Foi a realização de um evento social num clube da Ilha do Boi, em Vitória, que permitiu a formação de uma aliança entre Flávio Salles e os donos da Telexfree, Carlos Costa e Carlos Wanzeler. Juntos os três realizaram vários eventos, sendo o último deles o show de Paul McCartney em Cariacica.
Os criadores do maior esquema de pirâmide do mundo usaram o dinheiro sujo da empresa para pagar o cachê do ex-Beatle, que promoveu um show histórico no estádio Kleber Andrade em novembro de 2014.
Por trás do evento histórico há indícios de uma trama, coordenada pelos líderes da Telexfree, para lavar dinheiro acumulado às custas de vítimas em mais de 100 países e mantido em contas de laranjas. Quando eles garantiram o pagamento, a empresa já estava bloqueada pela Justiça do Brasil e dos Estados Unidos.
Salles relata que o primeiro contato com os chefões ocorreu em dezembro de 2012. Eles o procuraram porque queriam realizar o primeiro Extravanganza. O evento era usado para prestigiar os participantes da pirâmide supostamente bem sucedidos e, com isso, mostrar que a empresa tinha solidez e grandeza.
Entre os milionários propagandeados no evento, Renato Alves (veja vídeo abaixo). Hoje, ele responde a processo por lavagem de dinheiro. Segundo uma das denúncias apresentadas pelo Ministério Público Federal, ele "guardava e custodiava os recursos da Telexfree captados clandestinamente, além de realizar pagamentos e transferências em favor da Telexfree".
"Toda a tratativa era feita comigo. Quem me procurou foram Carlos Wanzeler e o Carlos Costa. Foi feito um evento para mil pessoas, com o show do 14 Bis, coquetel e jantar. Lembro que ficou muita gente de fora. Na época eu nem sabia o que era Telexfree", relatou Salles.
O contrato foi feito com a Ympactus Comercial, razão social da Telexfree. Cerca de mil pessoas, segundo Flávio, foram convidadas, mas outras 300 apareceram querendo participar da festa. "O evento só não foi tão tranquilo porque tinha muita gente do lado de fora querendo entrar. Chegaram a oferecer até R$ 2 mil para os seguranças, para entrar. Mas só os autorizados pela empresa tinham acesso", lembrou.
No ano seguinte, Flávio foi convidado por Costa e Wanzeler para realizar o segundo Extravaganza, desta vez em um cruzeiro marítimo. "Viram que eu tinha experiência, meu contrato no clube tinha acabado e fiz o projeto do navio. Eles pagaram o frete do navio. Se tivessem dinheiro bloqueado… Pra mim as coisas estavam rodando normalmente. Vi eles transacionando dinheiro diariamente. Altos valores", relatou.

Em uma das noites do cruzeiro, Carlos Costa chamou Flávio Salles para dizer que o produtor o ajudou a concretizar um sonho. Veja:
Foram quatro dias de festa animados pela dupla Bruno e Marrone, a quem foi pago um cachê, segundo o site IG, de R$ 500 mil. Durante o cruzeiro Costa grava um vídeo contando que em maio de 2013 contratou o cruzeiro. "Lembra quando te liguei para falar do meu sonho de contratar um cruzeiro?", diz Costa para Flávio, a seu lado, que recebe os agradecimentos pela realização do evento. "Ele (Flavio) me ajudou a construir meu sonho", diz Costa.
O evento aconteceu seis meses após a Justiça Federal bloquear as contas de Costa, de Wanzeler e da Telexfree. Mesmo assim, segundo Flávio, animados com a realização do primeiro cruzeiro, Costa e Wanzeler encomendaram a realização do terceiro Extravaganza, em dezembro de 2014.
Flávio Salles
Produtor local do show de Paul McCartney
"Eles iam fazer de novo. Me pediram para ver o navio. Se o cara te fala isso, é porque está com dinheiro. Ele, o Costa, queria o maior navio da MSC, e fui a São Paulo conhecê-lo"
Em 2014, já com uma relação de amizade com Carlos Costa, Flávio Salles decide recorrer a eles em busca de apoio para realizar shows no Estado. "Estava com a proposta de fazer shows, mas precisava de investidores e procurei por eles, e ele (Costa) falou: tô dentro", conta.
Na ocasião surgiu uma exigência dos chefões da Telexfree: queriam colocar um sócio na empresa de Salles. "Vamos botar uma pessoa nossa, me disseram. Perguntei se o cara entendia de eventos e eles falaram que não, que era apenas para compor a sociedade. E eu aceitei", relatou.
Na ocasião, a empresa de Flávio se chamava Instituto Capixaba de Eventos, e quando houve a mudança na sociedade, o nome mudou para Capixaba Eventos. O novo sócio era Cleber Renê Rizério Rocha, um ex-funcionário de Wanzeler que três anos depois acabou sendo preso nos Estados Unidos.
Ele estava com US$ 2,2 milhões em uma mala e levou as autoridades norte-americanas a um colchão sob o qual estavam escondidos US$ 17 milhões dos cabeças da pirâmide. Documentos do governo dos Estados Unidos confirmam Cleber como alguém que desfrutava da confiança de Wanzeler.
Rocha não tinha expertise em produções artísticas nem desempenhou papel relevante no negócio. Mesmo assim ficou com 99% do capital da Capixaba Eventos, restando para Flávio 1%, sem ter recebido nenhum tipo de indenização ou pagamento de sua parte.
"Foi feita uma negociação de capitalização de investimentos de shows e eu aceitei. Foi uma boa negociação", conta Salles. Mesmo assim ele afirma que era o sócio administrador, podendo assinar contratos e fechar os shows, diferentemente do que está estabelecido no contrato social da empresa, que atribui estas funções para Cleber.
Já com a nova formação da empresa, foram iniciados os preparativos para o primeiro show com a participação dos sócios da Telexfree. No meio do caminho, quando a venda dos ingressos ia de vento em popa, veio a proposta de realização do show de Paul McCartney, que acabou sendo realizado com o dinheiro de origem fraudulenta do maior esquema de pirâmide do mundo.
"Na verdade, eles (Costa e Wanzeler) estavam buscando novos rumos, porque a Telexfree travou tudo. Queriam buscar novos negócios, precisavam de dinheiro para viver, têm família, filhos e buscavam novas alternativas", explicou Flávio sobre a participação deles no evento.
Após o show a relação empresarial entre eles acabou. Flávio se retirou da Capixaba Eventos em 2015. "Eu os procurei para encerrar a empresa. Estavam engessados, falaram que não tinham dinheiro para nada. Decidi seguir minha vida sozinho. Montei a Flávio Salles Produções e fiz alguns shows".
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