de compra e venda de imóveis com características consideradas suspeitas de lavagem de dinheiro. As transações lhe renderam um lucro equivalente a 260% no período.>
Em novembro de 2012, Flávio adquiriu dois imóveis em Copacabana, na zona sul do Rio de Janeiro. Localizados em ruas pouco valorizadas do bairro, pagou um total de R$ 310 mil pelas duas unidades e as revendeu, um ano e três meses depois, por mais que o triplo do preço.>
Os dois imóveis haviam sido adquiridos em 2011 pelos proprietários anteriores por um total de R$ 440 mil. Em pleno "boom imobiliário" na cidade, eles tiveram um prejuízo de 30% ao revendê-los ao senador eleito, segundo dados do 5º RGI (Registro Geral de Imóveis) da capital do estado.>
O deputado revendeu um imóvel em novembro de 2013 (por R$ 573 mil) e outro em fevereiro de 2014 (por R$ 550 mil). Somadas, as transações lhe renderam um lucro de R$ 813 mil -diferença entre os R$ 310 mil investidos nas compras e o R$ 1,12 milhão que recebeu com as vendas.>
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Flávio nega irregularidades e diz que as transações foram normais.>
A dinâmica das operações, porém, é considerada suspeita, segundo resolução do Cofeci (Conselho Federal de Corretores de Imóveis). A entidade determina que seja comunicado ao Coaf (Conselho das Atividades Financeiras) negociações com "aparente aumento ou diminuição injustificada do valor de imóvel".>
A resolução em que consta a determinação é de outubro de 2014, posterior às vendas realizadas por Flávio, motivo pelo qual possivelmente não foram comunicadas ao Coaf.>
A queda repentina de valor de imóveis é alvo de suspeitas dos órgãos de controle porque podem encobrir um possível pagamento não declarado (fora dos registros oficiais), o que caracteriza a lavagem de dinheiro. Não há elementos adicionais para indicar que isso tenha ocorrido nas transações feitas pelo filho do presidente.>
O policial militar aposentado Fabrício Queiroz, ex-assessor de Bolsonaro na Assembleia Legislativa do Rio, é investigado pelo Ministério Público do Rio de Janeiro sob suspeita de participar de um esquema de lavagem de dinheiro e ocultação de bens.>
Flávio Bolsonaro não é formalmente investigado no caso na esfera criminal, mas sim na área cível, que apura improbidade administrativa. A suspeita é de que Queiroz fosse o responsável por recolher parte do salário de servidores com finalidade ainda não esclarecida. O senador eleito nega a prática.>
A investigação do caso está suspensa após liminar do ministro Luiz Fux, do Supremo Tribunal Federal.>
HISTÓRICO>
O Rio de Janeiro viveu desde 2008 um forte aumento de preço nos imóveis. De acordo com dados do Secovi, contudo, a média de valorização não triplicou o preço dos apartamentos de 2012 a 2014, como no caso do senador eleito.>
Segundo Flávio, os dois imóveis são quitinetes de 29 metros quadrados. As tabelas do Secovi apontam que unidades de um quarto em Copacabana tiveram valorização de até 70% no período -não há dados para conjugados.>
Em março de 2011, o engenheiro norte-americano Charles Eldering comprou o apartamento na avenida Prado Júnior por R$ 200 mil. Ele vendeu para Flávio por R$ 140 mil, que, por sua vez, o revendeu por R$ 550 mil em fevereiro de 2014.>
Em novembro de 2011, o médico também norte-americano Paul Maitino adquiriu a unidade da rua Barata Ribeiro por R$ 240 mil. Ela foi transferida para o senador eleito por R$ 170 mil e revendida pelo filho do presidente Jair Bolsonaro por R$ 573 mil em novembro de 2013.>
Os dois imóveis, contudo, não foram vendidos diretamente pelos proprietários. O responsável pela transação foi o corretor norte-americano Glenn Dillard. Ele tinha uma procuração de ambos para negociar imóveis no Rio de Janeiro.>
Em 2016, Eldering acusou Dillard na Justiça de ter lhe aplicado um golpe. O engenheiro declarou que o corretor vendera a unidade a Flávio sem o seu consentimento, omitiu a concretização da negociação e ficou com o dinheiro.>
Dillard tinha, contudo, procuração para realizar as vendas. Flávio não é acusado no processo já que o corretor tinha poder para fazer as transações.>
Eldering afirma que foi vítima do mesmo golpe com outros quatro imóveis, segundo o engenheiro declarou à Justiça. Dois deles tiveram transações em datas semelhantes aos de Flávio. Em ambos, o norte-americano vendeu por valor maior do que havia comprado anteriormente, diferentemente do que ocorreu com o senador eleito.>
Maitino não processou Dillard. Mas a reportagem apurou que ele se diz vítima do mesmo golpe.>
BOOM IMOBILIÁRIO>
Flávio Bolsonaro afirmou, em nota, que o negócio foi fechado "de forma legal entre as partes, numa negociação normal, como qualquer outra compra e venda de imóvel".>
"Todos sabem do boom imobiliário pelo qual passou o Rio de Janeiro à época, razão pela qual as quitinetes foram vendidas por valores superiores", disse o senado eleito.>
O deputado não quis comentar o motivo pelo qual os imóveis sofreram perda de valor no momento em que ele os adquiriu. "Necessário esclarecer também que eram quitinetes, de 29 metros quadrados cada, e foram anunciadas na internet. [...] Esclareço ainda que tudo foi realizado em acordo com as leis, constando nas escrituras, e devidamente declarado à Receita Federal", afirmou.>
DEPÓSITOS>
Flávio está na mira do Coaf desde que o órgão de combate à lavagem de dinheiro estranhou 48 depósitos em dinheiro na sua conta, sempre no valor de R$ 2.000, num total de R$ 96 mil, feitos de junho a julho de 2017. Os depósitos foram feitos no autoatendimento da agência bancária que fica dentro da Assembleia Legislativa do Rio.>
Segundo Flávio, o dinheiro é parte de um pagamento em dinheiro que recebeu ao vender um imóvel em Laranjeiras. Como mostrou a Folha de S.Paulo, Flávio fez 20 transações imobiliárias em 15 anos, lucrando com a compra e venda de imóveis em curto período de tempo.>
De 2002 a 2018, seu patrimônio declarado à Justiça Eleitoral passou de um Gol 1.0 de R$ 25,5 mil para quase R$ 1,75 milhão em bens.>
Flávio justifica o patrimônio por ser empresário, mas não detalhou suas atividades no ramo. Seu primeiro negócio registrado é uma filial da loja de chocolates Kopenhagen, aberta em 2015. Antes disso, porém, ele já acumulava imóveis e transações.>
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