Margareth Dalcolmo, pneumologista capixaba
Margareth Dalcolmo, pneumologista capixaba
Margareth Dalcolmo

Médica capixaba vai doar plasma para tratar pacientes com  Covid-19

Pneumologista capixaba, que contraiu a doença e agora está curada, pretende contribuir com o modelo de tratamento fazendo a doação que estimula a produção de anticorpos

Margareth Dalcolmo, pneumologista capixaba
Publicado em 31/05/2020 às 09h48

Desde o início da pandemia do novo coronavírus (Sars-Cov-2), a pneumologista capixaba Margareth Dalcolmo está na linha de frente do combate à Covid-19 no país. Também pesquisadora da Fiocruz, ela acabou sendo infectada, mas até dessa adversidade pretende usufruir para ajudar no tratamento de pacientes: a médica, que já está curada, vai fazer a doação de plasma sanguíneo, com a expectativa de que aqueles que apresentam o quadro grave da doença possam desenvolver anticorpos e se recuperar. Esse é um modelo terapêutico que, segundo Margareth, tem apresentado resultados promissores. Pelos protocolos nacionais, os testes para doação são feitos após um mês da infecção.  

Na mensagem que encaminhou à sua família e amigos quando ficou curada da Covid-19, a senhora mencionou a possibilidade de fazer doação de plasma para pacientes com a doença. O que há de efetivo sobre esse tratamento?

O tratamento de infusão de plasma de convalescentes ou curados tem mostrado resultados muito promissores até o momento. Não é uma técnica nova, já foi usada na gripe espanhola, portanto há mais de 100 anos, e  há trabalho publicado daquela ocasião. O princípio é transfundir pacientes graves de terapia intensiva, com situação inflamatória grave. Infundir neles anticorpos colhidos e gerados por pacientes convalescentes. Eu tenho um resultado de anticorpos gerados bastante alto, o que me permitiria fazer a doação de plasma. Nos Estados Unidos, é uma metodologia terapêutica muito usada. Há protocolos clínicos de observação em vários lugares que podem gerar informação importante. É uma modalidade bastante defensável porque, eventualmente, pode dar anticorpo para aqueles pacientes na fase inflamatória grave. Quando já houve a chamada tempestade de citocinas, evolui com muita gravidade, e este é o momento da infusão de plasma. Há outros protocolos terapêuticos com doação e transfusão de plasma antes do momento grave de doença, porém é necessária uma análise prospectiva. Mas, sem dúvida nenhuma, a infusão é algo que eu, particularmente, vejo de maneira muito positiva como alternativa terapêutica para pacientes graves.

Toda pessoa que contraiu o coronavírus (Sars-Cov-2) pode fazer a doação?

Precisa que a pessoa alcance determinada taxa de anticorpos suficientemente alta para valer a pena doar. Nem todos respondem igual, varia muito de pessoa para pessoa. Eu desenvolvi muito rapidamente, em duas semanas e pouco. Há pessoas que não evoluem assim, só depois de um mês. Por isso, a conduta mais recomendada é realizar exame sorológico para medir a taxa de anticorpos para fazer a doação após 30 dias (da infecção).

Como funciona a infusão de plasma no organismo de um paciente com a Covid-19?

A pessoa está recebendo aquilo que não tem. É uma forma de estimular que também desenvolva anticorpos próprios a partir dos que foram doados por pacientes que já tiveram reconhecimento do patógeno, do vírus. Nos Estados Unidos, por exemplo, são menos rigorosos que no Brasil. Lá, é colhido plasma de todo mundo, a partir do 28º dia, independentemente de medição de taxa. Aqui, pelo protocolo clínico aprovado pela Comissão Nacional de Ética em Pesquisa (Conep), precisa da taxa monitorada. Mas não tem diferença de qualidade entre um e outro.

Que outros tratamentos, hoje, têm apresentado bons resultados para quem desenvolveu o quadro mais grave da doença?

Há várias modalidades terapêuticas analisadas hoje no mundo, e também no nosso país. Um estudo é o Solidariedade, chancelado pela Organização Mundial de Saúde (OMS), que está sendo feito em aproximadamente 20 países, inclusive no Brasil. Ele é composto de quatro braços terapêuticos. Um vai usar o Remdesivir, um antiviral com resultados promissores, mas sem publicação científica ainda. Outro braço é o Interferon Beta, anti-inflamatório biológico usado em pacientes com Esclerose Lateral Amiotrófica (ELA). O terceiro braço é a associação de dois antivirais e o quarto, a hidroxicloroquina, que foi interrompido agora por recomendação da OMS. São muitas modalidades terapêuticas no mundo que estão em observação, vários trabalhos focais, em busca do melhor tratamento.

O que se descobriu até agora em relação à doença que possa contribuir para um tratamento específico ou mesmo a vacina?

Nunca houve uma velocidade de aprendizagem tão grande. Temos cinco meses de uma doença nova, patógeno novo e que pode causar a maior tragédia sanitária dos últimos 100 anos em todo planeta. Depois da gripe espanhola, não tivemos nada tão devastador em morbidade, em mortalidade. Com esse número de mortes alcançado, bem como de curados também. É importante relativizar o impacto que a doença tem, e tudo indica que todos que já fomos infectados estejamos imunizados. A questão da vacina não é técnica, não é algo complexo de ser formulado. Difícil é demonstrar cientificamente e, na prática, que essa vacina obedece a dois critérios: precisa ser eficaz, ou seja, protetora contra o vírus, e tem que ser segura, não pode ter efeitos colaterais.  Então, isso leva tempo e não se pode pensar em uma vacina em menos de um ano e meio. Já há várias vacinas em estudos no mundo, perto de 20 ensaios, e particularmente duas estão mais avançadas e entraram na fase 1, que é a de aplicação em seres humanos voluntários. Mas, até que possa ser considerada para uso na população, ainda tem que passar por outras fases. Mas uma vacina é, sem dúvida, o que esperamos obter.

A senhora diz que, ao falar das mortes, é importante mencionar também os curados. São as comorbidades que fazem a doença se manifestar de maneiras tão diferentes no organismo das pessoas?

De modo geral, sim. É uma doença muito ligada às condições de saúde do hospedeiro, se tinha uma doença prévia ou comorbidades. Se as pessoas não são diabéticas, não são hipertensas ou cardiopatas tendem a ter uma resposta melhor. No entanto, temos visto que, no Brasil, a doença cumpriu exatamente a rota epidemiológica que anunciamos, e se dissemina nas classes menos favorecidas, entre os pobres. Hoje, a Covid mata gente jovem que não tem nenhuma comorbidade. A doença se rejuvenesceu, e indica que essas pessoas estiveram expostas a uma carga viral muito grande, em ambientes muitas vezes insalubres. Naturalmente, a exposição maior pode ter concorrido para a mortalidade. E, como efetivamente perdemos tempo, deixamos de usar as medidas de contenção mais rígidas quando valeria a pena tê-las usado, considero que hoje temos uma exaustão e o resultado tem sido este: catastrófico.

A senhora comunicou a sua cura no último domingo, mas relatava ainda algumas sequelas, como a perda de olfato. Como se sente agora?

Isso demora um pouco, mas não é uma coisa tão grave, nem tão importante. É preciso ter paciência e exige resiliência. Estou bem.

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