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De Simbá a Darshan: a história do leão encantou moradores de Cariacica

De Simbá a Darshan: a história do leão encantou moradores de Cariacica

O leão que viveu em uma jaula em frente a um frigorífico, em Cariacica, ganhou o nome Darshan em 2007, quando foi levado para São Paulo. Viveu por onze anos em um santuário ecológico, tendo morrido em março do ano passado.

Publicado em 23 de setembro de 2019 às 11:23

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Leão Darshan, que vivia em uma jaula, em frente ao frigorífico Frincasa, em Cariacica, e que foi transferido em 2007 para o Santuário Ecológico Rancho dos Gnomos, com a veterinária Carla Spechoto Mariano. Morreu em março de 2018. (Carla Spechoto Mariano/ Arquivo pessoal )

A imagem não deixa dúvidas: a escovação era um dos momentos prediletos do leão Darshan, que adorava ainda receber carinho da equipe que dele cuidava. Quem olha o felino pode não se recordar, mas ele morou por mais de uma década no bairro Itanguá, em Cariacica. Vivia em uma jaula, em frente ao antigo frigorífico Frincasa. Até 2007 ele era conhecido como Simbá.

Para a reportagem de A Gazeta, na época, os moradores relataram que já tinham se acostumado com os seus rugidos. Muitos o conheciam desde que era filhote, quando andava de coleira pela rua, e sabiam que quando ele encostava na grade de sua jaula era porque queria carinho. Era considerado inofensivo e a atração da região, que recebia moradores de outros locais querendo fotografá-lo.

Mas por trás do carinho daqueles que até o alimentavam, estava um animal vivendo em condições precárias, em uma jaula pequena e sem espaço para se exercitar, como à época relatou o Ibama. Ele tinha sido doado aos donos do antigo frigorífico Frincasa por um circo, em troca de carne para alimentar o demais animais que por lá se apresentavam. Dez anos se passaram e ele cresceu em uma jaula, onde era alimentado por um funcionário e moradores da região.

Leão Darshan, quando vivia em uma jaula em frente ao frigorífico Frincasa, no bairro Itanguá, em Cariacica. (Deivid Dantas/fotoleitor)

Sua situação mudou quando ele foi resgatado, em 2007, pela equipe do Santuário Ecológico Rancho dos Gnomos. Foi necessário uma verdadeira operação, com apoio da fiscalização do Ibama e até da Polícia Militar Ambiental para retirá-lo da jaula. Do bairro ele seguiu direto para São Paulo, sua nova moradia, com um novo nome:  Darshan. A troca é uma tradição do santuário, para que o animal possa deixar para trás uma vida de sofrimentos.

De acordo com a veterinária Carla Spechoto Mariano, que atua na equipe do santuário, tão logo chegou o leão não só se adaptou rapidamente, como ganhou o coração de toda a equipe. Ela relata que, em geral, animais que passam por longos períodos de sofrimento acabam se tornando mais bravos, agressivos.

"Mas o Darshan era diferente. Ele adorava o contato com as pessoas, adorava dar e receber carinho. Quando nos aproximávamos do recinto ele já começava a fazer uns rugidos, querendo carinho. Era muito fofo. Ele foi muito feliz no santuário", conta.

Nas fotos no santuário, Darshan aparece sem a tradicional juba que ostentava em Cariacica. Segundo a veterinária isto decorre do fato de que ele precisou ser castrado quando chegou em São Paulo. Com a ausência dos hormônios ela caiu e não mais cresceu.

Leão Darshan, que vivia em uma jaula, em frente ao frigorífico Frincasa, em Cariacica, e que foi transferido em 2007 para o Santuário Ecológico Rancho dos Gnomos, administrado por Sílvia e Marcos Pompeu. Morreu em março de 2018. (Biga Pessoa/Santuário Ecológico Rancho dos Gnomos)

SAUDADES

O proprietário do Rancho dos Gnomos, Marcos Pompeu, recorda com carinho do leão. "O Darshan é um querido! Ele chegou em 2007 ao rancho e logo ele teve uma afinidade muito grande comigo e com a Silvia. Tinha uma proximidade ainda maior comigo, que lhe dava banho, soro, ficava junto dele. Era um amor. Quando eu o chamava, podia estar em qualquer canto do recinto e ele vinha para dar um oi. O Darshan é, e será sempre, muito querido para nós!", relata Marcos, que administra a propriedade com sua esposa, Sílvia Pompeu.

Foi esta docilidade, relata Carla, que permitiu que Darshan fosse muito bem cuidado. "Todos os animais do rancho são bem tratados, não se mede esforços para oferecer alimentação adequada e os medicamentos que precisam. Mas os felinos, para receberem tratamento, você precisa sedá-los e isto, dependendo da doença, pode até matá-los. Mas Darshan adorava o contato. Permitia tocar nele, o que facilitava muito os cuidados. Ele aceitou ser cuidado e por isso viveu tanto. Era possível dar remédio em sua boca, dar soro, banho, escovação, ele aceitava tudo com carinho", relata a veterinária.

Estima-se que leões, em cativeiro, consigam viver em torno de uns 30 anos. Algo que a veterinária Carla, especialista em felinos, nunca presenciou. Mas Darshan conseguiu viver muito, em torno de 27 anos. No final de sua vida, assim como outros felinos, apresentava problemas renais crônicos, na coluna, e outras doenças da idade. Em março do ano passado ele "ficou livre", termo da tradição do rancho para se referir a morte.

Para a equipe foi uma grande consternação. "O dia em que ele se foi, fiquei em choque, assim como a equipe. Era um leão que parecia um gato, muito fofo. Era um exemplo de vida e nos deixou uma grande lição: não deixar que os fatos e momentos ruins de sua vida te impeçam de amar e ser amado. Se existe um céu, quando eu morrer quero encontrar esse leãozinho por lá", disse Carla, que se emociona ao lembrar do amigo.

IRMÃOS URSOS

No mês passado o santuário promoveu a transferência para a sua sede, em São Paulo, de dois ursos-pardos. A mudança, que pode ser acompanhada pelas redes sociais do Santuário Ecológico Rancho dos Gnomos, foi autorizada pela Justiça, que levou em consideração a alta temperatura de Canindé, no Ceará, onde eles viviam há 11 e oito anos, respectivamente. Para lá foram levados os ursos Verrú e Mizar, que são as estrelas de vários vídeos das redes sociais do santuário.

O mesmo local abrigou a ursa Rowena, há quase um ano. Ela, que morreu em julho por causa de complicações de um tumor, ficou conhecida como a 'ursa mais triste do mundo' durante a campanha de transferência por ser de uma espécie nativa de regiões com clima ameno e ter vivido no calor de mais de 40 graus no Piauí. Rita Lee chegou a escrever um livro sobre esta ursa.

A história do Rancho dos Gnomos, uma organização não governamental, iniciou em sua sede em Cotia (SP). Em 2015 conseguiram realizar a que foi considerada a maior campanha de financiamento coletivo da América Latina para a compra de uma nova sede na cidade de Joanópolis (SP), no meio da Serra da Mantiqueira. A manutenção de Cotia e Joanópolis é feita através de doadores mensais e esporádicos.

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O Rancho dos Gnomos existe há mais de 28 anos e tem como objetivo primar pelo bem-estar da fauna silvestre, exótica, nativa, doméstica e domesticada, por meio de sua preservação, conservação, recuperação e propagação da educação ambiental para a consecução e alcance de um ambiente sadio e equilibrado. O local não recebe visitações. Mas é  possível acompanhar a vida dos animais e até dos ursos através das redes sociais.

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