Com o forte rombo na Previdência, o Estado decidiu usar o lucro de um fundo de previdência, pelo regime de capitalização, para amenizar os prejuízos provocados por outro plano, que funciona pelo modelo de repartição. A transação foi feita em janeiro de 2017 pelo Instituto de Previdência dos Servidores do Estado (IPAJM) conforme mostrou reportagem de A GAZETA/GAZETA ONLINE. Reportagem ainda mostrou que alguns segurados chegam a ganhar R$ 27 mil. Por conta da idade que têm, eram de uma época que não precisavam contribuir para a Previdência.
Segundo o diretor de Investimentos do órgão, Gilberto Tulli, a medida foi feita com responsabilidade e teve o objetivo de manter um equilíbrio no sistema previdenciário estadual. Ele explica que a medida foi uma forma de reduzir o aporte e proteger, assim, a segregação de massa, que dará, no longo prazo, um regime de aposentadoria e pensões sem déficit. Confira a entrevista.
Por que o IPAJM realizou a operação chamada compra de vidas para transferir inativos do fundo financeiro, que é deficitário, para o previdenciário?
É importante, antes de tudo, explicar que temos amparo legal para isso. A operação foi aprovada pela Assembleia e teve aval da Secretaria da Previdência (governo federal). Mas porque fizemos a mudança? Nosso atuário disse que era algo viável, pois o fundo previdenciário era superavitário. Quando ele identificou a possibilidade, nós contratamos um estudo específico para isso que mostrou que há uma provisão matemática superavitária, indicando que atenderíamos aos critérios estabelecidos pela Previdência e que poderíamos usar os recursos sem que isso gerasse desequilíbrio no fundo previdenciário.
Mas como foi esse processo?
O atuário nos apresentou uma lista de segurados, com idade, expectativa de vida e provisão matemática, que é o valor presente de um gasto no futuro e que mostra a necessidade de recursos até a extinção do benefício. No grupo, tinham pessoas de 83 a 104 anos e que poderíamos dispor de R$ 590 milhões para o pagamento dos benefícios. Foi estimado um tempo de vida para a pessoa mais nova de 7,86 anos. O levantamento foi apresentado à Secretaria da Previdência, que analisou as condições financeiras do fundo previdenciário e aprovou a migração da massa.
A operação não foi arriscada?
É justamente por causa do risco que a norma da Previdência define que só é possível fazer a transferência se o fundo tiver 25% a mais do que o recurso necessário para pagar a aposentadoria e pensões dos segurados. O interessante é que o último estudo atuarial feito pelo IPAJM mostra que nossa margem de segurança já é superior ao tínhamos na época da compra que ocorreu em janeiro de 2017.
Mas o que garante que os cálculos não podem estar errados?
O estudo, geralmente, é mais conservador do que a realidade. Nossa meta atuarial tem sido reduzida ao longo do tempo para que possamos ser mais prudentes e evitar falhas nas contas no futuro. Não podemos garantir com 100% de certeza que tudo vai ser como temos previsto agora. Mas, todo o ano, fazemos uma nova avaliação. Se ao longo dos anos, percebemos alguma redução nessa margem da segurança, vamos ter tempo suficiente para corrigir essas falhas. O interessante, no entanto, é que mesmo reduzindo nossa meta e nossa expectativa o superávit vem subindo.
Mas por que tirar a pureza do fundo previdenciário, incluindo pessoas de outro fundo? Não havia outras alternativas?
Nós estamos acompanhando a situação da previdência de outros Estados. Vivemos casos bens ruins. Em alguns casos, houve a união dos fundos para conter o rombo da Previdência. No nosso caso, vários estudos mostraram que essa era a melhor alternativa. Era a mais segura para manter a nossa previdência mais estável. Havia outras saídas como alíquota suplementar, parcelamento da dívida, mas optamos pela transferência. E se faço sempre os estudos do equilíbrio não quebro o meu pacto de acabar com o déficit previdenciário no futuro.
A ideia foi reduzir o valor do aporte necessário para cobrir o rombo do fundo financeiro?
O que fizemos, na verdade, protege o fundo previdenciário de uma unificação no futuro. Além disso, quando mantenho um fundo com superávit acima do necessário estou onerando as contas públicas para cobrir o fundo financeiro. Reduzindo o aporte, posso manter o regime de previdências mais equilibrado e ter mais recursos para investimentos no serviço público.
O Estado não poderia reduzir a alíquota patronal para que essa economia em relação ao fundo previdenciário pudesse ser usada no aporte do fundo financeiro?
O problema é que essa mudança de alíquota não teria amparo legal. Seria algo menos estável e não teria tanto efeito no curto prazo.
A equipe técnica do Tribunal de Contas questionou a operação e mesmo assim ela foi feita.
Realmente o Tribunal nos questionou, mas as contas do governo foram aprovadas. Após a realização da compra de vidas, a apesar de ter aprovado a medida, a Secretaria da Previdência fez alguns questionamentos e reavaliou o parecer que havia dado anteriormente. Eles nos pediram para enviar mais dados e dos últimos três anos. O próprio órgão refez todos os estudos e novamente deu um parecer favorável. Nós não trabalhamos com hipóteses. Temos certeza que o estudo estava perfeito.
Mas o Tribunal disse que os dados usados para fazer os cálculos estavam desatualizados.
As orientações do Tribunal de Contas são sempre bem-vindas. Realmente, eles pedem que nossa base de dados seja melhor. O Executivo tem feito um processo de atualização cadastral de todos os ativos. No entanto, não podemos exigir que cada segurado informe todo o seu passado. Temos o papel de orientar e de convencer as pessoas sobre a importância de informar adequadamente o histórico. Em relação aos aposentados, estamos fazendo o recadastramento para manter a nossa base atualizada.
Muitos servidores contratados depois de abril de 2004 tinham uma vida profissional antes de entrar no funcionalismo. Como então calcular o tempo de contribuição?
O estudo atuarial é estatístico. Ele prevê a compensação previdenciária e ainda estima quantas pessoas estavam ligados a outros regimes de previdência. Faz isso, por exemplo, com base na idade desse servidor. No caso de uma pessoa que ingressou no funcionalismo com 47 anos, por exemplo, o cálculo vai estimar que ela teve um tempo pregresso.
Não existe como pegar informações do INSS e de outros regimes para melhorar a base de dados?
A Secretaria da Previdência já pensou nisso. Existe um projeto-piloto de um sistema que poderá cruzar dados de todos os regimes de previdência no futuro.
Como é a capitalização do fundo previdenciário?
A ideia do fundo previdenciário não é capitalizar os recursos individualmente por servidor. É apenas uma forma do ente federativo equilibrar no longo prazo os gastos com a Previdência. Nosso conceito é que as pessoas contribuem para que o Estado faça a melhor gestão dos recursos para pagar aposentadoria do futuro. É bom deixar claro que não é uma poupança individual. Quando o Estado decide fazer essa segregação de massa não é para diferenciar direitos. Ao guardar o dinheiro, o Estado está pensando em todos os servidores, inclusive naqueles que estão no fundo financeiro.
O governo pretende fazer nova compra de vidas?
A Secretaria da Previdência autoriza a reavaliação das compras de vida a cada cinco anos. É cedo para prever qualquer situação agora. Mas se as contas estiverem superavitárias novamente será uma alternativa para o Estado.
Não há risco de no futuro o fundo previdenciário se tornar de repartição e ficar como o fundo financeiro?
O fundo previdenciário não tem a característica do regime de repartição: que é o pacto de geração. Mesmo que haja uma catástrofe, as contribuições vão entrar no acúmulo de capital para pagar benefícios.
Qual é o rendimento anual acima da inflação dos recursos do fundo hoje? E onde os recursos são aplicados?
A rentabilidade média real é de 5,5% ao ano. A maior parte dos recursos está em títulos do Tesouro. O restante está em fundos de investimento. Temos 3% dos investimentos em renda variável, mas tivemos recentemente a aprovação do conselho do IPAJM para aumentar esse percentual para 7% por conta da tendência de maior valorização dos recursos no mercado de capitais. Mas, de qualquer forma, a política de investimentos é bem conservadora. Os recursos estão em bancos públicos como Banestes, Banco do Brasil, Caixa Econômica Federal e Banco de Brasília. Este último é nosso custodiante dos títulos públicos.
O Banco de Brasília esteve envolvido em recente escândalo de corrupção. Não é arriscado mantê-lo como custo diante?
O sistema brasileiro é bem seguro. A questão envolvendo o BRB foi contra alguns gestores do banco. A instituição continua segura. O importante é que a função de custódia tem várias barreiras que impedem qualquer interferência da instituição nos recursos do IPAJM. É uma área blindada que impede a mistura dos recursos.
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